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Sinopse

Em O Exorcismo, Anthony Miller é um ator com um passado sombrio, marcado pelo abuso de drogas. Durante as filmagens do seu novo filme de terror, ele começa a exibir um comportamento perturbador, levantando suspeitas sobre seu estado mental. Ao investigar o que pode estar acontecendo, sua filha se vê no limite entre a realidade e o sobrenatural e percebe que os problemas que assombram seu pai podem ser mais aterrorizantes do que parecem.

Crítica

Às vezes, pode acontecer de algo ser tão ruim a ponto de dar a volta, ou seja, inverter a percepção de quem o desfruta a ponto deste relativizar sua avaliação, encarando o problema por meio de uma outra chave, do deboche, da sátira, até mesmo humor involuntário. O Exorcismo, longa escrito e dirigido por Joshua John Miller, poderia ter sido um destes exemplos. É, no entanto, mais um passo rumo ao abismo no qual se encontra a carreira de Russell Crowe, vencedor do Oscar e que se consagrou como um fenômeno de popularidade na virada do século, mas que há alguns anos não tem feito nada digno de nota. O curioso é a relação quase obrigatória, ainda que gratuita, com outro dos seus percalços recentes, O Exorcista do Papa (2023), lançado há menos de doze meses. Seria um sequência do outro? Até poderia ser, numa lógica um tanto invertida, mas não chega a ser o caso. O que é uma pena. Mas se há algo em comum entre uma investida e outra, é a capacidade do protagonista em rir de si mesmo. E por isso uma conferida, por mais despreocupada que seja, acaba encontrando certa valia.

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Se no longa anterior Crowe aparecia como um padre rebelde que não se importava muito com as regras – tal qual o ator, que parece estar se afastando cada vez mais dos grandes estúdios, sem se preocupar com suas declarações ou aparência física – dessa vez o tipo que defende é ainda mais próximo de sua versão real. Anthony Miller, afinal, é um intérprete que já experimentou dias de eu sucesso em Hollywood, mas que por uma série de decisões equivocadas – que na história recaem sobre a doença da esposa e no trauma que a perda dela provocou nele – encontra-se hoje em um limbo, desesperado por uma nova chance de alcançar o estrelato. E essa se manifesta através do convite para estrelar um filme de terror com pretensões artísticas – ou seja, não quer apenas entreter de forma despreocupada, mas causar repercussões no gênero. A comparação imediata, enfim, é o clássico O Exorcista (1973), que faturou milhões, foi indicado ao Oscar de Melhor Filme e ainda levou duas estatuetas douradas para casa. Miller, portanto, não é um padre, muito menos um exorcista. Ele é não mais do que um artista, um homem comum, destinado a viver na ficção dentro da trama um religioso capaz de enfrentar demônios.

Porém, de acordo com o prólogo, esta não é uma produção das mais tranquilas. Miller não era a primeira opção para o papel, e só é chamado quando o ator anteriormente convocado morre em um estranho acidente. Alinhado a essa gigantesca responsabilidade – o futuro da produção está, agora, em sua capacidade de levar adiante o que dele se espera – soma-se outra, de caráter mais particular: Lee (Ryan Simpkins, da saga Rua do Medo), sua filha, acabou de receber uma suspensão na faculdade onde estuda, e até poder retornar aos estudos é com ele que terá que ficar. Atuando como sua assistente, a garota terá acesso aos bastidores das filmagens e aos demais membros da equipe, como a atriz Blake Holloway (Chloe Bailey, da série Enxame, 2023), com quem acaba se envolvendo. Ah, e há também um padre (David Hyde Pierce), que serve como consultor do roteiro, e um diretor um tanto inseguro e intransigente (Adam Goldberg). Cada um deles não mais do que um tipo, servindo apenas para criar dificuldades à jornada do protagonista.

Sim, pois logo ficará evidente que algo não está certo por ali. O que exatamente, quais as razões por trás dos acontecimentos bizarros que passam a se suceder e o que teria despertado tais manifestações parece escapar ao realizador, mais interessado no ato, e menos em suas causas ou repercussões. O Exorcismo é o primeiro esforço de Joshua Miller de maior repercussão, após ter trabalhado como roteirista no filme Terror nos Bastidores (2015) e na série A Rainha do Sul (2016-2021). A falta de experiência em sua condução fica evidente em cada decisão dos personagens, muitas retardadas por uma precaução falha ou até mesmo inexplicáveis, de tão gratuitas ou aleatórias. O pobre Anthony passa a agir de maneira assustadora, mas aqueles ao seu redor, como a filha ou o diretor, creditam tal comportamento a uma recaída no vício ou a uma insegurança artística, quando a verdade é que nem um, muito menos outro, poderia atingir tamanha intensidade e lhe afetar desse jeito. Somente quando passa a se contorcer de modo impossível em frente à equipe é que o tamanho do caos fica evidente, ainda que risível.

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Russell Crowe é a única razão para se prestar o mínimo de atenção a O Exorcismo, e ele está nitidamente se divertindo com todo o circo montado ao seu redor. É de se lamentar, porém, que essa graça não se expanda a ponto de alcançar a audiência, cujos sustos são provocados mais pelo espanto diante da incredulidade do que se vê do que por qualquer artimanha ou estrutura forçada pela narrativa. E quando se nota que o tal processo do título só ocupará a ordem dos eventos já quase próximo ao desfecho da ação, tal consciência serve apenas para confirmar o quão gratuito esse conjunto se revela, seja no âmbito ficcional, numa demonstração de ineficiência criativa pela inabilidade em se elaborar uma história com início, meio e fim, como também no aspecto pessoal de um astro que já foi visto como galã, aplaudido por seu inegável talento, mas reduzido – ao menos nessa passagem de sua filmografia – a um arremedo de tudo que já foi e poderia seguir sendo. Uma piada de mau gosto, tanto lá quanto cá, é tudo o que resta ao final.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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