Crítica
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Crítica
O homem solitário, de aparência abrutalhada, mas gestos polidos e gosto refinado. O casal escandaloso, com a mulher perua e o homem que não economiza nos modos e na postura. Apenas duas mesas estão ocupadas próximo a hora de fechar. O olho do dono está atento para tudo que acontece a sua frente, preocupado em bem atender e gerar uma impressão positiva naqueles poucos, porém preciosos, clientes. E como todo mundo sabe, não há melhor propaganda do que aquela feita pelo boca a boca. Mas este não é o único público da farsa que está prestes a se desenrolar. Há ainda a cozinha, comandada pelo cozinheiro – ou seria chef? – de cabelos compridos, unhas muito bem feitas e pavio curto, e os garçons, que transitam de um lado a outro. Falta alguém, no entanto. E são os dois assaltantes que irrompem no último instante, exigindo suas partes daquele quinhão. O que não sabem, no entanto, é que com isso irão liberar O Animal Cordial, filme de estreia da diretora e roteirista Gabriela Amaral Almeida.
Produção de gênero que, felizmente, não tem embaraço em se assumir como tal, O Animal Cordial se estrutura quase que como uma peça de teatro. Os ambientes são limitados, os personagens contam-se nos dedos. A interação de uns com os outros, portanto, é que irá ditar o ritmo dos acontecimentos. E se tudo apontava para um final de expediente modorrento, com exigências incômodas, porém já esperadas, e nenhuma surpresa para encerrar o dia, o quadro enfrenta uma brusca reviravolta sem aviso prévio. Dois garotos invadem aquele espaço até então desprovido de emoções, com armas em punho, para ditarem suas próprias regras. Querem dinheiro, o que não lhes pertence, o poder ilusório que imaginam estar ao alcance deles. Mas aquele lugar tem dono. E este não está disposto a abrir mão da sua condição num simples piscar de olhos – ou disparar de balas.
É importante conhecer os peões desse tabuleiro. Ernani Moraes é o solitário misterioso que carrega uma, ou mais, carta na manga, enquanto que Jiddu Pinheiro e Camila Morgado levantam não mais do que estereótipos, o novo rico arrogante e a deslumbrada, dupla que pensa que pode tudo, mas pouca noção tem do que se passa ao seu redor. Os três parecem serem fáceis de ler, mas custam a derrubar suas máscaras. Intenções mais simples são as dos garotos interpretados por Humberto Carrão, em um registro oposto ao visto no premiado Aquarius (2016), e Ariclenes Barroso, uma das revelações recentes do cinema nacional. Eles são vulcões em erupção, que assim como surgem, com barulho e estrondo, alterando as estruturas, logo se apagam. Suas presenças são fundamentais, e cumprem o que deles se exige. As atenções, no entanto, se concentram nos três tipos restantes, e não sem motivo – ou justificativa. O dono (Murilo Benício), a garçonete (Luciana Paes) e o cozinheiro (Irandhir Santos) são mais do que meros arquétipos. São as peças que fazem as engrenagens entrarem em ação.
O que cada um anseia, de fato? Ela quer ir para casa, o outro busca reconhecimento, e o dono espera que seus investimentos lhe ofereçam, em certo momento, algum tipo de recompensa. E se o agora se faz urgente, não haverá mais como esperar. É chegado o instante de cada um mostrar sua verdadeira face. A faca, afinal, ainda mais em um lugar como aquele, está ao alcance de todos – não se fazem necessárias armas de fogo para que a violência ocupe o posto que lhe é devido. O debate, portanto, passa a ser sobre quem está no real controle daquela situação que a cada novo minuto se aproxima mais do caos irreversível e digno de consequências que até então sequer haviam sido consideradas. Cada um é responsável por uma parte desse bolo, e o estrago feito a partir do primeiro corte será tão profundo quanto o banho de sangue que os aguarda no descuido seguinte.
Gabriela Amaral Almeida sabe bem o que fazer com as peças que junta, e se o resultado do quadro que desenha não é para todos os estômagos, ao menos não desaponta aqueles dispostos a tal mergulho. Assim como estão ao seu lado os protagonistas. Há muito tempo Murilo Benício não aparecia tão imerso em um personagem, e se Irandhir Santos demonstra mais uma vez uma impressionante capacidade de desaparecer sob o tipo de constrói, talvez seja Luciana Paes a maior surpresa, entregando uma figura tão subserviente quanto inesperada, da qual tudo o que se sabe pode ser contradito em seguida. A noite guarda sustos, terrores e conquistas, e o monstro de cada um urge para se fazer presente. O Animal Cordial é tanto uma fábula sobre nossa sociedade e a vontade imperativa de um engolir o outro como um conto de horror alegórico a respeito de elementos descartáveis que encontram utilidade apenas como alimento do mais forte. A escolha por qual destes caminhos seguir, portanto, diz mais a respeito de quem os encara do que daqueles que proferem este discurso.
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A principio parece uma trama imprevisivel , mas vai se tornando rapidamente previsivel e, em alguns momentos, beira o absurdo (os ladrões parecem não ter vindo roubar, mas fazer sexo). Erro grave de continuidade nos ferimentos no rosto do protagonista. Flerta com melodrama, terror, suspense e erótico ruim e termina por não entregar muita coisa. O que salva mesmo é o Irandhir, vale sempre ve-lo atuando. E só.
O cinema brasileiro, bom ou ruim, incorre num erro básico: SOM PÉSSIMO. Neste filme qd os atores sussurram é um desastre. São décadas assim . .