Crítica
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Sinopse
Durante as manifestações que ocorreram em São Paulo nos últimos anos, a Polícia Militar foi responsável por agredir violentamente, ferir e prender uma série de manifestantes. Através do uso excessivo de gás lacrimogêneo e outras técnicas duvidosas, a cidade transformou-se em um verdadeiro campo de batalha e as marchas, inicialmente pacíficas, foram consumidas pela violência derivada das forças policiais.
Crítica
A cisão político-social que o Brasil vem enfrentando não é de hoje. E se esse racha é um problema que merece ser estudado com maior parcimônia e distanciamento para não infligir em considerações contaminadas pelo calor dos acontecimentos, também não se faz necessária somente uma visão fria das coisas. Afinal, são pessoas envolvidas, e como tais, as emoções fazem parte intrínseca destes fatos. As manifestações que tomam as ruas desde 2013 remetem a movimentos já vistos, como o Fora Collor do início dos anos 1990 ou o Diretas Já da década anterior. Antes, no entanto, havia um ponto em comum a ser debatido. Agora, os tiros estão por todos os lados. E o pior: acertam uns aos outros, indiscriminadamente. Marcha Cega, documentário escrito e dirigido por Gabriel Di Giacomo, toma como ponto de partida a cidade de São Paulo – não por acaso, a maior do país e também a mais culturalmente diversa – para mostrar que, quando os embates se dão em condições desiguais, não há vitoriosos – apenas mortos e feridos.
A principal questão a ser levantada por Giacomo é a truculência das abordagens policiais nestes enfrentamentos com a população. O povo se une e manifesta sua insatisfação contra o status quodas coisas. A polícia do estado, ao invés apenas de garantir a segurança pública, agindo como um representante de controle, se posiciona como uma força contrária, partindo para o ataque. É uma guerra que está sendo travada, e o inimigo precisa ser abatido. Mas quem, afinal, é o vilão dessa história? Os homens da lei, despreparados, sem treinamento nem orientação, movidos sob ordens que não podem ser questionadas e submetidos aos mais absurdos níveis de pressão, querem apenas o combate: acabar com aquilo é a vontade maior, ainda que nem merecesse lugar na mesa de discussões.
Afinal, estamos em uma democracia, e o diretor não se esquiva em reforçar essa verdade muitas vezes esquecida. Sendo assim, todos possuem seus deveres, mas também seus direitos. Entre esses, o de poder falar e ser ouvido – ou seja, se manifestar. O que Marcha Cega demostra é que a polícia de São Paulo age justamente no sentido de abafar estas vozes, ao invés de apenas controlar excessos e servir como guia da população. Em vez de proporcionar um ambiente seguro, faz o contrário, disseminando caos, pavor e violência. E o caso que dá origem a esse debate é justamente o de um fotógrafo que, ao registrar um destes encontros, foi atingido no olho por uma bala de borracha proferida por um policial e, com isso, acabou cego daquela visão. Uma vítima inocente, preocupada somente com o seu trabalho, que se tornou mira de um estado despreparado para lidar com os seus. Quando um olho se fecha para sempre, todos os demais precisam estar bem apertos para que aquilo não mais se repita.
Giacomo sabe que há mais elementos envolvidos nessa questão do que apenas aqueles percebidos na superfície. Há uma cultura a ser combatida, e seu filme deixa clara essa realidade. Militantes, rebeldes, estudantes, pacifistas, socorristas – todos são ouvidos nos mais amplos espectros de suas atuações. E se vai além: advogados, ativistas, sociólogos e até um tenente militar procuram oferecer uma análise embasada, profunda e detalhada destes episódios, apontando não apenas os equívocos evidentes, mas também como deveriam ser esses procedimentos rumo ao acerto. O que se percebe, em menos de 90 minutos de projeção, é uma certeza muito grande a respeito do discurso que está sendo proferido, assim como uma vontade de não se deixar levar pelos absurdos praticados ou pelas reações do momento. Tudo é objetivo e, talvez por isso mesmo, irrefutável.
Marcha Cega propõe um apanhado histórico profundo destes últimos anos. Avançando de modo progressivo, chegamos até o impeachment da presidente Dilma Roussef. Os motivos são diversos, mas uma coisa é clara: sendo contrários ao governo, são reprimidos sem meias palavras – ou ações. Agora, qualquer movimento favorável à situação é encarado de forma muito mais branda, inclusive sendo saudado pelos envolvidos, em ambos os lados. Os problemas levantados não serão resolvidos com um bater de martelo – as mudanças precisam ser mais drásticas e profundas. A mídia, as instituições, as diretrizes e as formas de pensar cada questão: tudo precisa ser alterado e cada um tem sua parcela de culpa por este desastre que a sociedade brasileira hoje enfrenta. O que Giacomo faz é reunir estes elementos e prepará-los para o debate. Os caminhos para isso estão aí. Bastam ser percorridos. O trajeto pode ser longo, mas é viável. E são filmes como esse que mostram que as possibilidades, ainda, não se esgotaram.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
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Robledo Milani | 7 |
Francisco Carbone | 5 |
Filipe Pereira | 6 |
MÉDIA | 6 |
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