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Crítica


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Sinopse

Dois melhores amigos de infância precisam se beijar para um curta estudantil. Logo, a dúvida persistente se instala, confrontando os dois homens com suas preferências, ameaçando a irmandade do seu círculo social e, por fim, mudando suas vidas.

Crítica

A câmera de Xavier Dolan em Mathias e Maxime, especialmente nas reuniões dos amigos de longa data regadas a camaradagem e zoeira, tenta representar com fidedignidade uma dinâmica de afetos consolidados pelo tempo. Ela é inquieta, de certa forma emulando o olhar de um observador bastante atento e participativo. Essa “energia” é essencial para que os vínculos soem orgânicos. Tamanha é a solidez destes, que brigas não são páreo para as simples risadas contagiando até mesmo quem um pouco antes se sentia humilhado por seus interlocutores. Os personagens confraternizam na casa de descanso um deles, uma propriedade à beira do lago. No meio dessa turma há a jovem, irmã de um dos presentes, que está realizando seu filme. Para a trama é necessário um beijo entre dois homens. Matthias (Gabriel D'Almeida Freitas) e Maxime (Dolan) são levados a contracenar. Todavia, o contato físico, negado ao espectador, desperta alguns sentimentos adormecidos.

Ao invés de focar-se basicamente no torvelinho de dúvidas que atravessa, sobretudo, Matthias, jovem comprometido com uma mulher que, a partir do beijo, é acometido por vontades que lhe pesam no semblante, o realizador entremeia essa crise interna com outras. Maxime está de mudança para a Austrália. Os dias contados não afetam somente essa paixão despertada, mas também o obriga a lidar com elementos práticos relativos à mãe, cujo estado atual a impede de deliberar independentemente acerca da própria vida. Para quem conhece os filmes anteriores de Xavier Dolan, especialmente Eu Matei Minha Mãe (2009) e Mommy (2014), nos quais o conflito entre filhos e suas respectivas genitoras é igualmente determinante, vai ser fácil identificar a repetição desse procedimento em Matthias e Maxime, principalmente quando o jovem marcado no rosto tem embates, inclusive físicos, com a senhora incapaz de manter com ele diálogos civilizados.

Uma mistura de dúvida e desejo entrecorta o cotidiano de Matthias. Maxime parece lidar melhor com seus sentimentos, mas a demanda familiar lhe é urgente. O longa dispõe claramente essas peças, mas, muitas vezes, reitera certos apontamentos, vacila entre apresentar causas e afeitos de modo contido ou desbragado. Mesmo jovens, os amigos fazem parte de uma geração anterior à cultivada pelo digital e a onipresença da internet, recorte este representado pela cineasta que não se furta de utilizar o inglês para manifestar-se pretensiosamente de forma descolada. Tal apontamento surge como uma curiosidade de rodapé, pois não é trabalhado expressivamente pelo enredo, sequer para mostrar a fortaleza dos elos estabelecidos antes que as mídias sociais nos dessem uma falsa impressão de felicidade por meio da hiperconectividade. Ocasionalmente as coisas ficam mais estagnadas do que deveriam nesse filme fundamentado em inquietudes e dúvidas.

Em Matthias e Maxime, Xavier Dolan demonstra seu apreço por histórias de cunho melodramático e sucessos da música pop. O aceno ao gênero aparece tanto nas incertezas emocionais/sexuais de Mathias quanto nos problemas que Maxime enfrenta ao cuidar da mãe. Curiosamente, o cineasta restringe os dilemas de um provável envolvimento homossexual a instantes bastante pontuais, e apenas numa cena colocando em choque a juventude que não acredita em definições binárias e a imediatamente anterior, ainda atravessada por toda sorte de questionamentos e “nóias” acerca da sexualidade humana. Sobra espaço para brincadeiras bem-vindas com a “genialidade” da diretora promissora e a demonstração deslocada da excentricidade de algumas senhoras. Dolan é o destaque do elenco ao construir um personagem cuja fragilidade emocional o leva às lágrimas constantemente. Uma história sobre querer e ser reprimido silenciosamente pela sociedade. E isso se aplica ao envolvimento de Matt e Max, bem como à dura convivência com a mãe, também interditada.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.
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