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Sinopse

Chris é um contador excepcional. A vida lhe treinou para que números fossem a sua língua materna, mas também lhe garantiu tiques e manias que o colocaram à margem da vida social. Trabalhando como freelancer para diversas organizações criminosas, além do seu emprego num pequeno escritório do governo, ele finalmente consegue um cliente legítimo quando o Departamento do Tesouro começa a fechar o cerco em volta dos chefões pra quem faz a lavagem de dinheiro.

Crítica

Chris é diagnosticado na infância como portador de autismo. Suas dificuldades são, principalmente, de interação social e de não conformismo quando se torna impossível finalizar qualquer tarefa. O pai militar desdenha da opinião do especialista que indica um tratamento para permitir sua gradativa adequabilidade social. Essa introdução nos prepara para a singularidade da vida adulta do protagonista de O Contador, na qual é interpretado por Ben Affleck. Extremamente talentoso com números, ele não restringe sua atuação profissional à pequena empresa de contabilidade, na verdade fazendo dela uma fachada aos trabalhos de lavagem dinheiro para os principais bandidos do mundo. Marybeth (Cynthia Addai-Robinson), agente do tesouro estadunidense, logo entra na jogada para investigar casos que, se descobre mais adiante, têm em Chris seu ponto de convergência.

O protagonista de O Contador é uma figura bastante curiosa e interessante, não apenas em virtude das decorrências do autismo, mas também pelas formas por ele criadas para lidar consigo mesmo, méritos da composição de Affleck, que, contudo, não acompanha o desenvolvimento do enredo, oferecendo poucas nuances assim que a personalidade é sedimentada. Contratado para cuidar da contabilidade de uma grande empresa de tecnologia, que ironicamente vende armamentos para o governo dos Estados Unidos e próteses às vítimas de conflitos mediados na base da violência, claro, por armas, ele descobre um rombo milionário com a ajuda da entusiasmada Dana (Anna Kendrick), funcionária local, impressionada com suas aptidões intelectuais. Até aí tudo bem, temos um drama que flerta discretamente com o thriller, sobrando, ainda, o peculiar apreço de Chris por armas de fogo de grosso calibre. Tudo começa a decair justamente ao entendermos essa “paixão”.

Outro flashback puramente explicativo remonta, primeiro, a uma ruptura familiar, e, segundo, à educação marcial que o pai deu a Chris e ao filho caçula. Daí para adiante, fica fácil entender a habilidade excepcional do contador para combates físicos e a frieza ao matar quem permanece em seu caminho. O diretor Gavin O’Connor explora essa invencibilidade como principal atributo do protagonista, deixando, respectivamente, em segundo e terceiro planos a complexidade emocional oriunda de sua formação e as ligações com perigosos grupos internacionais. Assim, a letalidade do personagem de Ben Affleck suplanta qualquer outro atributo, inclusive os efeitos de um possível envolvimento amoroso. A exploração recorrente do arsenal bélico que ele mantém para proteger-se das ameaças reforça a predileção pelo deslumbre frente à improbabilidade, afinal Chris é um cidadão, a priori, acima de suspeitas.

A participação dos agentes é pífia, no mais das vezes somente um respiro aos constantes ataques sofridos, e revidados com, no mínimo, o dobro de força por Chris. Nem o drama da mulher que esconde o passado de delinquência ao candidatar-se para um cargo importante, tampouco as aborrecidas reflexões do chefe prestes a se aposentar, vivido por J.K. Simmons, fazem sombra, em representatividade, à capacidade matemática de Chris para matar seus inimigos. Perseguido por Brax (Jon Bernthal), assassino de aluguel aparentemente tão fatal quanto ele, o protagonista de O Contador pega em armas e vai empilhando corpos, soterrando as demais reverberações de seus atos, legando rapidamente as subtramas e os coadjuvantes ao limbo, em suma, tornando o longa-metragem desinteressante. O movimento final, calcado no elemento surpresa, até consegue dar um fôlego adicional à história, mas não muito. O saldo é um filme genérico, que desperdiça mais que aproveita, que erra mais que acerta.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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