Crítica
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Sinopse
Quando um vírus não identificado surge, diversos casais são confinados num motel. Cercados por polícia, imprensa e um monte de curiosos, homens e mulheres vão viver confusões crescentes.
Crítica
Edu gosta de Suellen, mas ela está em dúvida se essa paixão é passageira ou não. A juíza Letícia tem um caso secreto com seu segurança, Acauã. Caju e Bebel estão prontos para dar um importante passo na relação dos dois, mas o que nenhum deles imagina é que o outro também é virgem. Já Margot está tão preocupada em chegar aos 30 anos e seguir sem sua “primeira vez” que nem se importa muito em ser sequestrada por um bandido bonitão. O que nenhum destes tipos imagina, no entanto, é que iriam parar num mesmo motel na noite em que o local seria interditado pela polícia sob ordens do governo do estado. E se esse mote inusitado deveria servir como trampolim para o riso correr solto na comédia Ninguém Entra Ninguém Sai, a única surpresa é perceber que termina por ocorrer exatamente o contrário: o absurdo não será apenas a situação, mas todo o desenrolar de ações inconsistentes e enfadonhas que a partir dela serão desencadeadas, sem piedade alguma com a paciência do espectador.
Ainda que tenha nascido em Taiwan, Hsu Chien mora no Brasil desde pequeno. E sua ligação com o cinema não é de agora. Seu primeiro trabalho como diretor assistente foi em O Viajante (1998), de Paulo César Saraceni, e desde então tem alternado envolvimento em produções cultuadas, como Nome Próprio (2007) e O Vendedor de Passados (2015), ambas premiadas em festivais nacionais, e sucessos como De Pernas Pro Ar (2010) e Minha Mãe é uma Peça (2013), entre tantas outras recordistas de bilheteria. Enquanto realizador, deixou uma marca bastante autoral em curtas como Flerte (2014), vencedor do Grande Prêmio do Cinema Brasileiro, e Vazio (2015), exibido no Festival de Cinema Brasileiro de Los Angeles. Com tanta experiência, é de estranhar que seu primeiro passo solo em longas-metragens seja esse Ninguém Entra Ninguém Sai, uma obra tão sem personalidade que o único questionamento capaz de provocar é se conseguirá motivar um público suficiente a ponto de justificar seu investimento. Ao alternar nomes restritos ao universo da internet com veteranos já desgastados por tanta exposição, obtém-se como resultado um discurso disforme, que não deve agradar nem mesmo aos fãs mais acirrados deste gênero que tem sido tão maltratado pela produção nacional.
A fórmula, pelo que se percebe, foi apostar na quantidade na esperança que, de um modo ou de outro, acabe refletindo na qualidade. Do grupo Porta dos Fundos temos Letícia Lima, Gabriel Totoro e Rafael Infante, da tevê aberta vem Danielle Winits, Guta Stresser e André Mattos, da publicidade chega João Côrtes e das emissoras de sinal fechado surge Emiliano d’Ávila, enquanto que Sergio Mallandro e Sidney Magal só podem ter saído do fundo do baú. A explicação para manterem todos presos num mesmo lugar é a possível contaminação de um vírus desconhecido. Trancafiados, eles pouco têm a dizer um pelo outro. Afinal, ninguém está ali para socializar, certo? Há alguns dramas individuais – a moça que busca uma proposta de casamento, o casal viciado em fetiches, os jovens querendo virar adultos e a atração proibida pelo bandido – mas nada é explorado com profundidade. Eles não são mais do que clichês, assim como também é a única destoante deste cenário: a faxineira evangélica que ali trabalha por obrigação e os vê como depravados pecadores. Ou assim somos levados a acreditar, apenas para que no final uma reviravolta previsível e totalmente inconsistente se apresente, já num ponto em que ninguém – em nenhum dos lados da tela – parece se importar, de fato, com o que está acontecendo.
Este, portanto, parece ser o maior problema de Ninguém Entra Ninguém Sai: a dificuldade em se definir. Brinca-se de ousada (pelo ambiente escolhido como cenário), porém é na verdade “recatada e do lar”(o sexo praticamente inexiste, e nudez é elemento em extinção). Anunciada como uma “comédia para toda a família”, volta e meia também se arrisca em abordar questões sociais (sistema público de saúde, a irresponsabilidade de políticos), porém apenas citando-as, como numa declaração de “veja, não somos alienados”, mas que apenas reforça a sensação de não estar disposto a levar nenhuma discussão mais a sério. Nem os perfis dos personagens – os suburbanos, os endinheirados, os aventureiros – indicam mais do que arquétipos. Um bom exemplo é quando os trancafiados se reúnem para discutir o que lhes está acontecendo e surgem ainda outros pares, como os gays e o senhor com uma ninfeta. Qual a função deles além de atenderem uma suposta representatividade das minorias? Nesse meio tempo, passamos pelo constrangimento de presenciar um artista do nível de Antonio Pedro em cena sem nem ao menos uma única fala para defender.
Inspirado – porém com bastante distância – no conto No Motel, de Luis Fernando Veríssimo, Ninguém Entra Ninguém Sai tenta provocar humor como se fosse um programa de esquetes, como se as conexões entre cada uma das tramas envolvidas fossem mais ocasionais do que necessárias para a fluidez da história. E ao atirar literalmente para todos os lados, somos apresentados a mais momentos de puro embaraço, que vão do melodrama barato ao catequismo religioso. E assim, sem ritmo na narrativa e dotado de uma ingenuidade que chega a ser infantil, Chien perde uma oportunidade atrás da outra, tudo em nome de concessões que, na tentativa de agradar a todos, termina por não deixar ninguém plenamente satisfeito. E se o final dá a impressão de ter sido improvisado, sem apresentar muita sintonia com as demais passagens vistas até então, melhor entendê-lo como apenas mais um passo em algo destinado a vencer pelo cansaço, restando como única torcida um esquecimento rápido e indolor.
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