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Crítica


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Sinopse

Tom vai até o funeral de seu amado Guillaume. No entanto, a família do falecido desconhecida sua homossexualidade. O forasteiro é então obrigado a contar uma mentira para poder se despedir de seu amor.

Crítica

Xavier Dolan é conhecido, para o bem ou para o mal, por sua afetação. Quando, ainda aos 21 anos, o canadense se tornou um prodígio ao impressionar Cannes com Eu Matei a Minha Mãe (2009), virou uma espécie de símbolo. Para alguns, do mau gosto e do kitsch da geração "hipster", fazendo um cinema que dizia menos do que mostrava e cheio de extravagâncias de estilo. Para outros, de ousadia e sofisticação, retratando a geração atual e suas neuras a partir dos olhos de alguém que, afinal, vive tudo isso na pele. O cineasta foi crescendo dentro dos sets (literalmente) até fazer Laurence Anyways no ano passado, um flerte com a transexualidade (afetadíssimo, é claro) de quase três arrastadas horas de duração. Ressurge em 2013 com Tom na Fazenda, adaptação do próprio Dolan para uma peça de Michel Marc Bouchard. Um ressurgimento e tanto, diga-se de passagem.

Sem explicar muito, o longa conta a história de Tom (Xavier Dolan, com o pior cabelo que você vai ver no cinema esse ano), um publicitário de Montreal que vai para o interior do Quebec (daí o título do filme) participar do funeral de seu namorado. No entanto, a família do garoto não faz ideia da orientação sexual do falecido, sequer conhece Tom. A partir daí, o protagonista vai se envolvendo numa trama de neuroses e intrigas que pode colocar sua própria vida em perigo. Exceto pela relação tumultuada e psicótica com a família (especialmente com a mãe), o filme não tem absolutamente nada da filmografia pregressa de Dolan. Quem for ao cinema esperando o estilo mais colorido que um cupcake e mais afetado que um show de drag talvez até se decepcione com a fotografia soturna e o aspecto sombrio do longa. Provavelmente influenciado por Almodóvar (ou, por que não, pelo último filme de Alain Guiraudie, O Estranho do Lago, 2013), o diretor decide pintar com tintas de suspense, quase terror, um retrato do desejo - não apenas o homossexual, mas o desejo humano, em sua forma mais pura. Mais uma vez, a relação entre sexo e morte parece ser mais explícita aos francófonos, que chamam orgasmo de "petite mort" (pequena morte, em tradução literal).

Agathe, a mãe enlutada, é brilhantemente construída por Lise Roy. Literalmente aos pedaços, vai do riso à violência num piscar de olhos e é difícil dizer "de que lado" a personagem está. Um enigma tão perigoso quanto assustador. E há Francis. Num tour de force de Pierre-Yves Cardinal (um ator em quem, desde já, vale a pena prestar atenção), com um olho verde, outro azul, o irmão mais velho do falecido é uma assombração que, literalmente, vai puxar o pé de Tom de noite. Cheio de segredos escondidos atrás de sua extrema beleza rústica, obscuridades e um comportamento tão violento quanto absurdo, leva o espectador do ódio ao medo, da compaixão ao desprezo, tudo sem verter uma lágrima, sem subir o tom de voz, sem nenhum exagero ou muleta de interpretação.

A direção, ao assumir o ponto de vista de Tom, acaba não entregando ao público a ciência do que realmente se passa na cabeça dos demais personagens: suas motivações, seus medos, suas fragilidades. Suspense em sua forma mais pura. O desconhecido sempre espreita (e assusta), seja em elipses de montagem, que não permitem saber de imediato a origem de uma torrente sangrenta, seja na fotografia sombria, que não mostra mais do que é possível ver a frente, seja pelo desenho de som, que interrompe o leve som do vento com uma trilha sinfônica. Uma boa incursão de Dolan pelo gênero, especialmente quando se pensa que o rapaz não tinha muita intimidade com ele. Alguns set-pieces merecem atenção especial e, por si só, valem o ingresso: a cena do tango, com todas as suas entrelinhas e beleza plástica, além da escrita sagaz (herdada da peça), talvez fique gravada na memória do público por muito tempo. Tom correndo pelo milharal, parecendo um espantalho (o cabelo...) é outro momento marcante. Por fim, uma sequência em que um bezerro morto é carregado, inerte - reproduzindo uma imagem semelhante no começo do filme - resume tudo o que o longa quer dizer em uma imagem.

Para os fãs de Dolan, Tom na Fazenda talvez soe indigesto. E é mesmo: não é o tipo de filme que te deixa sair da sala sem largar pra trás um pouco do sossego. Para os fãs de cinema, porém, talvez haja uma razão a mais para ficar de olho no que Dolan anda fazendo. Desassossegadamente.

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é jornalista, mestre em Estética, Redes e Tecnocultura e otaku de cinema. Deu um jeito de levar o audiovisual para a Comunicação Interna, sua ocupação principal, e se diverte enquanto apresenta a linguagem das telonas para o mundo corporativo. Adora tudo quanto é tipo de filme, mas nem todo tipo de diretor.
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