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Crítica


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Sinopse

Natalie é uma jovem arquiteta que se empenha para ser reconhecida por seu trabalho. Após um encontro conturbado, ela termina sendo assaltada, o que a deixa inconsciente. Quando acorda, percebe que misteriosamente foi parar em um filme de comédia romântica.

Crítica

Depois de uma infância admirando os relacionamentos idealizados nas comédias românticas, especialmente nas populares, como Uma Linda Mulher (1990), Natalie (Rebel Wilson) se transforma numa adulta cética, praticamente fechada a namoros e afins por conta de uma trajetória de atribulações sentimentais. Com baixa autoestima, ela se sente invisível no trabalho, a despeito do talento reconhecido pelos colegas, e frequentemente deixa clara sua posição negativa quanto a envolvimentos que supostamente serviriam para dar algum sentido à vida. Megarrromântico começa brincando, criticamente, com os filmes aos quais se reporta para sustentar a sua estrutura. A protagonista desmonta verbalmente determinados mecanismos narrativos, como as câmeras lentas registrando apaixonados na corrida contra o tempo, clipes musicais tornando as coisas mais bonitas/palatáveis e transições clichês, como as provas de roupas antes de uma ocasião especial.

Megarrromântico cai de cabeça na sua vocação metalinguística quando Natalie sofre um trauma. Ela é “transportada” para um mundo perfeito, onde Nova Iorque tem cheiro de lavanda e bonitões caem no seu colo aos borbotões. O mais curioso é o fato da personagem ter completa ciência de estar numa dimensão falsa, cujas regras ela conhece muito bem. O cineasta Todd Strauss-Schulson bebe na fonte das comédias românticas, utilizando seus componentes caros, os cânones e as convenções que estabelecem as pilastras desse subgênero para construir um longa-metragem que é, ao mesmo tempo, reverente e revisionista. A desorientada, sem qualquer ideia melhor para voltar ao cotidiano repleto de problemas, que então é valorizado por ser concreto, aceita seguir as regras da narrativa cinematográfica. Gradativamente, ela perde o controle racional, sendo tragada para convencionalismos tais como “a mulher que se descobre apaixonada pelo melhor amigo”.

A graça de Megarrromântico está justamente na forma como o roteiro vai arredando Natalie à essência das comédias românticas. Ele a Josh (Adam DeVine) estão atrelados a pessoas extremamente bonitas (arquétipos interpretados Liam Hemsworth e Priyanka Chopra), aparentemente gozam de felicidade imperturbável, mas percebem a profundidade dos sentimentos que os une. Rebel Wilson está ótima como essa protagonista que, primeiro, precisa aprender a se amar – e o todo tem uma bem-vinda mensagem de valorização pessoal acima da busca pelo “par perfeito” –, para, segundo, entrar efetivamente numa dinâmica de casal. Parte da brincadeira com os padrões do subgênero que serve de substrato à metalinguagem, os números musicais encarregados de desatar certos nós da trama são deliciosos, com destaque à sequência no karaokê. O design de produção faz desse “faz-de-conta” um cenário multicolorido, simétrico, de ordem praticamente irretocável.

Embora não trabalhe constantemente a questão do empoderamento feminino, Megarrromântico tem cartas na manga que sinalizam o desmonte do discurso dos longas citados, sobretudo no que tange ao papel da mulher. A diferença entre realidade e sonho que mais exemplifica isso é o convívio de Natalie com sua assistente, Whitney (Betty Gilpin). Numa conjuntura elas são cúmplices; na outra, a que serve ao cânone das comédias românticas, são rivais de profissão, o que enfatiza uma constância nefasta e ultrapassada. Outra boa sacada do roteiro é o fato da perfeição idealizada não poder ser perturbada, sequer, por palavrões. Sempre que alguém vai proferir um termo de baixo calão, sons de volume maior acabam o abafando. Também nesse sentido, o sexo é inviabilizado literalmente, vide a ótimas cenas das tentativas que consecutivamente apontam à elipse supressora da carnalidade do amor. Essas tiradas, bem orquestradas, é que dão ao filme um charme especial.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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