Crítica
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Sinopse
Mulher-Maravilha 1984 se passa no início dos anos 1980, quando um excêntrico vilão descobre um artefato que realiza desejos, mas que cobra seus preços para isso. Barbara Minerva, por exemplo, querendo ser uma Mulher-Maravilha, se torna a Mulher Leopardo. Já Diana (Gal Gadot) terá de encarar a inesperada perda parcial de seus poderes.
Crítica
Artefatos mágicos podem ser uma desculpa e tanto para roteiristas enfiarem conveniências goela abaixo do espectador. Num filme de super-herói ou em qualquer exemplar do gênero fantástico, artigos com possibilidades extraordinárias não são incomuns, tampouco reprováveis, claro, desde que devidamente integrados à lógica interna. Mas, em Mulher-Maravilha 1984, a descoberta arqueológica tratada inicialmente enquanto barata falsificação se apresenta como gritante engrenagem narrativa facilitadora/simplificadora do que gravita ao redor dela. À Diana (Gal Gadot), representa o meio pelo qual a super-heroína tem momentaneamente o amor de volta – trucagem bem da sem-vergonha para ter Chris Pine novamente como um anteparo masculino. À Barbara (Kristen Wiig), o modo de sobressair, de deixar para trás sua invisibilidade. Já à Maxwell (Pedro Pascal), torna palpáveis os planos megalomaníacos. Esse vilão caricato, do tipo excêntrico, corporifica uma espécie de lâmpada de Aladdin que concede desejos, mas cobra preços enormes.
Inicialmente, não há problema no fato dessas tramas se desenrolarem em torno de um mesmo elemento encantado. Todavia, os roteiristas Patty Jenkins, Geoff Johns e Dave Callaham se apoiam excessivamente nas faculdades mágicas, inexplicavelmente negligenciando os decorrentes dilemas morais requentados de outras produções com teor basicamente parecido. No fim das contas, Mulher-Maravilha 1984 fala de dois excluídos transformados em ameaças perigosíssimas, nem ao menos consistindo em determiná-los como subproduto de um mundo não acolhedor às suas particularidades. Aliás, essa mesma turba que lega Barbara e Maxwell à marginalidade da atenção e do carinho é a que, num arroubo gritante de idealismo inocente, deixa de lado as possibilidades de ganho pessoal para instaurar o bem comum. Contradição bem explorada? Que nada, nem ao menos mencionada como mudança drástica de concepção. As pequenas fissuras no enredo vão minando a importância dos discursos, tanto os coletivos quanto os estritamente individuais. Se Diana hesita em abdicar de seu pedido por conta de um dilema moral perfeitamente cabível, porque haveria de soar orgânica a renúncia irrestrita de meros mortais que, sequer, têm suas personalidades contempladas pelo longa?
Mas, Mulher-Maravilha 1984 não sucumbe apenas por conta dessas fragilidades. Alçada ao panteão de representante-mor da feminilidade nos filmes baseados em quadrinhos, a protagonista novamente vivida por Gal Gadot é reduzida a impasses mal apresentados e à dependência emocional (e até física) do “ressuscitado”. Em vários instantes, ela não capitula diante das ameaças por conta do suporte imprescindível de Steve Trevor, presença incômoda desde o princípio por conta da gratuidade de um retorno absolutamente desnecessário e forçado. Também assim o parece o prólogo na terra das amazonas. Se em Mulher-Maravilha (2017), a abertura em Themyscira era provavelmente o que aquele bom filme tinha de melhor, aqui ela não passa de uma demonstração um tanto gratuita de pirotecnia, já que a lição aprendida pela pequena Diana não é assim tão útil como reforço do que ela está vivendo no presente. Ademais, Kristen Wiig parece frequentemente deslocada na personagem arquetípica que reafirma a nociva rivalidade feminina embalada na inveja.
Como o próprio título denuncia, o filme se passa em 1984. Para endossar esse enamoramento de Hollywood pela década de 1980, Patty Jenkins acredita que basta uma sequência de vislumbres sintomáticos – pessoas trajadas como na época citada, jovens no fliperama, aglomerações em shoppings centers – para criar uma ambientação condizente. Rapidamente, Mulher-Maravilha 1984 larga essa estética singular de lado, quando muito deixando escapar numa transição qualquer a utilização de pochetes. As cenas de ação passam longe de ser apoteóticas, especialmente por conta da maneira como a realizadora privilegia acrobacias próximas ao puro exibicionismo em detrimento de uma lógica de façanhas físicas incomuns. Some a isso tudo, no quesito debilidades, a exagerada capacidade de aprendizado dos personagens – Diana logo sabe como fazer invisível um jato e Steve não demora mais que 10 segundos para se familiarizar com uma tecnologia aeroviária 60 anos à frente do seu tempo – e temos um filme que carece de vibração, além de desperdiçar os insumos dramáticos.
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