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Sinopse

Existe um mundo recheado de monstros poderosos paralelo ao nosso. Um esquadrão de elite é transportado para lá através de um portal dimensional, obrigado a se deparar com a circunstância mais chocante de sua vida.

Crítica

Baseado numa famosa franquia de games, Monster Hunter é um veículo de promoção à atriz Milla Jovovich, além de uma insuspeita e descarada propaganda de chocolate. Muito mais importante que a mitologia por trás da existência paralela de dois mundos é a reafirmação de que a protagonista, a capitã Artemis, é capaz de várias estripulias quase sobre-humanas para perdurar num ambiente hostil. Sobre o contexto, há um par de diálogos expositivos, nos quais alguém (um veterano daquele universo repleto de monstros e dunas de areia) explica à forasteira, bem detalhadamente, o que está acontecendo. Já as peripécias da militar ganham espaço a ponto de sufocarem os demais vieses. Milla surge como liderança, se recupera rápido como ninguém do baque sofrido diante do extraordinário, faz amizade com um sujeito casca-grossa que não fala sua língua, aprende técnicas de luta novas com a velocidade dos hiperdotados e é vista repetidas vezes prevalecendo a despeito das probabilidades desfavoráveis. O filme é sobre como essa personagem tende a ser incrível. E o cineasta Paul W.S. Anderson, curiosamente, nem preenche de camadas esse entendimento, tornando-o bem superficial.

A trama mostra um grupo de soldados que, em meio à patrulha de uma região potencialmente perigosa, é tragado à realidade na qual habitam monstros descomunais e fundamentalmente agressivos. Paul W.S. Anderson logo apresenta suas credenciais bastante conhecidas, ou seja, apara as arestas, elimina personagens como se eles não fossem humanos, mas meros empecilhos ao brilho quase solitário da protagonista, e aposta numa ação repleta de desperdícios. A correria desenfreada se dá numa lógica que privilegia o aspecto físico, dentro dela não cabendo atenção aos personagens. E o realizador não consegue um resultado para além de sequências anticlimáticas com ataques gigantescos e repetitivos. São 90 minutos de criaturas enormes irritadas pela presença humana e Milla Jovovich fazendo pose heroica quando consegue sobreviver apesar das condições adversas. É difícil encontrar alguma recompensa ao buscarmos, por exemplo, um subtexto. E matéria-prima há. Afinal de contas, Artemis é membro do exército estadunidense, instituição dada a intervenções em territórios estrangeiros. Poderia haver algo sob esse tumulto todo? Claro, mas o terreno é oco.

Um dos instantes constrangedores de Monster Hunter é quando Artemis, depois de ter lutado com seres inimagináveis, ser colocada num casulo, passado perto de morrer, chacoalhada de todas as maneiras, tira um chocolate intacto do bolso e oferece ao companheiro de ocasião como sinal de boa fé. Haja suspensão de descrença. Sabemos que o cinema é uma engrenagem cara e precisa de financiamento, mas chega a ser grosseira a inserção publicitária, primeiro, com o plano-detalhe na marca da guloseima e, segundo, vide a insistência de transformá-la em predicado. Tudo saboroso é chamado de chocolate. Outro ponto curioso, infeliz especificamente à plateia brasileira, é a tão celebrada estreia hollywoodiana da atriz Nanda Costa, que acontece exatamente neste filme. Provavelmente, somados todos os seus relances em cena, não temos ao todo 30 segundos, com somente uma fala (na verdade uma palavra). É muito pouco para uma intérprete do seu talento. A situação demonstra como ainda nos acomodamos numa posição excessivamente subserviente em relação ao cinemão gringo. Porém, quase não há coadjuvantes em Monster Hunter, apenas meros figurantes.

Monster Hunter poderia ser um divertido exemplar em que a ação prevalece, no qual a movimentação e a adrenalina se encarregam de ditar as regras. Há tentativas nesse sentido, mas o sucesso delas esbarra na incapacidade de Paul W.S. Anderson de gerar mais que impacto pontual ao colocar personagens esvaziados diante de perigos potencialmente fatais. O filme também teria espaço para adentrar no terreno da cáustica sátira militarista – como fez brilhantemente Paul Verhoeven em Tropas Estelares (1997) , mas para isso seria preciso partir do entendimento dessa importância conjuntural e do papel que os personagens desempenham no mundo. Os efeitos especiais ora são convincentes, ora deixam a desejar (principalmente nos ataques que levantam poeira/areia). Milla Jovovich não é má atriz, inclusive merece reconhecimento como perpetuadora da tradição cinematográfica das heroínas duronas, embora, como aqui, seja hiperbolizada pelo marido Paul W.S. Anderson até sumir enquanto gente. Para fechar a fatura, a dinâmica com Tony Jaa remete demais a lógica do colonizador europeu guiado pelo membro da localidade a fim de desbravar um novo território.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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