Crítica
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Sinopse
Milton tem uma vida tranquila numa cidade interiorana dos Estados Unidos. Mas, essa paz toda é ameaçada quando um extraterrestre faz um pouso forçado no quintal de sua casa.
Crítica
Uma das coisas mais interessantes de Nosso Amigo Extraordinário é o fato deste ser um filme, digamos, bastante comum, por assim dizer. Trata-se de uma história absolutamente simples, dotada de personagens corriqueiros, mas que, uma vez diante de algo inesperado, seguem tratando de suas lições diárias com a mais absoluta normalidade. Tamanho desprendimento frente ao novo e imprevisto termina por ditar a ordem pela qual as coisas irão se guiar nos desenvolvimentos seguintes, muitas vezes apontando para desfechos previsíveis, e em outro casos, preparando terreno para a imaginação, por mais que essa fosse almejada. Dessa forma, a trama acaba por se situar em um limite de não muito fácil discernimento, permitindo tanto uma leitura direta e objetiva, como se os fatos apresentados de fato tivesse tomado os espaços ditados, mas também possibilitando uma navegação mais investigativa, circundando permissividades oníricas e fantasiosas. Essa habilidade em pisar em ambos os lados de uma fronteira por muitas vezes tão definida, mas aqui permeável ao ir a ao vir, oferece ao conjunto um ganho insuspeito, reforçando seus aspectos mais ilusórios, ainda que trate de questões por demais terrenas.
Há um bom tempo sir Ben Kingsley não tinha pela frente um protagonista tão desprovido de extravagâncias, se é possível tal definição. Ator de forte presença cênica, volta e meia encarregado de tipos folclóricos no Universo Cinematográfico Marvel ou figuras históricas (Gandhi, Georges Méliès, Salvador Dali), aqui ele é Milton, um senhor aposentado que leva uma rotina banal, entre programas de televisão e reuniões comunitárias na pequena cidade onde vive no interior dos Estados Unidos. Ou seja, não representa alguém em especial, mas um personagem recorrente no cenário urbano, alguém que pode ter sido importante – ou mesmo ativo – no passado, mas que aos poucos foi se apagando a ponto de se tornar quase irrelevante na ordem das coisas. Ele constrói este homem através de silêncios e olhares significativos, que por relances permitem um maior entendimento a seu respeito. Quando a filha surge com uma lata de feijão encontrada no armário do banheiro, não se sabe ao certo se aquilo foi apenas um descuido, um lapso que vem se repetindo ou uma provocação intencional, em busca de atenção. Dúvidas essas que o tornam rico e motivam a curiosidade.
Portanto, no meio de tanto nada a ser preenchido, quando o improvável acontece, o mais difícil, evidentemente, será aceitar a veracidade dos fatos. Em uma noite igual a tantas outras, uma espaçonave alienígena pousa desajeitadamente no quintal de Milton, estragando sua plantação de flores. Ele vê aquilo mais com irritação do que estranheza, e por mais que tente levar o caso adiante – comentando sobre o ocorrido no supermercado ou mesmo com os vereadores – ninguém parece disposto a levá-lo a sério. Resignado a sua condição de invisibilidade, não irá protestar ou se enfurecer diante de mais uma demonstração de descaso, algo com o qual já está acostumado. A linhas marcantes do seu rosto apontam para uma determinação que tem garantido sua sobrevivência de modo independente até aquele momento, e assim irá continuar, com ou sem Jules – o nome que dará ao alienígena solitário que dele se aproximará em busca de segurança e... maçãs! – por perto. O não entendimento de um pelo outro permitirá uma aproximação mais efetiva: afinal, quando não se sabe ao certo o que dizer, qualquer tentativa será válida. E assim, se falará mais de si do que do outro.
Mas Milton não estará sozinho nessa jornada pessoal. A despeito da presença de Jules, sempre quieto e de olhos atentos voltados em sua direção, duas outras vizinhas também acabarão por ele sendo afetadas. Primeiro será Sandy (Harriet Harris, indicada ao Emmy por Hacks, 2022), a amiga paciente, mas logo em seguida virá Joyce (Jane Curtin, indicada ao Globo de Ouro por Kate & Allie, 1985), a enxerida que não quer ser deixada para trás. Cada um deles, a seu modo, tem o que oferecer, assim como muito pelo qual se arrepender – e consertar, numa busca por uma segunda chance. Entre questões familiares (o filho do qual há muito não se tem notícias, a filha que desde que se assumiu lésbica nunca mais se reconectou com a mãe) e profissionais (o sonho de fazer sucesso na cidade grande), a presença de Jules será o catalizador necessário para que estes que até então se encontravam em um grande limbo arregimentem as forças necessárias para não apenas expor seus medos e aflições, mas também para partirem para a ação. É menos pelo que se vê, portanto, e mais pelos sentimentos despertados e a atitude a se tomar frente a essa nova consciência.
Marc Turtletaub pode ser um diretor bissexto (seu longa anterior, o delicado O Quebra-Cabeça, 2018, merece ser descoberto), mas é também um produtor de sucesso, tendo sido indicado ao Oscar por Pequena Miss Sunshine (2007) e ganho o Spirit Awards por A Despedida (2020), dois projetos distintos, mas suficientes para indicar sua sensibilidade no contar de uma história. O modo como se apropria menos dos eventos descritos em cena, e mais das reações e do modo como cada um dos seus personagens se permitirá ser afetado pelo que está no centro das atenções faz de Nosso Amigo Extraordinário não uma atração imperdível, mas uma aposta discreta e recompensadora. Os elementos de ficção científica poderão espantar os desavisados, mas serão aqueles que decidirem permanecer que alcançarão um retorno não óbvio, muito menos transformador, mas confortável o suficiente para acalentar até o mais desconfiado na audiência. Um feito de alcance por vezes subestimado, mas que aqui se confirma de imenso valor.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Robledo Milani | 6 |
Alysson Oliveira | 5 |
Leonardo Ribeiro | 6 |
MÉDIA | 5.7 |
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