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Crítica


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Sinopse

Limitado por uma deficiência, Aziz, contudo, não se dá por vencido e conquista a mulher mais bonita da vila. Exaustos pelos problemas do local, eles se mudam para outra cidade, onde enfrentarão a dureza do preconceito.

Crítica

Inspirado por uma história real, Milagres do Amor traz o drama de Aziz (Mert Turak), morador de uma humilde aldeia no leste da Turquia e que possui acentuadas deficiências físicas, com limitações de movimento e de fala. Essa trajetória é narrada por Mizgin (Biran Damla Yilmaz), a jovem e bela esposa do protagonista, que inicia seu relato com o fardo – a princípio – do casamento arranjado pelo pai, como pagamento de uma dívida de gratidão com o pai de Aziz, seguindo com a mudança do casal para a cidade litorânea de Foça, antigo território grego, sob os cuidados do benevolente professor Mahir (Fikret Kuskan). Dando continuidade à história iniciada em Mucize (2015), o diretor Mahsun Kirmizigül apresenta uma jornada de superação repleta de percalços, que vão do preconceito em relação à condição de Aziz ao fato da união com Mizgin não ser oficializada pela lei – algo visto com maus olhos pela sociedade turca da década de 1960, período em que se passa boa parte da trama.

Auxiliando o casal frente a tantas dificuldades, além de Mahir, temos um grupo de moradores de Foça, com destaque para o dono do cinema local, Bahattin (Erdal Özyagcilar), e seu assistente, Ali (Sinan Çaliskanoglu). Dos planos panorâmicos e tomadas aéreas que exploram as belas paisagens naturais, passando pela trilha sonora incessante e grandiloquente, e mesmo pela longa duração e pelo número de personagens coadjuvantes, tudo na narrativa de Kirmizigül possui contornos épicos, que embalam um apanhado das principais convenções desse tipo de conto edificante, exibindo alguma dose de humor, mas deixando prevalecer a carga dramática. Essa imposição de tom, infelizmente, se dá de forma pouco natural, com o diretor deixando transparecer uma mão pesada e maniqueísta. Em nenhum momento Kirmizigül parece confiar na força intrínseca da situação de seu protagonista, insistindo em amplificar a emotividade pelas vias do excesso e da repetição.

É o que se vê nas incontáveis cenas de bullying praticado pelas crianças, nas ofensas, nos olhares e comentários dos vizinhos, lançados sobre Aziz, que de imediato se torna o centro das atenções de toda a cidade, tratado como uma aberração nunca vista (algo que depois se mostra, além de tudo, incoerente, quando revelada a existência de dezenas de moradores locais com deficiências similares a do personagem). Uma condução completamente ancorada no exagero, com cada conflito, por menor que seja, tratado com uma gravidade ostensiva, marcada por discursos cheios de frases prontas e trilha musical intrusiva. O efeito obtido por essa abordagem acaba sendo justamente o oposto ao pretendido, pois, se tudo é grave, não há como diferenciar o peso das situações, com o filme travando uma batalha interna para que cada sequência tenha um impacto que supere a anterior.

Sequências essas que se acumulam em uma montagem sem fluidez, saturada de sobras que pouco ou nada acrescentam ao desenrolar dos fatos – como as passagens com o intuito de situar a trama historicamente, com notícias de rádio e jornal sobre a eventos como a Crise dos Mísseis de Cuba ou a morte de JFK. Esse apego à cultura estadunidense, aliás, chega a ser curioso, pois ainda que aborde questões tipicamente locais – como os conflitos Turquia/Grécia – na maior parte do tempo, a visão de Kirmizigül é carregada de um verniz hollywoodiano – o fanatismo de Ali por Elvis, as pessoas dançando rock cantado em inglês na praia ou os próprios filmes exibidos no cinema de Bahattin. Contudo, é justamente desse último elemento, o cinéfilo, que surgem os raros momentos de delicadeza do longa, como a subtrama envolvendo Bahattin e sua amada, os jogos de adivinhação com as frases de filmes famosos ou a descoberta da “magia’ do cinema por Aziz, que aprende o ofício de projecionista, desenvolvendo uma relação de amizade com Bahattin com ecos de Cinema Paradiso (1988).

São esses os poucos respiros existentes em Milagres do Amor, que no fim acabam soterrados pela avalanche de sentimentalismo de uma narrativa inchada e obstinada a forçar o choro a cada cinco minutos. Tudo isso faz com que os dramas soem artificiais, prejudicando um elenco realmente carismático e empenhado, bem como seus personagens, que possuem arcos individuais de interesse. Para completar, há ainda uma mudança de protagonismo no ato final que, ao que tudo indica, retoma a dinâmica do filme anterior, mas que se sente aleatória na análise isolada desta continuação, inserindo primeiro um elemento romântico e, posteriormente, o da tragédia. A opção por um desfecho lúgubre, ao invés da leveza típica deste tipo de jornada inspiracional, talvez seja a única real surpresa do trabalho de Kirmizigül. O que não significa, porém, que seja uma boa surpresa, já que ela apenas reforça uma faceta manipuladora e apelativa, que busca apenas as lágrimas fáceis.

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é formado em Publicidade e Propaganda pelo Mackenzie – SP. Escreve sobre cinema no blog Olhares em Película (olharesempelicula.wordpress.com) e para o site Cult Cultura (cultcultura.com.br).
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