Crítica
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Crítica
Estar diante de um filme como O Curioso Caso de Benjamin Button é capaz de deixar muita gente admirada pelas inúmeras qualidades reunidas. Afinal, é uma obra que beira à perfeição e envolve o espectador de tal maneira que é quase impossível não se entregar imediatamente. Desde as primeiras cenas, quando é apresentado o emocionante conto do relojoeiro que, após perder o filho na guerra, resolve construir um relógio que marque no sentido contrário, o sentimento crescente de paixão, dor, arrependimentos, felicidade, sabedoria, descobertas e, principalmente, Vida - assim mesmo, com letra maiúscula e imponente - irá tomar conta de qualquer um na audiência. Não se trata de uma trajetória ao acaso. O que está em cena é a construção de um destino, igual aos outros, porém único e singular como só pode ser o de cada indivíduo. Mesmo que este esteja de trás para frente!
Baseado num conto de F. Scott Fitzgerald, autor de textos que deram origens a filmes como O Grande Gatsby (1974) e O Último Magnata (1976), O Curioso Caso de Benjamin Button não só é superior a estes como se coloca num nível acima da grande maioria dos filmes feitos atualmente. Tem-se aqui algo atemporal e contemporâneo, que dialoga de igual com verdadeiros clássicos ao mesmo tempo em que se mostra em sintonia com o que de mais moderno há hoje em dia. É uma produção que só poderia ser feita com a técnica disponível neste momento, porém que em nenhum instante se deixa submergir pelo aparato tecnológico de efeitos e maquiagens. Figurino, trilha sonora, direção de arte e cenários, tudo está presente para colaborar num único sentido – contar a melhor história possível, da forma mais abrangente e precisa. E este feito é alcançado sem a menor ressalva.
Benjamin Button é um bebê que nasceu com sérios problemas. A mãe faleceu logo após dar a luz, e o pai, ao vê-lo pela primeira vez, fica tão assustado que decide abandoná-lo na porta de desconhecidos. Mas lá mora uma alma caridosa, uma mulher que, mesmo não podendo ter filhos, sempre acreditou que realizaria este sonho. Ela percebe que aquela não é uma criança normal, e por isso chama um médico, que após analisá-lo, dá o seguinte diagnóstico: “certamente é um recém nascido, porém com todas as doenças de um velho de 80 anos – não deve sobreviver por muito tempo”. Mas, indo contra todas as expectativas, Ben decide viver. E a cada novo dia está melhor, mais vívido, mais jovem. E assim se dá a história do rapaz que nasceu velho e vai, pouco a pouco, rejuvenescendo.
Mas Ben Button não passou por esta vida sem despertar interesse. E entre aventuras em alto mar e romances adúlteros, nada foi mais verdadeiro do que o amor que existia entre ele e Daisy. Amiga de infância, o viu como uma criança velha, quando adolescente não teve paciência para aturá-lo na sua maturidade, e no momento mais trágico procurou afastá-lo por completo, por vergonha e incompreensão. Mas foi no meio do caminho, quando os dois finalmente atingiram a mesma idade física e mental, que puderam se entregar por inteiro um ao outro, consumando um desejo que era grande demais para existir somente entre os dois. Assim, uma terceira alma foi gerada. E o que era natural terminou por separá-los. Nada mais óbvio, nem mais dolorido.
David Fincher atinge um dos pontos altos de sua carreira com O Curioso Caso de Benjamin Button. E olhe bem, isso não é pouco a se dizer de um cineasta que possui no currículo um longa como o polêmico e imprescindível Clube da Luta (1999). Mas se antes havia revolta e angústia, aqui tais sentimentos são substituídos por uma emoção maior, uma visão de mundo serena e poderosa que aquece e ensina. Dessa vez há muito a ser dito. E mais ainda a ser sentido. Outros que merecem aplausos são os protagonistas, Brad Pitt e Cate Blanchett. Eles, que já haviam contracenado juntos em Babel (2006), confirmam uma química singular nas telas. Este é um dos mais envolventes desempenhos de Pitt, frágil e sábio ao mesmo tempo em que apaixonado e inseguro. Está tudo no olhar, e por mais transformadoras que sejam as máscaras – virtuais ou não – utilizadas, não permite que seja ignorado. Já Blanchett está diferente daquela vista no recente Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal (2008), porém da mesma forma entregue e com a competência que lhe é habitual. Ainda mais na segunda metade da trama, quando se revela sem amarras, deixando à mostra o turbilhão de emoções que somente alguém que vivenciou uma história tão única poderia sentir.
O Curioso Caso de Benjamin Button pode ser acusado de ser muito longo - afinal, são quase três horas - mas tudo é uma questão de sensibilidade versus esta fria e matemática razão. Outros irão comentar que há tantos efeitos visuais que acabam distraindo do foco principal – por outro lado, é possível perceber que estes só colaboram na melhor compreensão de uma mensagem universal. Além de qualquer reconhecimento externo, tudo neste filme é bastante preciso, na medida certa para ser sentido e experimentado. Por isso, deve ser visto com olhos bem abertos e com o coração desarmado. As lições e os exemplos parecem distantes ou de outro mundo, mas falam fundo e por inteiro. A identificação é direta. E tal jornada não poderia ser mais satisfatória.
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Ha muito tempo um filme não me surpreedia tão positivamente. Uma obra de arte!