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Crítica


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Sinopse

Prestes a terminar o ensino secundário, Mary começa a enfrentar turbulências nos seus amores e nas suas amizades. Enquanto esse turbilhão de coisas acontecem, fatos estranhos começam a surgir.

Crítica

Mary está feliz, Mary está feliz, Mary está feliz...”. Mary repete constantemente a frase, até começar a acreditar. E esse tempo é variável, pode vir logo, mas pode também nunca chegar a acontecer. E por que Mary se esforça tanto para ficar feliz, e não em ser feliz? Se em inglês o verbo to be (ser/estar) permite essa dualidade, a tradução para o português é bastante direta e mais precisa. O que importa para a protagonista é aquele momento imediato, sem contornos ou desvios. Mary está feliz, Mary está feliz é construído a partir deste confronto: uma garota em constante ebulição, descobrindo-se a si e ao seu redor, ao mesmo tempo em que precisa lidar com as pressões normais de uma jovem de sua idade e daqueles com quem se importa e tenta, a todo custo, estabelecer uma relação. Um objetivo válido, porém nem sempre cumprido com efeito.

O jovem diretor Nawapol Thamrongrattanarit não difere muito da faixa etária de seus personagens. Mary está feliz, Mary está feliz é recém seu segundo trabalho, após o bom impacto causado por seu longa de estreia, 36 (2012), exibido no Festival de Roterdã e premiado pela crítica em Pusan (Coréia do Sul) e como Melhor Direção no Cinemanila (Filipinas). Nascido na Tailândia, está no centro de um novo horizonte cinematográfico que começa a se formar a partir do conflito entre uma geração marcada por ferrenhas tradições e uma realidade consumida pela ocidentalização desenfreada. Há espaço tanto para brincar com o cinema de Wong Kar-Wai e elogiar o oscarizado As Aventuras de Pi (2012) como para a condenação ignorante à homossexualidade, ainda que cada uma tratada ao seu modo e sempre de maneiras oblíquas. Estas características estão presentes de forma latente no seu cinema, seja através de referências em seus diálogos, pelo cenário de suas tramas, pelos figurinos utilizados ou pela fluência da ação. Mas, mais do que isso, pela naturalidade com que conduz o elenco ao impor o desenrolar de um roteiro com início, meio e fim. Ainda que não necessariamente nessa ordem.

Mary é uma adolescente que vive grudada em sua melhor amiga, Suri. No desenrolar de um ano letivo, o último em que estarão juntas antes de irem para a faculdade, elas terão como objetivo imediato elaborar um anuário, que registre suas histórias e companhias, ao mesmo tempo em que buscam desvendar o que querem de suas vidas e do futuro que as aguarda. A relação com os pais ausentes logo é substituída pela vida no colégio interno, e nem sempre o que vemos e acompanhamos é um retrato fiel aos acontecimentos – estamos mais conectados a sua visão particular das coisas, através de uma interpretação sensorial e hiperbólica, por vezes exagerada, mas nunca desprovida de humor e jovialidade. A descoberta do primeiro amor, a formação de uma identidade, a maneira como lidam com as cobranças externas e diárias, as percepções tardias sobre a importância dos sentimentos daqueles que a rodeiam. Um processo de construção constante, que a leva – e ao espectador junto – a um caminho irreverente, porém não totalmente desconhecido. Uma Frances Ha oriental, digamos, porém com um terreno sólido para se desenvolver, ainda que desconfie dessa situação.

O problema de Mary está feliz, Mary está feliz é o fato do diretor se deixar levar além da conta por sua personagem, sem tomar os cuidados necessários referentes aos limites cinematográficos. Nascido através de uma ideia interessante – o roteiro foi elaborado a partir de exatos 410 tweets publicados em sequência pela jovem Mary Malony, expostos integralmente na tela – que se torna cansativa pela contínua repetição, reflete inadvertidamente um dos fatores mais típicos dessa geração, seja em frente ou atrás das câmeras: o excesso. Ou seja, é bom, mas sem um olhar distanciado, perde a chance de ser ainda melhor.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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