Crítica
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O cinema mundial sempre bate na velha fórmula. Não é de hoje que, se algo deu certo, é preciso insistir no assunto até o esgotamento. Após o sucesso de público e crítica de Assassinato no Expresso Oriente (1974), a onda de adaptações das obras de Agatha Christie cresceu aos olhos dos executivos de Hollywood, especialmente nas tramas estreladas pelo detetive belga Hercule Poirot, o personagem mais conhecido e amado da escritora britânica. Ainda mais depois que Albert Finney foi indicado ao Oscar por interpretar o papel. Porém, ele preferiu não continuar e, em seu lugar, entrou Peter Ustinov. Sua primeira incursão foi em Morte Sobre o Nilo que, ironicamente, traz uma trama parecida com a do sucesso de 1974. O resultado é um pouco “mais do mesmo”, mas mantém o entretenimento em alta, ainda mais com seu elenco de peso.
Aqui, Poirot está de férias no Egito e acaba confrontado pelo assassinato de Linnet Ridgeway (Lois Chiles), morta em um cruzeiro sobre o famoso rio que banha o Egito. Dona de uma imensa fortuna, sua coleção de inimizades era alta. Curiosamente, boa parte delas está a bordo. Temos Jacqueline De Bellefort (Mia Farrow), que perdeu seu amor, Simon Doyle (Simon MacCorkindale) para a ex-melhor amiga; Mrs. Van Schuyler (Bette Davis), uma falida socialite de olho nas joias da vítima; sua assistente desbocada, Miss Bowers (Maggie Smith), que tem um passado conturbado com os Ridgeway; Andrew Pennington (George Kennedy), seu tio, que estava pra perder o controle das ações da família; Salome Otterbourne (Angela Lansbury), uma escritora alcóolatra processada por Linnet por difamação; sua filha, Rosalie (Olivia Hussey), envolvida com um marxista (Jon Finch) que tem pavor de ricos; além de um estranho médico (Jack Warden).
O longa de John Guillermin, responsável por Inferno na Torre (1974) e a então recente adaptação de King Kong (1976), segue à risca o material em que é baseado, contando a história lentamente e aprofundando seus personagens. Se o filme começa num prólogo de 15 minutos que envolve a amizade de Linnet e Jacqueline até o consequente “roubo” do namorado da amiga, logo pulamos para a lua-de-mel do casal nas ruínas do Egito. Entre passeios por pirâmides e o deserto do país, Linnet e Simon são constantemente confrontados pelas aparições de Jacqueline como uma legítima stalker inconformada com sua perda. Apesar da direção não ser inventiva na maior parte do tempo, há alguns momentos pontuais em que o cenário é aproveitado de forma rica, como a cena em que todos os personagens são vistos, cada um em um canto, num longo plano sequência, até a primeira tentativa de assassinato da vítima, com uma gigante pedra jogada do alto de uma estrutura arquitetônica antiga.
Porém, mesmo com um ritmo que poderia cair na monotonia, Guillermin prende a atenção do espectador ao transformar as relações e a investigação de forma mais dinâmica, sem perder tempo em depoimentos individuais de cada envolvido. Poirot tem um olhar clínico sobre o assassinato muito maior do que apenas ouvindo os suspeitos e testemunhas. Ainda mais quando outras mortes ocorrem e podem estar relacionadas com o crime principal. No entanto, o roteiro falha ao apresentar subplots que ficam mal resolvidos, como o roubo das joias, que chega a ser quase inverossímil. Nisso, o aproveitamento máximo das locações exóticas do Egito acaba se sobressaindo para esconder estas imperfeições narrativas.
O elenco também acaba se destacando, como as participações divertidíssimas de Angela Lansbury e Maggie Smith (estas duas, inclusive, indicadas ao BAFTA como atrizes coadjuvantes), a própria Lois Chiles (que nunca alcançou grande estrelato, sempre lembrada mais por sua clássica beleza) e, claro Peter Ustinov na pele de Poirot. Ainda que não seja o melhor título adaptado dos livros de Miss Agatha, o filme conseguiu redefinir a carreira do ator (também indicado ao BAFTA pelo papel), que reprisaria seis vezes o excêntrico detetive nas telonas e na TV. Morte Sobre o Nilo não fez tanto sucesso quanto Assassinato no Expresso Oriente, ainda que tenha levado pra casa a estatueta de Melhor Figurino no Oscar de 1979, mas é uma bela diversão que atinge seu objetivo. Afinal, um whodunit de Agatha Christie é melhor que a reunião de quaisquer dezena de suspenses policiais meia boca que vemos por aí.
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