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Crítica


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Sinopse

Ramon e Lalau formam uma dupla e tanto. Pai e filho são trambiqueiros que fazem várias estripulias para ganhar a vida. No final das contas, eles sempre acham que as coisas darão certo. Um dia, Ramon recebe uma proposta milionária para se passar por um guru motivacional. Algo dá errado e o pai precisará do filho para se safar.

Crítica

É engraçado como algumas tradições perdem seus sentidos com o passar do tempo. A comédia nacional, por exemplo, foi completamente reinventada nos últimos anos. E pelo que vemos em Não se preocupe, nada vai dar certo!, Hugo Carvana não aprendeu a lição. Este é um filme que talvez funcionasse muito bem caso tivesse sido feito dez, ou ainda vinte anos atrás. Hoje, no entanto, parece algo perdido no tempo. Lembra um pouco o recente Onde está a felicidade?, de Carlos Alberto Riccelli, que também queria fazer graça com situações e personagens, ao invés de abusar de um humor mais ousado, escancarado e sem sutilezas, tão em voga em produções como Cilada.com e seus similares. Não que um seja melhor do que o outro: é apenas um reflexo dos dias em que estão inseridos.

Na verdade, uma boa comédia é um produto em falta no cinema brasileiro. São poucos os filmes feitos por aqui que sabem fazer rir despreocupadamente, com inteligência e perspicácia. E este aqui certamente não é um deles. Carvana, quando despontou como diretor com o hoje clássico Vai trabalhar, Vagabundo, em 1973, conquistou de imediato público e crítica. Desde então vem buscando repetir o impacto – chegou até a realizar uma continuação, duas décadas depois, desse maior sucesso, obviamente sem o mesmo efeito. E qual a razão? A falta de uma atualização de linguagem. Foi assim em todos os seus últimos trabalhos: o irregular O Homem Nu (1998), o subestimado Apolônio Brasil: Campeão da Alegria (2003) e o insuportável Casa da Mãe Joana (2008). E pelo que se percebe agora, a sina continua.

Tarcísio Meira ficou quase vinte anos afastado dos cinemas – seu último trabalho havia sido Boca, em 1994, uma co-produção com os Estados Unidos que adaptava o clássico ‘Boca de Ouro’, de Nelson Rodrigues, e era co-dirigido por Walter Avancini e Zalman King e co-estrelado por Martin Sheen! Se o resultado anterior já havia sido bem problemático, aqui ele não se sai muito melhor. E se toda essa espera era em busca de um material melhor que justificasse seu retorno, essa escolha é quase inexplicável. Ao menos ele aparece ao lado de Gregório Duvivier, um dos mais talentosos jovens do momento, como visto no sensível e tocante Apenas o Fim. Os dois formam uma boa dupla, com química e entrosamento, e isso salva Não se preocupe, nada vai dar certo! do desastre total.

Meira e Duvivier são pai e filho, dois artistas mambembe que ganham a vida pelas estradas do país. Isso até surgir uma grande oportunidade para o rapaz, que abandona a figura paterna sem hesitar, desfazendo a dupla. A proposta é simples: se passar por um guru indiano perante a alta sociedade carioca por duas semanas e embolsar uma pequena fortuna em troca. É claro que o velho malandro não ficará fora do golpe por muito tempo, e antes do esperado os dois estão reunidos novamente. O problema é que essa história de tons farsescos logo se transforma em um suspense policial, com o mais novo sendo acusado de cometer um assassinato, e o experiente picareta buscando um último disfarce para salvar o rebento e ainda desvendar a verdade. E o pior: essa alteração de ritmo se dá de supetão, sem a menor habilidade na condução da trama. Somos tão surpreendidos quanto os protagonistas, e isso não é um bom sinal.

Não se preocupe, nada vai dar certo! é o tipo de filme que faria muito sucesso em cinemas mais populares, com ingressos reduzidos e acesso facilitado à grande massa. Nos dias de hoje, no entanto, ele corre o risco de não encontrar seu público por simples falta de informação, se tornando outra vítima do péssimo sistema de distribuição que impera no Brasil. É um longa que mesmo estando muito bem embalado – com boas cores, visuais impressionantes do litoral nordestino, atores de destaque e tipos de personagens facilmente reconhecíveis – não cumpre sua função principal, que é se comunicar com quem vai aos nossos cinemas atualmente. E sem ter com quem falar, só resta o silêncio.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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