Crítica
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Sinopse
Nildo e Alonso são catadores de almas vagantes atrás de sonhos e medos descartados.
Crítica
“O impossível é só mais uma opção para quem está acostumado a sonhar”. Frases como essa permeiam a trama de Minutos Atrás, um dos mais interessantes filmes brasileiros do momento. Ao contrário de obras genéricas que investem em terrenos seguros como a comédia romântica ou o thriller policial, aqui temos um ideário poético que discursa sobre temas filosóficos, investindo em questões a respeito da vida e da morte, do ir e vir, do amar e deixar partir. São elementos até um pouco corriqueiros, mas que ganham nova percepção graças ao excelente trio de atores que defendem com total entrega seus personagens, e à condução tranquila do diretor Caio Sóh, que mesmo em um de seus trabalhos iniciais consegue obter o melhor dos talentos ao seu redor.
Alonso (Vladimir Brichta) e Nildo (Otávio Müller) são dois homens, literalmente, sem eira nem beira. Estão num cantão do mundo, e tudo o que possuem é o que carregam: a mala que um deles usa para dormir, uma carroça cheia de cacarecos – a grande maioria sem a menor utilidade – e o cavalo Ruminante (Paulinho Moska), fiel companheiro e ouvido para qualquer divagação. Essa trupe não sabe muito bem para onde ir, já há muito esqueceu do lugar que veio e se questiona constantemente a respeito de suas atuais aspirações. O que buscam, afinal? É preciso se livrar da pecha de ser corno, ou essa pode ser uma condição invejada e até admirável? O feio é bonito aos olhos de quem o vê ou o contrário é mais provável? E a morte, chega de mansinho quando menos esperamos ou está sempre ali, à espreita, como uma companheira eterna e indesejável?
Dividido em três capítulos, cada um pontuando a morte – figurativa ou real – de um dos personagens, Minutos Atrás caminha pelo universo fantástico de escritores como Ariano Suassuna e Guimarães Rosa, porém com uma verve mais moderna e contemporânea. Não importam muito questões como tempo ou lugar. O debate é sobre o que está sendo discutido, suas simbologias e referências. Os heróis de Cervantes também podem servir de espelho para muito do que aqui é explorado, porém num teor mais apropriado aos dias atuais. Mas não só o texto exerce essa função de promover a reflexão. O uso das cores – ora colorido, ora preto e branco, ora tudo junto – e a fotografia que de forma inteligente faz uso do seu espaço para reforçar a unicidade destes tipos, assim como outras alegorias – o cavalo em alguns momentos é gente, noutras é animal – fazem com que o espectador ultrapasse um momento de rejeição inicial – o novo pode provocar reações diversas – para mergulhar de cabeça neste mundo tão singular, e ao mesmo tempo tão próximo.
Vladimir Brichta e Otávio Müller compõem uma dupla e tanto, e a química que se forma entre os dois é responsável pelos melhores momentos da ação, graças à fluidez que os diálogos entre eles consegue adquirir. Por outro lado, Paulinho Moska é um achado, pois não só exercita seus músculos interpretativos – seu último filme como ator havia sido O Homem do Ano (2003) – como também dá vazão ao sempre bem-vindo viés musical, ao transformar em composições seus diálogos, que não só pontuam o desenrolar dos acontecimentos entre eles como também colabora na experiência sensorial oferecida à audiência.
Caio Sóh pode não ser um realizador de primeira viagem – foi responsável antes pelo premiado Teus Olhos Meus (2011) – mas é humilde o suficiente para fazer de Minutos Atrás um filme colaborativo, feito em conjunto com seus atores e equipe técnica, no qual se percebe o envolvimento de todos, tanto na frente da câmera como também nos seus bastidores. Apesar de não negar sua origem teatral – é baseado numa peça do mesmo realizador – e de não ser feito para todos os públicos, entrega uma obra à altura daqueles que se esforçarem para vivenciar a proposta feita no decorrer de sua história. Afinal, pois mais estranha que possa ser a mensagem oferecida, ao analisarmos de perto quem a entrega veremos o quão próximos estamos todos de um mesmo destino.
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Excelente filme. Não sou estudante do tema, sou um espectador comum, mas que consegue captar algumas mensagens de tantas que são repassadas...somente lendo uma magnífica crítica para compreender melhor o universo dessa obra grandiosa. E viva o Cinema 🎥 Nacional!
É um filme sem epifania mas com muitas percepções e sacadas, é cult. Se a pessoa está esperando um lugar comum, melhor nem tentar. Pra ver esse filme a pessoa tem que estar ou muito curiosa pra ver algo totalmente diferente do comum de todos os cinemas blockbusters, ou com muita preguiça pra sair do lugar. O filme começa tipo trapalhões – não parece que vai sair nada dali mas uma ou outra coisa encantam, intrigam, abrem o coração -, no meio confunde e confirma que a confusao é o objetivo, e então agente fica ansioso pra saber onde vai dar. Quando chega no final meio que vira uma bexiga perdendo o ar, dá uma certa decepção mas, quando termina mesmo, deixa aquela ar de um monte de interrogação que o espectador tem que manter em si, porque não tem onde deixar. É um filme colaborativo até pro espectador que tem qeu colaborar com o entendimento em si, pra manter as dúvidas. No meu entendimento de diretora/espectadora, a morte é o personagem do vladmir brichta. Ele morre no começo, Naquela parte inicial, e depois mostra pros outros que morrer é o caminho, o cavalo se recusa e dá à volta na morte. Ela está sempre lá… menos quando dorme. Ja que tem a certeza que vai estar lá… e não está.