Crítica
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Crítica
Ter ciência da História é o primeiro passo para entender uma série de contornos da contemporaneidade, sobretudo aquilo que nos constitui atualmente enquanto aglomerado social. Missão 115 é um documentário que investiga o autoritarismo e a brutalidade militares durante o regime ditatorial ao qual o Brasil foi submetido. Formalmente, embora recorra a certos artifícios em busca de uma variedade narrativa, sua força está, justamente, na maneira contundente com a qual entrecruza depoimentos. As falas são oriundas de fontes múltiplas, de agentes de diversas representações da coletividade civil a membros do legislativo, passando, sugestivamente, pela fala de pessoas diretamente ligadas às barbaridades da ditadura civil-militar que vigorou em território brasileiro entre 1964 e 1985. O emblemático atentado ao Riocentro, em 1981, é tido, nesse sentido, como um momento imprescindível para que a política de perpetuação do medo, levada a cabo por milicos relutantes, fosse desmascarada.
Embora seja um exemplar essencialmente de “cabeças falantes”, Missão 115 sabe aproveitar as reminiscências, os estudos e as análises feitas a posteriori para se configurar num longa-metragem de importância vital, senão essencialmente do ponto de vista cinematográfico – embora suas qualidades nesse campo também sejam evidentes –, mas como valiosa peça de revelação de verdades pouco disseminadas. Fazendo uma espécie de exumação do período em que a ditadura começava a experimentar o seu ocaso, com um desgaste natural antecedendo o inevitável, mas moroso, processo de reabertura democrática, o cineasta Silvio Da-Rin oferece indícios da atividade clandestina de militares que tentavam desesperadamente manter-se no poder. Nesse sentido, um dos depoimentos mais esclarecedores é o do ex-policial Claudio Guerra, que desnuda despudoradamente os mecanismos repressores dos quais fez parte assassinando adversários e ocultando cadáveres.
O realizador reafirma o crédito dos homens e mulheres que falam ao longo do filme, incorrendo desnecessariamente num didatismo que pouco acrescenta. Outros excertos dispensáveis são a dramatização, com o ator encenando cotidianidades militares, tais como a redação de missivas incriminadoras e a queima de arquivos, bem como os circunstanciais surgimentos de Da-Rin em cena. Esses procedimentos, por certo, visam conferir outras tintas ao todo, mas acabam sendo banais, especialmente frente à pungência das falas e à incisão decorrente da forma inteligente como a montagem as combina. Engrossando as fileiras dos esforços relativamente recentes para que a História brasileira seja devidamente desvendada, Missão 115 demonstra a cadeia de poder que, primeiro, articulava atentados a bancas de jornal, repartições públicas, entidades de classe e proeminentes, para, segundo, utilizar a máquina estatal a fim de transferir a culpa à esquerda, manipulando a massa e criando medo.
Missão 115, portanto, não é exclusivamente sobre as bombas que explodiram no estacionamento do Riocentro em 30 de abril de 1981, pois abarca antecedentes desse episódio sintomático e sua importância à emersão de bastidores. Nesse conjunto, Da-Rin logra êxito ao expor as tentativas de acobertamento do exército que, novamente, buscou imputar responsabilidade a detratores e opositores diretos, contra todos os sinais claros. Trazendo essa constatação ao presente, o cineasta se detém brevemente na atuação penosa da Comissão da Verdade e no impeachment sofrido pela então presidenta Dilma Rousseff, atrelando, nas entrelinhas, os desmandos dos poderosos de outrora às manobras atuais para garantir a manutenção do status quo. Mesmo engessado conceitualmente, incorrendo num flerte com o puramente jornalístico, o filme extrai potência da revelação de verdades inconvenientes aos militares que governaram o país e à nossa elite canalha e perversa.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Marcelo Müller | 7 |
Robledo Milani | 6 |
MÉDIA | 6.5 |
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