Crítica
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Sinopse
Uma imersão audiovisual pelo Centro Histórico de João Pessoa. O recém-verticalizado bairro do Altiplano é um sintoma do atual projeto urbanístico que ameaça varrer a tradição para debaixo do tapete do desenvolvimento.
Crítica
“Fique na sua Miami e me deixe aqui na minha Cuba”. Foi a partir dessa frase que a diretora Carolina Oliveira começou a desenhar o documentário Miami-Cuba, filme que é tanto uma carta de amor à sua cidade natal, João Pessoa, como também um retrato crítico dos rumos por onde a urbanização da capital paraibana se desenvolveu nos últimos anos. Apontada pelos locais como a terceira mais antiga cidade do país, a antiga Parahyba (entre os tantos nomes que já a batizaram) nasceu no entorno do rio Sanhauá, por onde os primeiros conquistadores portugueses teriam aportado. No entanto, se lá se situa até hoje o Centro Histórico, não foi de forma circular que a expansão do município se deu. Essa investigação imobiliária está no centro do longa, que em nenhum momento, no entanto, se isenta em assumir um dos lados da questão: sua posição é marcada e assumida. O que pode ser uma vantagem em certas narrativas, nessa se revela uma muleta nem sempre firme, pois ao mesmo tempo abre espaço para discursos que poderiam ser, caso houvesse interesse, mais bem aproveitados como contraponto. Assim, há uma visão limitada, além de um desfecho mais improvisado do que construído ao longo do seu desenvolvimento.
O Centro Histórico não está no centro geográfico, mas em um dos extremos da cidade. Isso se dá porque a população optou por ir ocupando outros espaços, ao mesmo tempo em que os antigos foram, gradualmente, sendo abandonados. A explicação, ainda mais em um destino conhecido por sua vocação turística, não soa tão descabida: a movimentação começou a se dar em direção ao litoral. Com a consequente afluência de moradores para a nova região, limitações de ordem prática surgiram, enquanto em que a ambição dos corretores se mostrou ágil. O resultado foi a verticalização desses bairros que a partir do deslocamento foram originados. Isso está exposto de forma didática em cena, em tom quase professoral. Para os que não são paraibanos, tantas explicações funcionam, justamente por servirem como instrumento de localização aos de fora. Mas com a inversão do ponto de vista, essa mesma lógica termina por ser desconsiderada.
Sim, pois se o começo é abrangente em seus detalhamentos, logo o discurso passa a um alinhamento mais direcionado. Com isso, ao mesmo tempo em que os aspectos pontuais e específicos começam a ser ressaltados, funcionando como um guia do que de particular João Pessoa tem a oferecer ao olhar estrangeiro, também afasta desse mergulho os meros curiosos, pois o debate acaba por partir daqueles já donos das referências empregadas. Até pela expressão que dá título ao longa: Miami-Cuba. Com os arranha-céus gigantes, a perder de vista, com dezenas de andares, cada um disputando com o do lado a melhor vista do mar, com muito cimento, vidro e linhas retas, a cidade nova se tornou uma Miami tupiniquim, na qual cada residente se imaginava dono de um pedaço de uma América rica e desenvolvida. A questão é que esse processo se deu virando as costas para as próprias origens. Assim, o bairro antigo ficou conhecido por uma velha Cuba, de casarões prestes a ruir, renovações sempre em atraso e um aspecto decadente, porém pulsante de uma energia que se recusa a acabar.
Nesse ponto é que Caroline Oliveira deixa clara a sua posição. Afinal, a visão romantizada que estabelece a respeito dos moradores de “Cuba” – são todos artistas, ativistas, idealistas, revolucionários, engajados – faz com que pareçam ainda mais idealizados a partir da ausência daqueles que estão “no lado de lá”, ou seja, em “Miami”. As participações desses são tão raras que, quando assumem algum lugar de fala, é através daqueles em transição: a filha da família tradicional que, apesar das memórias que guarda da infância antes da transformação do cenário, hoje não reconhece aquele mais com um lugar seu, ou a mulher que conseguiu deixar o lugar que a sociedade lhe impingia e faz da nova moradia mais do que um ato político, mas de resistência. Ambas possuem um manancial impressionante a ser revelado. Porém, ocupam não mais do que breves momentos da trama. Partem, assim como chegam, deixando com os espectadores um gosto de quero mais. Fala-se tanto do que resultou após tanta plástica, que é inevitável o surgimento de uma curiosidade a respeito. Mas quanto a essa resta apenas a negação, quando não o desprezo e despeito. Melhor seria, por outro lado, um estudo dos seus motivos de ser e razões para existir. Porém, o caráter apaixonado da obra a impede tal distanciamento.
Assim, Miami-Cuba se mostra propícia aos já iniciados, mas incapaz de estabelecer um diálogo mais próximo junto aos recém-chegados. Até porque o drama que a cidade vive nada tem de muito particular – é reflexo de um processo que qualquer grande cidade atravessa, a gentrificação, a tomada de posse por meios mais sutis, mas não menos invasivos, o grito calado dos que tão longe do poder estão, ao passo que os que nas alturas se encontram nem mesmo consciência parecem ter dos desdobramentos de suas escolhas. Dançarinos performáticos, ao caminharem entre os imensos prédios próximos à costa, primeiro declaram se sentirem “vigiados, observados”, para logo em seguida refletirem: “talvez não, pois lá do alto nem se importam com o que se passa aqui embaixo”. Caroline Oliveira resvala na armadilha por ela própria apontada: está tão envolvida com o debate, que entrega um discurso pronto, sem espaço para análises ou reflexões vindas de fora. E quando se vê em uma tumultuada sessão na câmara dos vereadores da cidade, o que fica em evidência é o caráter local do debate, extinguindo-se de um alcance que poderia ser universal. A força do que é dito não pode ser negada. Carece, no entanto, de um olhar mais objetivo, que somente uma edição precisa e um roteiro melhor elaborado poderiam propiciar tal ajuste.
Filme visto em João Pessoa durante o 16º Fest Aruanda
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O filme me aparenta com uma crítica uma tanto irrelevante para as questões de João Pessoa. Acredito que houve uma generalização das pessoas que vivem no altiplano, que aliás é bem perto do Cabo Branco, local que a diretora reside. Eu acho que, como bem falou o crítico no texto, não é que os paraibanos não gostem do centro, por isso houve essa gentrificação, ressalta-se que o bairro do Altiplano é extremamente recente, não tem nem 10 anos de formação. A gentrificação já tinha ocorrida a décadas atrás, quando as pessoas foram morar mais perto da praia, como Cabo Branco, Tambaú, Manaíra e Bessa, por exemplo. Como que o desenvolvimento do Altiplano é o responsável pela desvalorização do centro, se o bairro é extremamente novo, e o centro não está sendo muito habitado há muito tempo?