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Sinopse

O popular e polêmico bispo Edir Macedo está envolvido em diversos tipos de escândalos. Os mais conhecidos mostram reportagens bombásticas produzidas nos últimos 25 anos, que até hoje circulam na internet.

Crítica

Dizer que Nada a Perder 2 transborda maniqueísmo é o mínimo. A segunda parte da cinebiografia de Edir Macedo, para começo de prosa, aposta na falta de discernimento do espectador com relação à diferença entre panfleto ruim e obra sustentada por uma história de superação. O viés propagandístico é gritante, beirando o perigoso, vide as demonizações tão torpes quanto as santificações que lhe são antagônicas. A trama começa de onde Nada a Perder (2018) parou, com Macedo (Petrônio Gontijo) narrando sua trajetória repleta de intempéries ao biógrafo limitado a levantar questões esquematicamente a fim de permitir a imersão em certos tópicos cômodos. O diretor Alexandre Avancini faz uma ostensiva e grosseira peça de convencimento, talvez de imediata assimilação pelos fieis da Igreja Universal do Reino de Deus, mas pouco consistente se distanciada dos dogmas associados ao homem. Não se trata de questionar a fé, mas a mitificação caricatural do bispo.

Nada a Perder 2 se esforça incansavelmente para mostrar Edir Macedo como a vítima do conluio que envolveria o poder judiciário, a igreja católica, setores políticos comprometidos e a Rede Globo, chamada por outro nome no longa. É insistente e catequético esse movimento de atrelar as sucessivas demonstrações de resiliência do protagonista às maquinações dessas esferas para prejudica-lo e, assim, atentar contra um mensageiro da palavra de Deus. A representação dessa dicotomia é tão vulgar que permite cenas como a da fiel da Universal perseguida por uma horda que a agride impiedosamente. A forma como o cineasta cria essa passagem, valorizando com câmeras lentas o desespero da indefesa, confrontando-o com a sanha brutal de pessoas que simbolizam não crentes e afins, sem atentar à complexidade da situação, demonstra a inclinação sentenciosa de um conjunto que desperdiça constantemente o vistoso valor de produção que tem à disposição.

Essa estratégia de demonização dos outros e de santificação dos ungidos pela Igreja Universal passa também pela constrangedora delineação do pastor que adiante divulga imagens de bastidores, subsídios mais que suficientes às acusações de charlatanismo direcionadas a Edir Macedo. Nada a Perder 2 , como um neon insistente e chamativo, “pisca” de cinco em cinco minutos a injustiça recaindo sobre seu protagonista, crescentemente associado ao calvário de Jesus Cristo, numa demonstração de megalomania que certamente não combina com o discurso de humildade verbalizado pelo administrador de um império. Outro ponto embaraçoso é a observação do Monsenhor José Maria (Eduardo Galvão), emblema do catolicismo malvado que enxerga a Universal como uma concorrente a ser descartada do mercado. Esse personagem é visto sempre na penumbra, com ares furtivos, semelhante a um vampiro disposto a fazer caras e bocas quando à frente.

Mal disfarçado de acerto de contas com uma "verdade" conveniente, Nada a Perder 2 é um anúncio comercial com estrutura de filme. Os esforços cinematográficos – frequentemente combalidos pela proximidade de Avancini com uma linguagem aberta e meramente televisiva – ficam restritos à opulência da produção que conta com viagens internacionais e cenas grandiosas, como a da África do Sul, numa das maiores catedrais da Universal. Porém, o bloco mais indecoroso do todo é o de Macedo indo com uma comitiva ao Monte Sinai, no Egito. No topo, ele literalmente queima os inúmeros processos que recaem sobre seus ombros e, como num passe de mágica, subsequentemente seus detratores são "desmascarados". É uma justaposição tão pueril que beira o ridículo, inclusive levando em consideração a natureza propagandística. Até mesmo para vender um produto ou, como no caso, uma ideia, é preciso mais que atores conhecidos, dinheiro abundante e um diretor com tarimba audiovisual. A fim de comercializar o “peixe”, seria preciso não pressupor que o seu público é cego ou fanático o bastante e, assim, se empenhar criativamente, não apenas reforçar esquemas perniciosos.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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