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Crítica


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Sinopse

Nina desencadeia uma viagem pelo próprio inconsciente enquanto está internada numa clínica psiquiátrica.

Crítica

Nina tem algo pelo qual se encantar. Esse estranhamento, que tanto lhe fascina como também lhe inquieta, vem de longe, desde a infância, época essa resgatada através de momentos preciosos que sobreviveram na memória também pela companhia do pai, o homem que a ensinou a não olhar apenas para os lados, ou para baixo, mas para cima antes de qualquer coisa. Ao mirar os céus, a garota começou a deixar a inocência para trás, perdendo-se em um mundo de possibilidades e conjecturas, de ilusões e de afastamentos. O Espaço Infinito, longa de estreia de Léo Bello, tem nessa mulher sua protagonista, mas não se basta no por ela experimentado para conter suas intenções. A busca é mais ampla, e tem o intuito de comprometer, assim como acontece com sua personagem, a audiência, provocando-a a imaginar aquilo que está além do óbvio, do alcance dos olhos e da rotina diária. É uma proposta ousada, certamente. E se a atinge ou não parece ser o grande debate dessa obra imperfeita, mas longe de convencional.

Vivida por Gabrielle Lopes (Como nossos pais, 2017), Nina é alguém que, em algum momento de sua jornada, se perdeu, e segue até agora tentando se encontrar. De tanto se focar nas estrelas, esqueceu de manter os pés no chão e, com eles, criar raízes. Não está lá e nem cá, e entre lembranças esmaecidas e o concreto que se manifesta no dia a dia, uma nuvem se impõe impedindo os avanços e raciocínios esperados. O marido e o filho tentam se conectar, mas será ao lado de outros como ela, que em algum instante se colocaram à margem de tudo e todos, é que, enfim, encontrará seus iguais. Diante de tal espelho, uma escolha se fará necessária: um mergulho de adeus, para não mais voltar, ou arregimentar as forças exigidas para dar a volta e, com isso, retornar não aos seus, mas a si mesma. Pois esse é o passo que permitirá, enfim, um esperado recomeço.

Há quem questione as razões que levaram um realizador masculino e investigar com tanto afinco uma história tão feminina. Em um momento como hoje, quando as vozes das mulheres demonstram, talvez mais do que nunca, o desejo de se fazerem ouvir, Bello parece ter estado atento a esse alerta. Porém, por outro lado, ao assumir não só a direção, mas também a elaboração do roteiro, imagina-se até onde possa ter ido esse exercício de escuta. Com tantos homens ao redor – em casa, no passado, no trabalho – Nina teria outro destino senão o sufocamento? É compreensível o esgotamento ao qual se vê sujeita, mas seria apenas isso, uma consequência de uma situação não almejada, ou reflexo de algo maior, uma falta de oportunidades não apenas de ouvir, mas também de se manifestar?

Em sua realização, O Espaço Infinito abusa do apelo estético ao propor imagens que vão além do real, buscando um desenho que represente não apenas o visto, mas também o sentido e o imaginado. Nesse processo, há um inegável embate entre forma e conteúdo, principalmente pela trama abordar um assunto tão delicado quanto a saúde mental. Teria esse suposto embelezamento sacrificado uma compreensão de algo duro e até mesmo brutal, ou teria, numa corrente completamente oposta, ganho força pelo retorno recebido enquanto válvula de escape, um atalho de respiro e encorajamento quando mais nada parece fazer sentido?

Eis, portanto, uma dedicação que nem sempre resulta em cena à altura de tal comprometimento. O Espaço Infinito tem muito a propor, e a provocação que traz consigo não pode ser ignorada. Partindo de uma construção delicada por parte de sua atriz principal, comprometida sem ressalvas em se fazer presente como um figura tão trágica quanto sedutora, esse fascínio que abraça é também seu ponto frágil, pois em mais de uma passagem o apreço visual eclipsa muito do discurso que deveria ter tido força para se colocar acima de qualquer tipo de distração. Independente disso, há no conjunto material suficiente para uma reflexão não apenas urgente, mas fundamental. Um equilíbrio delicado, nem sempre alcançado, mas que se faz norte e, portanto, válido.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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