Sinopse
Portador de uma rara doença sanguínea, Michael Morbius está determinado a salvar pessoas que tenham uma condição parecida. Depois de fazer uma aposta extrema, ele acaba sendo afetado por uma espécie de vampirismo.
Crítica
O personagem Michael Morbius surgiu nos quadrinhos na década de 1970. Isolado na infância por conta de uma rara doença sanguínea, ele se tornou um adulto brilhante. Mas, caiu em desgraça ao ultrapassar certos limites éticos, especificamente ao misturar genéticas humana e de morcego em busca da cura para sua enfermidade. Transformado num vampiro, Morbius se encaixou no universo Homem-Aranha como vilão. A começar por sua gênese, não há nada de tão singular nessa figura. O vampirão nasceu dentro de uma tradição conhecida, a dos cientistas punidos por sua ambição desmedida – vide o Homem Invisível do romance de H. G. Welles ou o Lagarto, do mesmo universo do aracnídeo Amigão da Vizinhança. O interessante nele é a utilização da mitologia dos vampiros, principalmente a sede incontrolável de sangue e a animalidade que lhe deixa sobre-humano. Mas, em Morbius o personagem precisa subverter a própria essência desde o princípio e ser...um herói. Vivido por Jared Leto, ele é apresentado como um sujeito inescrupuloso, capaz de romper com o bom senso para ter sucesso. Para Morbius, os fins justificam os meios. No entanto, assim que sente os efeitos colaterais de sua experiência, se torna um rapaz instável e...bonzinho. Pretensamente corroído por uma culpa cortante, ele não pretende sucumbir ao seu lado sombrio. Há nisso uma pasteurização, também denunciada pelo vermelho dessaturado do sangue (para não ferir suscetibilidades e deixar os espectadores confortáveis).
O cineasta Daniel Espinosa tinha várias possibilidades para introduzir o personagem no universo Sony/Marvel de vilões do Homem-Aranha – os dois filmes sobre Venom são os pilares dessa empreitada de gosto bastante questionável e paralela ao Universo Marvel. A principal delas era utilizar os códigos do terror para abordar Morbius, uma vez que ele se torna literalmente um vampiro, ou seja, uma criatura brutal. O cineasta demonstra ciência do terreno no qual pisa ao homenagear um dos clássicos do gênero, Nosferatu (1922) – ele batiza o barco com o sobrenome do diretor alemão F. W. Murnau e reproduz da obra-prima expressionista a embarcação vazia de sobreviventes (lotada de cadáveres). No entanto, para além dessas piscadelas do tipo “conheço a tradição”, o comandante sueco de ascendência chilena passa longe de fazer de Morbius um filme genuinamente de terror. Além disso, chama a atenção (negativamente) a dimensão plana (rasa) das pessoas que transitam em cena, a sua gritante ausência de profundidade emocional e psicológica. Exemplo disso é visto na imediata indignação da Dra. Martine (Adria Arjona) pela falta de ética do colega. Nas tomadas posteriores, ela ajuda entusiasmadamente o plano que a tinha escandalizado. Adiante, Martine dá uma de Bella Swan da saga Crepúsculo ao flertar com o monstro como se estivesse fazendo algo sexy, inocente e quase corriqueiro.
O simplismo de Morbius seria mais adequado à caricatura, à sátira ou, ao menos, a uma pegada que não levasse tudo tão a sério. Aqui o “levar a sério” é a tentativa de situar na esfera trágica a história do homem que luta contra a sua nova (?) natureza. Jared Leto faz uma força danada para validar o protagonista que, no entanto, é desprovido de arestas e ambiguidades. A batalha íntima de Michael Morbius contra o vampirismo não gera uma discussão intensa entre ser e (não) querer ser, apontando mais à necessidade conceitual-mercadológica de transformar um vilão notório em alguém disposto a salvar o dia. Tanto que o roteiro insiste que o cientista/monstro (Jekyll e Hyde, de O Médico e o Monstro) evita ao máximo matar. Morbius apenas destrói quando está totalmente fora de si. Portanto, o culpado nunca é ele em sã consciência, mas o seu primitivismo descontrolado. Já Milo (Matt Smith), o melhor amigo do cientista/monstro e portador da mesma doença, é aquele que abraça as consequências. Ele não nega o novo comportamento assassino se isso garantir vantagens no mundo que sempre o viu como deficiente. E a trama nem dá bola para os dilemas do herói diante do amigo vilão, quando muito relembrando a amizade em instantes tolos de mero desabafo. Nos momentos verdadeiramente decisivos, sobretudo nas batalhas, poucas vezes há ênfase nas consequências emocionais.
Outro problema de Morbius é a quantidade de personagens descartáveis. Nem dá para se indignar somente com a coadjuvante feminina sem subjetividade que serve de muleta ao protagonista homem. Isso porque há várias outros coadjuvantes nessa situação. Todos têm funções claras, mas nenhum é imprescindível. Emil (Jared Harris) é a figura paterna substitutiva que nem emplaca na hora do sacrifício. A dupla de policiais formada por Rodriguez (Al Madrigal) e Simon (Tyrese Gibson) é de uma inutilidade atroz, sequer servindo para destacar algo novo. Por que cargas d’água o roteiro reforça a atuação dos policiais se eles sempre chegam atrasados às conclusões e nunca representam um real empecilho a Morbius? Dentro do desenvolvimento apressado da trama, vemos saltos temporais (as chamadas elipses) que abreviam desajeitadamente as coisas ao ponto de esvaziá-las – vide o que antecede a prisão do protagonista. Com direito a cenas alusivas a Batman Begins (2005) – a dos morcegos voando em torno do homem –, há também as sequências de ação beirando o incompreensível. A montagem desajeitada, os efeitos especiais de qualidade bem questionável, a ausência de vigor dramático em meio às batalhas visualmente confusas, tudo isso forma um conjunto tão frouxo quanto inofensivo. Por fim, o vilão que virou herói volta a ser vilão, DO NADA, numa das cenas pós-créditos. É mole?
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Grade crítica
Crítico | Nota |
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Marcelo Müller | 3 |
Robledo Milani | 3 |
Lucas Salgado | 3 |
Ticiano Osorio | 3 |
Ailton Monteiro | 2 |
MÉDIA | 2.8 |
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