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Crítica


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Sinopse

Morto aos 39 anos de idade, Claude François foi um ídolo da música francesa. Um artista em constante tensão por conta do medo de perder a fama, ele foi um amante possessivo, um patrão tirânico e um filho inseguro.

Crítica

Nascido no Egito quando este ainda era uma colônia francesa, Claude François viveu menos de 40 anos, tempo suficiente para se tornar um dos nomes mais importantes da música pop em todos os países francófonos. Seu reconhecimento se deve principalmente ao sucesso de sua canção mais famosa, Comme d’habitude. No entanto, esta composição foi sua glória e também sua condenação. Afinal ela seria posteriormente adaptada para o inglês por Paul Anka e imortalizada na voz de ninguém menos do que Frank Sinatra, sob o título de My Way. À François coube o mérito da autoria, mas quem a tornou global foi Sinatra, que ao mesmo tempo em que explorava os efeitos da melodia junto ao público enterrou as chances do artista francês de ir além de suas próprias fronteiras. Mas, felizmente, este é apenas um dos aspectos abordados no contagiante My Way – O Mito Além da Música, longa que resgata a trajetória de Claude François mais de 30 anos após sua morte.

Desenvolvido dentro de um modelo clássico e sem maiores originalidades em sua estrutura narrativa, My Way – O Mito Além da Música se apoia, basicamente, em dois fatores: a própria história de Claude François, por si só bastante interessante, e no desempenho quase que sobrenatural de Jérémie Renier, que não só se parece por demais com o biografado como também incorpora trejeitos, feições, posturas e falas de um legítimo popstar. Quando o filme combina cenas reais com outras encenadas pelo ator é quase impossível discernir qual é qual. Renier – que é quase homônimo do astro americano Jeremy Renner – tem construído uma carreira de destaque, desde a parceria constante com seus conterrâneos Jean-Pierre e Luc Dardenne (que o dirigiram em vários títulos, tendo sido o mais recente o elogiado O Garoto da Bicicleta, 2011), como também no cinema francês, ao lado de nomes de respeito como Juliette Binoche (Horas de Verão, 2008) ou Catherine Deneuve (Potiche: Esposa Troféu, 2010), e mesmo em produções hollywoodianas, como em Na Mira do Chefe (2008), em que apareceu ao lado de Colin Farrell. Mas dessa vez ele se coloca totalmente como protagonista, num desempenho excepcional, justamente por entender, sem julgar, a personalidade que incorpora, defendendo-a até o último – e patético, e injusto – instante.

Quando criança, Cloclo – como era chamado pelos pais – era tratado como príncipe. Vivia aos cuidados da mãe e dos empregados, enquanto o pai era um importante funcionário do governo francês. Quando o Egito declara independência, a família precisa se mudar, e o passado de glórias e abundância fica para trás. Vão morar em Mônaco, onde o pai acaba vindo a falecer, indignado com a escolha do filho em seguir a carreira artística ao invés de ir trabalhar como escriturário em um banco. Claude casa jovem, precisa sustentar a mãe e bate várias vezes com a cara na porta de gravadoras importantes. Mas cantar em cassinos não era suficiente, e justamente por isso não desiste. Será essa persistência que o levará até o sucesso, mesmo que no caminho tenha perdido a esposa, a confiança na mãe – viciada em jogos de azar – e mesmo o discernimento em relação à fama. Sua preocupação era tão grande que, quando nasce o segundo filho – de um novo casamento – ele insiste que uma das crianças fique sempre escondida, apenas para que as fãs não o considerem um “homem de família”, ao invés da imagem de ídolo sexual que tanto lhe agrada.

My Way: O Mito Além da Música é bastante amplo e generoso com seu personagem. Do nascimento à morte prematura e estúpida, Claude François – assim como outros ídolos da música francesa, como Edith Piaf e Serge Gainsbourg – ganha aqui sua cinebiografia definitiva. Frenético, dinâmico, colorido, audacioso, honesto e corajoso, é um filme que não tem vergonha da admiração que sente por seu protagonista, mas ao mesmo tempo não empurra para baixo do tapete seus defeitos, falhas e manias mais estranhas. Uma passagem curiosa e bem representativa é a que mostra o encontro de François com Sinatra, quando Comme d’habitude e My Way já eram incríveis sucessos, cada uma num dos lados do Atlântico: os dois se cruzam na recepção de um mesmo hotel, mas o francês não tem coragem de se apresentar como o autor da música de maior sucesso interpretada pelo outro. Naquele momento o ídolo virou fã, o astro se tornou tiete, e o homem desapareceu para dar espaço à criança mais uma vez. Assim ele foi na vida: imaturo, irresistível, inconsequente, impetuoso, admirável. E aqui acompanhamos uma obra que faz jus a todo esse talento.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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