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Crítica


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Sinopse

Missão 115 foi o nome atribuído pelo DOI-CODI (órgão de repressão do exército durante a ditadura civil-militar) a uma suposta operação de “vigilância” no Rio de Janeiro, durante show musical no Riocentro pelo Primeiro de Maio de 1981. Na verdade, tratava-se de um atentado a bomba, frustrado, que visava sabotar a redemocratização do país. Pela primeira vez, um dos membros daquela equipe de terroristas, o ex-policial Claudio Guerra, conta em detalhes como a operação foi planejada e executada. Os trabalhos recentes da Comissão Nacional da Verdade também jogam novas luzes sobre o episódio e as sucessivas tentativas de apuração ao longo de mais de três décadas.

Crítica

Ter ciência da História é o primeiro passo para entender uma série de contornos da contemporaneidade, sobretudo aquilo que nos constitui atualmente enquanto aglomerado social. Missão 115 é um documentário que investiga o autoritarismo e a brutalidade militares durante o regime ditatorial ao qual o Brasil foi submetido. Formalmente, embora recorra a certos artifícios em busca de uma variedade narrativa, sua força está, justamente, na maneira contundente com a qual entrecruza depoimentos. As falas são oriundas de fontes múltiplas, de agentes de diversas representações da coletividade civil a membros do legislativo, passando, sugestivamente, pela fala de pessoas diretamente ligadas às barbaridades da ditadura civil-militar que vigorou em território brasileiro entre 1964 e 1985. O emblemático atentado ao Riocentro, em 1981, é tido, nesse sentido, como um momento imprescindível para que a política de perpetuação do medo, levada a cabo por milicos relutantes, fosse desmascarada.

Embora seja um exemplar essencialmente de “cabeças falantes”, Missão 115 sabe aproveitar as reminiscências, os estudos e as análises feitas a posteriori para se configurar num longa-metragem de importância vital, senão essencialmente do ponto de vista cinematográfico – embora suas qualidades nesse campo também sejam evidentes –, mas como valiosa peça de revelação de verdades pouco disseminadas. Fazendo uma espécie de exumação do período em que a ditadura começava a experimentar o seu ocaso, com um desgaste natural antecedendo o inevitável, mas moroso, processo de reabertura democrática, o cineasta Silvio Da-Rin oferece indícios da atividade clandestina de militares que tentavam desesperadamente manter-se no poder. Nesse sentido, um dos depoimentos mais esclarecedores é o do ex-policial Claudio Guerra, que desnuda despudoradamente os mecanismos repressores dos quais fez parte assassinando adversários e ocultando cadáveres.

O realizador reafirma o crédito dos homens e mulheres que falam ao longo do filme, incorrendo desnecessariamente num didatismo que pouco acrescenta. Outros excertos dispensáveis são a dramatização, com o ator encenando cotidianidades militares, tais como a redação de missivas incriminadoras e a queima de arquivos, bem como os circunstanciais surgimentos de Da-Rin em cena. Esses procedimentos, por certo, visam conferir outras tintas ao todo, mas acabam sendo banais, especialmente frente à pungência das falas e à incisão decorrente da forma inteligente como a montagem as combina. Engrossando as fileiras dos esforços relativamente recentes para que a História brasileira seja devidamente desvendada, Missão 115 demonstra a cadeia de poder que, primeiro, articulava atentados a bancas de jornal, repartições públicas, entidades de classe e proeminentes, para, segundo, utilizar a máquina estatal a fim de transferir a culpa à esquerda, manipulando a massa e criando medo.

Missão 115, portanto, não é exclusivamente sobre as bombas que explodiram no estacionamento do Riocentro em 30 de abril de 1981, pois abarca antecedentes desse episódio sintomático e sua importância à emersão de bastidores. Nesse conjunto, Da-Rin logra êxito ao expor as tentativas de acobertamento do exército que, novamente, buscou imputar responsabilidade a detratores e opositores diretos, contra todos os sinais claros. Trazendo essa constatação ao presente, o cineasta se detém brevemente na atuação penosa da Comissão da Verdade e no impeachment sofrido pela então presidenta Dilma Rousseff, atrelando, nas entrelinhas, os desmandos dos poderosos de outrora às manobras atuais para garantir a manutenção do status quo. Mesmo engessado conceitualmente, incorrendo num flerte com o puramente jornalístico, o filme extrai potência da revelação de verdades inconvenientes aos militares que governaram o país e à nossa elite canalha e perversa.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

Grade crítica

CríticoNota
Marcelo Müller
7
Robledo Milani
6
MÉDIA
6.5

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