Maria Cheia de Graça
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Joshua Marston
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Maria Llena Eres de Gracia
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2004
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Colômbia / Equador / EUA
Crítica
Leitores
Sinopse
Crítica
Maria não vê futuro, apesar da pouca idade que tem. Mora no interior da Colômbia, e tudo a que está acostumada a presenciar é uma rotina de servidão a uma sociedade mais favorecida e exploradora. Trabalha em uma grande indústria de flores, todas destinadas a alegrarem os moradores de Miami e de outras cidades dos Estados Unidos. Mesmo caminho percorre o maior produto de exportação colombiano, a droga. Quando Maria cansa de ver suas mãos sangrarem nos espinhos das roseiras e decide dar um novo rumo a sua vida, suas opções são poucas. E, sem forças para continuar lutando, opta pelo dinheiro aparentemente fácil do tráfico, se oferecendo para servir de “mula”, ou seja, carregando tubetes de heroína dentro do próprio estômago, até a tão sonhada América. Infelizmente, não demorará muito para perceber que sua escolha de mudança de rumo fora somente superficial, e que na realidade continua desempenhando o mesmo desafortunado papel dentro de uma engrenagem social globalizada.
Trabalho de estreia do cineasta norte-americano Joshua Marston, também autor do roteiro, Maria Cheia de Graça indica de modo exemplar em sua narrativa quais são suas origens intelectuais. Marston é jornalista, tendo trabalhado para a revista Life e para o canal de televisão ABC em lugares como Paris, Praga e até no Golfo Pérsico, como correspondente de guerra – tanto que o filme seguinte do realizador, Perdão de Sangue (2011), se passa na zona de guerra albanesa. Não se trata, portanto, de uma obra genuinamente colombiana – tanto que foi impedida de concorrer ao Oscar na categoria de Filme Estrangeiro – mas reflete com precisão um olhar distanciado e global sobre um grave problema local. Esta visão mais pragmática e documental da realidade está impressa de modo sintomático no discurso do filme, que provoca o espectador sem apelar para maniqueísmos óbvios, como o melodramático e o pueril. Aqui tudo é seco, direto, e as emoções que contém – e não são poucas – provém da força de sua história e da competência como ela é levada às telas.
Se a mão segura do diretor é um ponto a favor, o maior pilar de expressão da obra é, no entanto, o impressionante desempenho da protagonista, Catalina Sandino Moreno. Ela, que debuta cinematograficamente com este trabalho, conseguiu uma atenção surpreendente para sua performance, tendo sido premiada no Festival de Berlim e indicada ao Oscar da categoria de Melhor Atriz, um fato quase inédito (a única latino-americana a conseguir este feito antes foi a brasileira Fernanda Montenegro, que teria idade para ser avó de Catalina e possui um histórico bem mais relevante). Com um olhar penetrante, uma sensibilidade dolorida e um porte enérgico, a jovem consegue oferecer a sua Maria a fragilidade e a determinação necessária, compondo uma personagem ao mesmo tempo indecisa entre o novo e o velho mundo e pronta para lutar pelo que acredita ser seu direito a uma vida melhor. Não é uma atuação de momentos únicos, e sim de uma composição contínua, que vai se desenvolvendo e aperfeiçoando com o desenrolar da trama.
Maria Cheia de Graça é um grito de urgência sobre uma questão universal – a desilusão do Terceiro Mundo – aqui apenas exemplificado através das drogas. Abordando temas como intolerância, violência e liberdade, o filme choca pela franqueza do discurso empregado e pela mensagem que transmite. Uma obra séria e relevante, em um trabalho que envolve pela atualidade das questões levantadas e pela maturidade como as mesmas são tratadas.
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