Crítica
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Sinopse
Uma jovem solitária, de 18 anos, não encontra suporte familiar e nem amigos com quem possa desabafar sobre os problemas de sua vida. Cansada, começa a conversar com o próprio reflexo no espelho apenas para externar sua angústia, mas rapidamente descobre que está trocando de lugar com uma espécie de clone que tenta convencê-la a tomar atitudes vingativas.
Crítica
Na abertura de Não Olhe, a soma das imagens disformes de uma ultrassonografia com a música grave cria um efeito terrífico/premonitório, que auxilia à pronta compreensão, adiante, acerca da interação da protagonista com seu reflexo maligno no espelho. Aliás, não fosse esse dado fantástico, o longa-metragem poderia bem ser enquadrado apenas na categoria suspense. Isso, inclusive, porque escapa ao convencionalismo dos sustos e ao fundamento no extraordinário. Mesmo recorrendo a diversos lugares-comuns, a produção escrita e dirigida por Assaf Bernstein é bem mais alimentada pela leitura do estado psicológico dos personagens, dos comportamentos controversos com efeitos nefastos, do que necessariamente por um impensado retorno de espírito vingativo ou o que o valha. Na trama, Maria (India Eisley) é uma jovem tímida, com severas dificuldades de socialização, vítima frequente de chacotas escolares e do clima opressor que reina veladamente em sua casa de garota abastada. Gradativamente nos é permitido entender que o grande problema se encontra em Dan (Jason Isaacs), seu pai, um cirurgião plástico cuja obsessão pela perfeição engatilha o horror.
Chamada Airam (Maria ao contrário, por motivos não menos que óbvios), a projeção da ensimesmada adolescente atesta possuir vida e identidade próprias, embora umbilicalmente associada à vivente. O realizador ressalta a leitura psicológica ao mostrar o fantasma, além de resultado de uma ação odiosa do passado, como personificação das repressões de Maria. Tudo o que ela suprime internamente para conseguir interações minimamente saudáveis – a relação com a única amiga, a convivência com o pai severo e a mãe omissa (vivida por Mira Sorvino) – alimenta o duplo, motivando-o tão logo a proposta de inversão convença a desesperada menina sem alternativas à vista no horizonte. Portanto, quando elas trocam de lugar, a passividade permanece aprisionada, observando de perto as atrocidades do seu negativo com oscilantes graus de aquiescência. Os impulsos recalcados vêm à tona violentamente emulando a inversão dos espelhamentos.
Não Olhe possui narrativa claudicante, ora calcada em componentes previsíveis, ora intentando se soltar das amarras e manifestar personalidade. Um dos elementos que Assaf Bernstein trabalha com resultados variáveis é a tensão erótica, a contenção e a consecutiva libertação intensa da energia libidinal que também demarca as diferenças vitais entre Maria e Airam. Como amparo, o bom desempenho de Jason Isaacs fornece à protagonista a figura de ameaça, amplificada pelo fato de estar no cerne tanto do evento que gerou a tragédia de outrora quanto no cotidiano de reprimendas e afins. Dan constantemente corrige a filha sobre detalhes que perturbam uma suposta ideia de perfeição, sendo, assim, personagem imprescindível às atitudes selvagens “das filhas”. O mesmo não se pode dizer ao fraco trabalho de Mira Sorvino, demasiadamente limitada ao papel de esposa submissa e sem voz, relegada praticamente a um penduricalho de cena, no mais das vezes.
Um dos pontos positivos de Não Olhe é, apesar da brutalidade literal de Airam, a vilania não ficar circunscrita ao espírito da menina sem direitos de viver por ter nascido fisicamente deformada. O grande empecilho à Maria é justamente o pai, Dan, que de maneiras distintas acaba atormentando a mãe, controlando-a fármaco e emocionalmente. O cineasta lança mão de algumas sutilezas, como a provável relação extraconjugal paterna, captada num instante banal na sala de espera. Contudo, o condutor não apresenta tal habilidade mais à frente, quando Airam arquiteta o plano mirabolante para expor as mentiras que sustentam um casamento de aparências. Inclusive, o filme trata o espelho como âmbito do superficial, ou seja, da representação das imagens, pura e simplesmente, mas também lhe confere ares de porta de entrada ao recôndito humano. India Eisley dá conta de construir as gêmeas díspares, demonstrando ocasionalmente até certa coragem como atriz. Pena que Assaf Bernstein não aprofunde os promissores pontos de partida de sua abordagem.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Marcelo Müller | 5 |
Roberto Cunha | 6 |
MÉDIA | 5.5 |
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