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Crítica


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Sinopse

Fugindo de um trauma na cidade pequena onde moravam, Manolo e Candela se mudam para um imóvel em Madri, com seus três filhos e o avô Fermín. No entanto, existe uma ameaça no imóvel em frente, ligada a segredos do passado.

Crítica

Para os críticos de cinema que buscam nos filmes alguma experiência capaz de destacá-los dos demais, tornando-os únicos ou ousados dentro de seu gênero, este terror proporciona um desafio de análise considerável. Isso porque o projeto chama a atenção pelas semelhanças com outras histórias, ao invés das particularidades. Todos os lugares-comuns das casas abandonadas, filmes de assombrações e exorcismos estão compilados, cena após cena: a luz que se apaga misteriosamente na hora da tensão, o vulto ameaçador passando pelo corredor, a porta rangendo e se abrindo sozinha, a cadeira de balanço balançando-se sozinha, as feiticeiras que fornecem cartas de tarô e magias, as vozes do além perturbando os protagonistas, os sustos em modo jump scare (com efeitos sonoros altíssimos). Não existe qualquer preocupação do diretor Albert Pintó, nem dos quatro roteiristas (quantidade inexplicável neste caso) em aprofundar personagens, desenvolver o trauma vivenciado pelos pais no passado, a configuração atípica desta família numerosa, a frieza com que tratam o avô debilitado. Os criadores se esquecem que os sustos funcionam somente quando nos importamos com os personagens.

Se um algoritmo de computador pudesse dirigir um filme de terror, ele seria O 3º Andar: Terror na Rua Malasana (2020). Isso não constitui necessariamente um julgamento depreciativo: algoritmos de redes sociais têm a capacidade de compreender os gostos médios de um grande número de pessoas, fornecendo exatamente o que imagina que gostarão. Não há riscos, apenas uma aposta na recompensa mais segura. O projeto espanhol não traz qualquer cena que não tenha sido vista, com mais esmero ou melhor contextualização, em títulos anteriores. Trata-se de uma condução estranhamente despersonalizada, automática, como se o cineasta jamais tivesse discutido com sua equipe como filmar cada cena. Basta se lembrar do imaginário coletivo: como filmamos monstros? À distância, escondidos na sombra, com o corpo cadavérico curvado e os cabelos cobrindo o rosto, claro. Como se compõe uma cena de possessão? Com a mocinha indefesa voando pelos ares, jogando os membros da família na parede pelos poderes da telecinesia, proferindo palavras assustadoras. Como filmar um apartamento assustador? Com longos corredores escuros, quartos escuros, retratos antigos de pessoas perturbadoras na parede. Não se trata apenas da trama semelhante às demais, mas também o modo de dirigi-la.

Devido à insistência nos sustos ao invés da construção do clima, a narrativa não percebe suas incoerências. Pintó ignora a comicidade evidente de cenas da voz robótica do demônio infantil no corpo de um homem idoso, ou a bolinha de gude levando à porta do apartamento perigoso. A assombração carrega a inconsistência típica dos terrores que se esforçam demais em agradar. O adversário do além se materializa numa senhora idosa de fisicalidade agressiva, e depois numa voz maligna capaz de possuir corpos. Em um momento, é invisível e se desloca entre cômodos, mas depois deixa marcas pelo caminho e fica presa atrás de portas trancadas. Um diálogo sugere que a entidade teria se apossado dos personagens, tornando inútil a fuga a outro lugar, para em seguida afirmar que ela estaria intimamente ligada ao apartamento maldito. Sugere-se tudo e seu contrário: esta monstruosidade tímida revela-se apenas para os seres mais frágeis no começo (a criança, o homem idoso), provocando então um segundo grupo em grau de fraqueza (jovem gago, jovem grávida) e então os adultos robustos. Podendo atacá-los, matá-los, prefere dar sustos e desaparecer em seguida. O que deseja, afinal, a força representada pela Anciã? O pretexto fornecido no clímax está longe de explicar o comportamento da vilã.

Os atores se esforçam, parecendo se divertir dentro do registro brincalhão das expressões exageradas de pavor. É uma pena que o diretor evite o humor patético inerente ao medo do invisível, tratando todas as sequências com a mesma e incompreensível solenidade. O trabalho do elenco é prejudicado pela maquiagem fraca (rostos brancos com olhos avermelhados) e pela variação ínfima da trajetória de cada personagem. O 3º Andar: Terror na Rua Malasana lembra um passeio pelo trem-fantasma, onde se pula de um susto ao outro, de maneira desconectada e esquecível ao final. Este cinema busca estímulos imediatos, porém baseando-se em linguagem tão desgastada que provoca tédio ao invés do medo. A luz excessivamente azulada para simular a noite, ou amarelada demais invadindo um quarto de hotel beira a paródia do terror. Existe um limite não muito tênue entre a autoimportância do horror e o escárnio com as regras do gênero. Pintó poderia ao menos investir no recurso metalinguístico, reconhecendo sua direção enquanto releitura, homenagem ou jogo despretensioso.

No entanto, o resultado sequer poderia se inserir no filão mais ousado do trash. Apesar dos exageros, existe por trás dessa iniciativa um aparato de produção típico dos filmes de grandes proporções – algo que reforça o abismo entre o profissionalismo da estrutura e o amadorismo do roteiro. Rumo ao final, o texto investe em sugestões ainda mais questionáveis do que um cinema envelhecido – no caso, a exploração da transexualidade enquanto monstruosidade, o espetáculo exótico das deficiências físicas, o confronto novelesco acerca de infidelidades em família, despejadas sem qualquer sutileza na trama. O resultado final acena a um conceito desconjuntado, com provável discordância entre roteiristas, produtores e diretor quanto às decisões criativas. Há tantas formas de terror e artimanhas de roteiro acumuladas na premissa que despertam a impressão de um texto com inúmeros tratamentos e cortes conflitantes de montagem. Ao final, é difícil destacar um único momento interessante, algum recurso de câmera, luz ou narrativa que o torne singular. Pior do que arriscar e errar nos alvos é não se arriscar em nada e não se tornar memorável em aspecto algum.

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Crítico de cinema desde 2004, membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema). Mestre em teoria de cinema pela Universidade Sorbonne Nouvelle - Paris III. Passagem por veículos como AdoroCinema, Le Monde Diplomatique Brasil e Rua - Revista Universitária do Audiovisual. Professor de cursos sobre o audiovisual e autor de artigos sobre o cinema. Editor do Papo de Cinema.
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