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Crítica


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Sinopse

Sam é um menino que, por medo de ficar sozinho, cria um “treinamento de solidão” para fazer durante as férias. Mas conhece Tess, uma garota diferente que carrega um grande segredo, e acaba atraído para uma aventura que o faz perceber que valorizar a família é mais importante que fugir.

Crítica

À primeira vista, esta parece ser a típica história do garoto pré-adolescente que conhece uma garota por quem se apaixona durante as férias, adquirindo uma experiência que o marcaria por toda a vida – um feel good movie sobre a beleza e pureza dos primeiros amores. De fato, existe um componente romântico na relação entre Sam (Sonny Coops Van Utteren) e Tess (Josephine Arendsen), mas ele fica em segundo plano. O aprendizado do protagonista vai muito além: é através da garota que ele lida com as noções aflitivas de morte, desaparecimento e abandono, que ocupam seus pensamentos diariamente. Desde a primeira cena, Sam está deitado na cova improvisada que cavou para si mesmo na areia da praia, pensando em como sobreviverá quando os pais tiverem morrido.

Curiosamente, o garoto não pensa em fatores estruturais ou em sua segurança material (o que comeria, onde moraria?), e sim na solidão. Começa, então, um treinamento forçado em que se força a permanecer um número cada vez maior de horas sozinho por dia. Percebe-se que Meu Extraordinário Verão com Tess lida com um tema muito mais amplo do que paixões passageiras: através de Sam, o diretor Steven Wouterlood (um especialista do cinema infantil) questiona o desejo de autossuficiência contra a necessidade de conviver com os outros, ou ainda a vontade de controlar seu destino e suas emoções diante das transformações inevitáveis da puberdade. Ao lidar simbolicamente com a morte – dos próprios pais, do pai de Tess – Sam tenta compreender o mundo adulto e sua autonomia enquanto indivíduo.

Cabe ressaltar que a narrativa não é conduzida pelo protagonista, e sim por Tess. É a garota mais velha, intempestiva e “estranha”, quem decide onde a dupla vai, por quanto tempo, e o que pretendem fazer em seguida. Tess aparece na casa do garoto quando ele não está, e permanece com os familiares dele. Em outras palavras, ela não precisa do protagonista tanto quanto ele precisa de Tess, esta representação irresistível do desejo e do desconhecido. Por mais que Sam adore passar tempo com os pais, ele é sempre atraído pela possibilidade de ficar com a garota. Para além de imperativos românticos, ela representa um modelo de força e autonomia que ele aspira para si próprio – e que colocará em prática rumo ao final, ao tomar as rédeas de um segredo pertencendo à amiga.

As ambições do projeto são mais profundas na esfera existencialista do que propriamente cinematográfica. Wouterlood explora o tom ultra colorido e idealizado da praia, emprega uma trilha sonora genérica e intrusiva, e até aposta na combinação duvidosa e movimentos de drone ao som de violinos. Felizmente, estes recursos são temperados com outros mais interessantes, como a filmagem à distância para reforçar a solidão de Sam, ou a interação bastante dinâmica, com câmera na mão, dos quatro membros da família reunidos. Para cada momento em que a narrativa ameaça se tornar sombria demais – vide o encontro com o velho solitário na cabana – outros aparecem para equilibrá-la, a exemplo do discurso explicativo rumo ao final. Meu Extraordinário Verão com Tess nunca se torna um projeto profundamente questionador, embora alimenta a ambição louvável de carregar o subgênero do “filme de férias” com algumas reflexões mais complexas do que a média.

Além disso, o talento do cineasta no tratamento com o elenco infantil se transmite nas belas atuações de Sonny Coops Van Utteren e Josephine Arendsen, em chaves opostas: ele mantém a curiosidade e a surpresa no olhar, sempre disposto a absorver algo novo, enquanto ela parece mais madura, extrovertida e dona de si, o que cabe bem à personagem feminista antes mesmo de compreender o significado deste termo. Os adultos, igualmente bem dirigidos, transmitem uma visão respeitosa dos casais jovens e das famílias de classe média. Embora o filme seja carregado de fantasia, por meio da estética de aventura, ele nunca perde de vista a humanidade de seus personagens. Talvez os melhores filmes de férias sejam estes nos quais a experiência parece extraordinária àquele que a viveu, em seu interior, enquanto soa apenas como uma viagem comum para todos ao redor.

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Crítico de cinema desde 2004, membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema). Mestre em teoria de cinema pela Universidade Sorbonne Nouvelle - Paris III. Passagem por veículos como AdoroCinema, Le Monde Diplomatique Brasil e Rua - Revista Universitária do Audiovisual. Professor de cursos sobre o audiovisual e autor de artigos sobre o cinema. Editor do Papo de Cinema.
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Bruno Carmelo
7
Francisco Carbone
7
MÉDIA
7

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