Crítica
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Crítica
"Sempre achei que era especial."
Documentários sobre personalidades podem ser divididos entre aqueles que possuem a bênção do homenageado, ou de sua família, e os que narram sua trajetória à margem de tal aprovação. Geralmente os mais interessantes pertencem a este segundo grupo, justamente pela liberdade em abordar a personalidade sem temer críticas ou questões sensíveis, mesmo que por vezes precisem se ater a material de arquivo ou divulgado através da mídia em geral. Em Muito Ralph, há uma vasta coletânea de depoimentos e uma profusão de falas do próprio Ralph Lauren, narrando detalhes de sua trajetória. Tudo para mostrar o quanto ele foi, é e será incrível.
Por mais que a trajetória de Lauren mereça imenso respeito pelo tanto que foi construído, seja como estilista ou como empresário, incomoda (bastante) ver um filme sem o menor pudor da bajulação ao ponto do próprio homenageado se auto-exaltar, como indica a frase que inicia este texto, e o filme como um todo ser construído de forma a corroborar com o que é dito. Isso sem falar que os tais pontos sensíveis aparecem apenas de relance, sem maior aprofundamento, como na quase falência ainda no início da carreira ou na demissão do CEO menos de um ano após ser contratado, já na fase consagrada. Não é este o real interesse deste documentário, se menciona tais situações é muito mais para evitar acusações de omissão do que pela vontade em caminhar neste sentido. Aqui, o foco é em mostrar o quanto Lauren foi revolucionário, elegante e se tornou uma bandeira norte-americana, vendendo os ideais de um país mundo afora.
Pelo lado histórico, Muito Ralph até tem seus méritos, por esmiuçar do sucesso das gravatas mais largas até a aposta na moda masculina, algo pouco trabalhado pelos estilistas nos anos 60. Seja como história da moda ou mesmo pelas transformações da sociedade no decorrer das décadas, é interessante constatar como Lauren foi visionário ao apostar de forma tão incisiva no marketing, conjugando elegância às suas roupas. O sonho de qualquer marca é atrair para si no imaginário coletivo conceitos positivos intangíveis e pode-se notar tal meta já nos anos 1980, a partir da forma como os anúncios da Ralph Lauren eram construídos, sempre de forma a incitar o desejo. Não se trata de estilo, mas de conceito publicitário - por mais que o documentário foque muito mais na elegância do que propriamente nos interesses por trás de tal construção. De novo, faz parte do foco adotado.
Já em relação ao cinema, é bastante interessante a associação que Lauren fez em relação às roupas que produzia com as que via nos filmes que gostava. Ao assistir O Aviador (2004), logo encomendou uma coleção baseada no filme estrelado por Leonardo DiCaprio. Tal predileção tem a ver com o próprio estilo de roupa que apreciava, claro, mas também reflete em parte a relação do espectador com o cinema em si. Qual fã de cultura pop hoje não possui algum apetrecho de seu filme favorito em casa, independente do que seja? Lauren anteviu tal desejo nos filmes mais clássicos, trazendo para sua moda tal predileção de forma que as pessoas queiram se vestir que nem seus ídolos nas telonas. Nada muito diferente dos dias atuais, guardadas as devidas proporções em relação ao estilo sonhado.
Mais até que a história de Ralph Lauren como estilista, são nestes insights do empreendedor aonde está o maior atrativo deste documentário. O que ainda assim é pouco, pois o objetivo do filme está longe de ser este; se tais situações são apresentadas, trata-se apenas para ressaltar o quão incrível é Ralph Lauren. Para alguém que tem tanto a mostrar pelo que fez, nem fica bem tamanha autoglorificação.
"Ralph sabe o que conquistou, mas ainda está faminto."
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