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Sinopse

Um ex-lutador de UFC consegue emprego como segurança de um estabelecimento num cenário paradisíaco. Ele logo passa a ser reconhecido como alguém disposto a defender todos com os próprios punhos.

Crítica

São tantas as similaridades com diversos outros projetos do gênero – a começar pela óbvia constatação de que se trata, neste caso, de um remake, e não de algo que tenha a mínima pretensão de se apresentar como original – que somente por meio de muito esforço um olhar mais preparado conseguirá identificar algum tipo de mérito nesta versão 2024 de Matador de Aluguel, lançada 35 anos após a estreia do primeiro longa, estrelado pelo já falecido Patrick Swayze. Importante, nesse momento, lembrar do contexto no qual o primeiro Matador de Aluguel (1989) chegou às telas. Naquela época, Swayze era um astro em plena ascensão: havia estrelado o sucesso Dirty Dancing: Ritmo Quente (1987) dois anos antes, além de ter trabalhado com realizadores de respeito, como Francis Ford Coppola (Vidas Sem Rumo, 1983) e John Milius (Amanhecer Violento, 1984, que também ganhou uma refilmagem décadas depois). Ou seja, era a sua consagração como um nome capaz de levar multidões às salas de cinema (como comprovou logo em seguida, com acertos como Ghost: Do Outro Lado da Vida, 1990, e Caçadores de Emoção, 1991). Já esse projeto requentado de agora nada mais é do que um grito de desespero.

E por qual motivo se pode fazer tal afirmação? As razões podem ser complexas, mas seu entendimento é simples. Tanto Jake Gyllenhaal, o “rosto” dessa retomada, quanto Doug Liman, o diretor, precisam desesperadamente de um gol. Gyllenhaal há muito deixou claro que não conseguirá se posicionar na constelação hollywoodiana como o astro que, no início da carreira, ameaçou ocupar: ele não é mais uma “promessa”, mas, sim, um operário competente que, volta e meia, acerta em suas escolhas, por mais que na maior parte do tempo se ocupe com produções que terminem distante do grande público e das premiações, gerando cada vez menos interesse (Animais Noturnos, de 2016, talvez tenha sido seu último título a justificar alguma comoção). Liman, por sua vez, está ainda mais no ocaso. O barulho que provocou com A Identidade Bourne (2002) e com Sr. e Sra. Smith (2005) nunca mais se repetiu, por mais que suas parcerias com Tom Cruise, como No Limite do Amanhã (2014), tenham despertado alguma curiosidade. Mas foi pouco para seguir na ativa. Por isso, ambos decidiram parar de insistir na busca por algo novo e passaram a olhar para trás, visando algo já confirmado que possa mais uma vez elevá-los. Matador de Aluguel, dessa forma, se apresenta como uma boia salva-vidas. Mas, por certos aspectos, é apenas uma âncora capaz de afundá-los ainda mais.

Mas e o filme? Nada de atualizações ou releituras. O âmago é basicamente o mesmo daquele visitado nos anos 1980. E o batismo brasileiro segue equivocado. Dalton (Gyllenhaal, bom moço demais para ser ameaçador, por mais que essa seja a ideia por trás do seu personagem) está longe de ser um “matador de aluguel” frio e calculista, como o cinema se acostumou a apresentar esse tipo. Ele está mais para um leão-de-chácara, um lutador em franca decadência contratado para defender um bar afastado – a tal road house, ou taberna de beira de estrada – que tem sido ameaçado de forma sistemática por arruaceiros. Rapidamente, fica evidente que não se tratam de meros desocupados em busca de confusão: há um aprendiz de mafioso (Billy Magnussen, que é bonito e engomadinho demais para gerar apreensão, servindo mais como alívio cômico, sem nunca se mostrar como a ameaça alardeada pelos demais) que almeja aquele lugar para especulação imobiliária. Se irá também facilitar suas negociações envolvendo tráfico de drogas e armas, isso é só um detalhe.

Importante prestar atenção nas mulheres em cena. Há duas, aliás, que se destacam. Frankie (Jessica Williams, indicada ao Emmy por Falando a Real, 2023) é a responsável por trazer Dalton para esse trabalho. É ela a dona do estabelecimento, a proprietária em dificuldades que precisa de ajuda não dos poderes oficiais ou de uma estratégia pensada, mas da força bruta que possa enfrentar o perigo com uma dose ainda maior de violência. Reflexo dos tempos atuais. Elie (Daniela Melchior, de Velozes e Furiosos 10, 2023), por sua vez, é a doutora solidária, a que cuida dos machucados e feridos que resultam desses constantes embates. Será ela, também, que despertará interesse romântico – e sexual – no protagonista. Mas ambas, tanto Frankie quanto Elie, mentem para Dalton. Ou seja, ele é um homem solitário, e essa é sua sina. Por mais que as coisas pareçam mudar no decorrer da trama, ele somente conseguirá estar em paz – não será surpresa alguma descobrir que há um trauma no seu passado, adicionando uma camada de culpa que talvez explique sua jornada de autodestruição – quando longe de tudo e de todos. Por mais amplos que sejam os braços que tentem lhe oferecer algum tipo de conforto.

Com a adição no elenco de nomes como Conor McGregor (incapaz de compor uma figura diferente da sua própria persona profissional) e Post Malone (uma participação especial destinada mais a agradar aos fãs do que a estimular qualquer tipo de provocação narrativa), esse Matador de Aluguel joga apenas entre os confirmados, entregando o esperado àqueles que sabem bem com o que aqui irão se deparar, e deixando os demais a ver navios em um marasmo de falsas novidades. Jake Gyllenhaal se mostra desenvolto nas cenas de ação – seu preparo físico é invejável – mas é nos momentos dramáticos, situações que chegou a revelar algum tipo de versatilidade no passado, que decepciona, transitando entre a frustração comedida e a fúria descontrolada. Por sua vez, Liman inova ainda menos, percorrendo enquadramentos e uma montagem frenética nos mesmos moldes dos seus feitos anteriores, sem elevar o jogo ou se arriscar por novos caminhos. Eis, enfim, uma reciclagem que já nasce desgastada, incapaz de alterar um cenário por demais comprometido.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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