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Sinopse

Darren Barrenman é um homem que passa seus dias cuidando da piscina do conjunto residencial Tahitian Tiki, em Los Angeles, EUA. Quando descobre uma conspiração para roubar a água da cidade, Darren fará o impossível para salvar sua preciosa Los Angeles.

Crítica

Há filmes que se tornam referência, seja em relação ao gênero no qual se inserem, por sua trama ou ambientação, ou mesmo pela relevância sociocultural que exibiram ao longo dos anos, pelo impacto causado na sociedade e permanência enquanto porto seguro em uma estrutura de consumo cada vez mais apta ao descarte e à volatilidade. Voltar a esses títulos vez que outra é saudável, mas é também preciso cuidado para não se perceber preso a eles, pois de nada adianta apenas revisitá-los por uma questão de saudosismo ou nostalgia: é preciso agregar algo de novo ao conjunto, propondo uma apropriação ao mesmo tempo original e válida pela repetição, sem esgotar o apelo inicial. O Cara da Piscina é uma comédia que chama atenção, primeiro, por ser a estreia do astro Chris Pine. Mas, uma vez passada essa curiosidade, o que permanece é a reverência ao clássico Chinatown (1974), de Roman Polanski. A proximidade é tamanha que, por vezes, o que deveria soar como homenagem chega a se confundir com plágio – ou deboche. E é difícil definir qual dos dois caminhos seria pior.

Como não bastava ter escrito, dirigido e produzido, Pine é também o protagonista – e personagem-título – de O Cara da Piscina. Sua própria existência é um aceno do realizador novato a um mergulho na fantasia e na ilusão proporcionada apenas por aqueles que se permitem sonhar. Afinal, eis aqui uma história ambientada em uma Los Angeles seca, não muito distante das estrelas de Hollywood, mas ainda assim sofrendo as consequências de se sentir a areia queimando por debaixo das solas dos sapatos. Talvez por isso Darren Barrenman (Pine, livre da necessidade de ser galã, compondo um tipo que alega ser mais sui generis do que, de fato, se revela ao longo dos acontecimentos) valorize tanto o seu trabalho em manter limpa e apta ao banho a pequena piscina que controla num condomínio de apartamentos à beira da estrada. Chama atenção ser essa sua responsabilidade – é limpador de uma única instalação, sem atender clientes externos e nem se ocupar com outros tipos de obrigações. Como se sustenta, portanto? Eis a chave da fantasia.

Darren sonha em ser cineasta e famoso – como quase todo mundo que mora na Califórnia. Eternamente prestes a terminar um documentário sobre as difíceis condições de sua cidade – seja transporte urbano, descaso com funcionários de carreira ou demais demandas consideradas pequenas para os grandes jornais, mas capazes de alterar a vida de uma (ou mais) pessoas. Lembra o tipo defendido por Ben Kingsley no recente Nosso Amigo Extraordinário (2023). Só que ao invés de se deparar com um extraterrestre no seu jardim, o que encontra é uma possível conspiração envolvendo um vereador que passa suas noites secretamente se apresentando como drag queen, um agente imobiliário que busca enriquecer vendendo condomínios hipervalorizados e um empresário decidido a atender os desejos de sua amante, nem que para isso tenha que se livrar da esposa de tantos anos. Por trás de tanta informação – como se essas já não fossem suficientes – há a questão aquífera. Darren, como é sabido, valoriza o uso da água. Mas para onde essa vai quando se está no meio de um deserto (físico e figurado)?

A corrupção política envolvendo um bem comum não é o único elemento a aproximar O Cara da Piscina de Chinatown. Se ficasse por aí, porém, os paralelos seriam compreensíveis e até mesmo agradáveis. Mas Pine não se dá por satisfeito. Ao lado de Ian Gotler – amigo de longa data e, assim como esse, também estreante nessa função – ele trata de poluir o roteiro com figuras cada vez mais exóticas, como se o interesse por elas despertado a cada aparição fosse suficiente para emprestar ao conjunto um apreço que nunca chega a se concretizar. Darren já é por demais distanciado da realidade. Qual a necessidade, portanto, de colocá-lo ao lado de um ex-diretor de televisão que há muito abandonou seu ofício (Danny DeVito), uma terapeuta mergulhada em suas próprias análises (Annette Bening), uma namorada deprimida pela morte de um ex-amante (Jennifer Jason Leigh), um auxiliar que se revela mais importante do que qualquer um poderia ter suspeitado (John Ortiz), uma femme fatale que não esconde ter uma agenda secreta por não conseguir sustentar suas mentiras (DeWanda Wise, de Jurassic World: Domínio, 2022) e até mesmo uma dupla que parece ser uma versão genérica da série Miami Vice (1984-1989)?

Por mais que o argumento por vezes se mostre interessado em uma visão circular desse grupo de figuras singulares, quase como numa apropriação daquilo que Robert Altman fez do seu expertise décadas atrás, há dificuldade em Pine se distanciar daquilo que ele próprio criou para exercer uma visão um pouco mais crítica a partir dessa grande brincadeira. Em resumo, eis o que resta: uma diversão entre amigos, que certamente devem ter aproveitado com entusiasmo o antes e o durante, mas pouco podem responder pelo depois. Ou seja, dar vida a esses tipos e vê-los ganhar vida em frente às câmeras deve ter sido, no mínimo, um processo rodeado por entusiasmo e descobertas. Mas, uma vez deixados estes momentos para trás, o resultado soa tão pálido quanto a aridez de uma cidade consumida por sua própria ganância – ou cegueira. O Cara da Piscina encontra força no seu elenco e nas dinâmicas propostas, mas falha miseravelmente neste esforço em ligá-los a uma ideia que os valide. Assim, há de se identificar um todo excitante do qual o público tem apenas vislumbres, mas que nunca chega a ser convidado a nele se aprofundar.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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