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Sinopse
Marias: Uma jornada pelo feminino através das festas marianas da América Latina. Acompanha uma viagem por Brasil, Cuba, México, Peru e Nicarágua seguindo as celebrações das padroeiras desses países.
Crítica
Produtora reconhecida no cenário cinematográfico brasileiro, Joana Mariani escolheu um tema inusitado e, ao mesmo tempo, apropriado aos tempos atuais para sua estreia como realizadora. Marias, o documentário que assina, tem como objetivo uma investigação a respeito das diversas formas de manifestação da religiosidade na América Latina a partir da figura da virgem Maria, mãe de Jesus. E se por um lado a questão religiosa parece uma opção pouco comum para uma pessoa que se assume sem crença declarada, por outro lado talvez tenha sido justamente esse distanciamento o elemento necessário para emular desta jornada um olhar mais apurado sobre o simbolismo e o poder do feminino nestas comunidades.
Projeto que há anos vem envolvendo o cotidiano profissional da realizadora, Marias parte do Brasil para traçar um amplo mapa da relação dos devotos com a santa de cada um, todas de uma forma ou de outra identificadas como a Maria universal, uma das figuras mais emblemáticas da Bíblia e do catequismo católico. A diretriz era uma só: conversar com pessoas que também tivessem ‘Maria’ no nome, estabelecendo, portanto, uma ligação desde o berço, sendo ela resistente até hoje ou não. As Marias, portanto, são muitas e diferentes entre si. Há aquelas que se aproximam da imagem por uma questão de fé e as que estão próximas por motivos outros. Aquelas que sempre viveram ao redor dessa crença, e as que só recentemente descobriram um motivação maior. E mais curioso: as Marias não são, necessariamente, apenas mulheres. Há homens também. E cada um com as suas próprias razões.
Mariani – que por si só também é uma Maria – começou no Brasil, sua terra natal. Aqui encontrou uma restauradora responsável por recuperar a imagem de uma santa danificada após uma queda no santuário de Aparecida, até uma ex-freira que questiona o próprio conceito de ‘virgem’ Maria. Afinal, se o objetivo é que esse conjunto – João, Maria e o menino Jesus – represente a família ideal, como isso seria possível tendo ao centro uma mulher que não se relaciona com o marido e que nunca chegou a conhecer o pai de seu filho? A diretora, como se percebe, não teme tangenciar assuntos potencialmente polêmicos. Porém, assim o faz sem julgamento nem posicionamentos solidificados. Seu interesse está muito mais em ouvir, em abrir estes debates, e menos em procurar respostas ou conclusões apressadas.
O México também foi um destino fundamental, principalmente pela forte devoção à santa de Guadalupe. Cuba, Nicarágua e Peru acabaram se revelando outras visitas importantes, tanto pelo sincretismo que carregam como pelos personagens que acabaram oferecendo ao painel aqui almejado. José Maria, por exemplo, pode ser tanto um homem de família como um rapaz afeminado que ganha a vida como estátua humana – fantasiado, e não por acaso, justamente como a icônica imagem de Maria, de manto e braços abertos. Jovens e idosas, figuras célebres ou não, a investigação conduzida pela cineasta é quase como um eficiente quebra-cabeças, que vai sendo construindo aos poucos, peça após peça, porém sem pressa nem atropelo.
O que Joana Mariani alcança com Marias é um filme eficiente em seu objetivo e singelo pela delicadeza que abraça em sua narrativa. Menos uma grande reportagem e mais um conto de feminismo e religiosidade, é hábil em deixar de lado os discursos mais viciados e radicais tão facilmente associados à temas como os aqui levantados, emulando, por sua vez, olhares que muitas vezes acabam sendo deixados de lado justamente por sua simplicidade e, por que não, caráter universal que carregam. As Marias podem ser muitas e diferentes entre si, muito disso por causa da maneira como seus fiéis com ela se relacionam. Mariani, no entanto, trata todas – e aqueles ao seu redor – com o mesmo respeito e sincera curiosidade. E dentre tantos exemplos de fé e orações, consegue abrir espaço para o verdadeiro sentimento que a todos conecta: uma indissociável humanidade.
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