Crítica
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Sinopse
Nos anos 1960, quatro jovens de Brasília decidiram construir um carro para competir na segunda maior corrida do país, os 500 km de Brasília. Pilotando contra outros 33 veículos, a maioria de grandes marcas internacionais, eles largaram em último lugar mas conseguiram terminar a corrida na segunda posição.
Crítica
As jornadas de superação nas quais os chamados azarões conseguem alcançar feitos inesperados – situação que os norte-americanos costumam denominar com a expressão “A Cinderella Story” (Um Conto de Cinderela) – são recorrentes dentro do meio esportivo. Devido ao seu potencial narrativo e caráter invariavelmente inspirador, tal tipo de história, não raramente, atrai a atenção de cineastas, como é o caso de Denílson Félix, responsável pelo documentário O Fantástico Patinho Feio. Remontando ao passado automobilístico brasileiro, Félix apresenta a história de quatro jovens que, mesmo sem a experiência ou os devidos recursos, foram capazes de construir um veículo próprio para, em 1967, competir nos 500 km de Brasília, na época a segunda maior corrida do país, superando equipes profissionais e terminando a prova na segunda colocação, mesmo tendo largado em último lugar.
Para narrar a façanha – notória entre fãs do esporte, mas pouco conhecida fora desse círculo – dos fundadores da Camber, oficina por onde mais tarde passariam nomes como Nelson Piquet, Félix adota uma estrutura narrativa de ordem cronológica, que se inicia situando o espectador no contexto histórico brasileiro do início dos anos 60, durante o governo JK, com a construção da nova capital federal, seu projeto de expansão – os famosos “50 anos em 5” – e o boom da indústria automobilística. Nesse cenário também de efervescência cultural, tanto local – da Jovem Guarda, da Bossa Nova, da Tropicália – quanto de influência externa – do rock britânico, dos filmes e estrelas de Hollywood – encontramos os protagonistas Alex Dias Ribeiro, Helládio Toledo, Zeca Vassalo e João Luis, amigos que compartilhavam da mesma paixão pela velocidade, de um “espírito de James Dean”, como os próprios definem, e que tinham na recém-construída Brasília, de vias largas, asfalto novo e quase nenhum trânsito, o palco ideal para extravasá-la em rachas noturnos realizados com os carros dos pais.
Em sintonia com esse apreço da juventude, as corridas oficiais patrocinadas pelo governo se tornaram os grandes eventos esportivos da cidade, atraindo milhares de fãs, bem como pilotos de todo o país. Esse mergulho no panorama do que pode ser considerada a consolidação da paixão do brasileiro pelo automobilismo, perpetuada através das décadas pelo sucesso nacional na F1 e outras categorias, além da cultura de competições locais, está entre os pontos mais interessantes do documentário. Mesmo que não se aprofunde como poderia, ou que ainda busque forçar uma conexão cósmica entre a jornada dos garotos e o momento de transformação cultural que ocorria no mundo, especialmente com o “Verão do Amor” de 1967, Félix consegue expandir, ao menos inicialmente, o significado da jornada que retrata, para depois focar no aspecto mais íntimo da mesma, dando ênfase quase total aos depoimentos dos protagonistas.
Assim, eles relembram sua aventura juvenil desde a criação da oficina improvisada na garagem da casa da mãe de um deles, utilizando as ferramentas do pai de outro ou ainda os restos do Fusca do pai de Alex, que sofrera um grave acidente com o veículo, como base para a construção do carro de corrida que ficaria conhecido como o “Patinho Feio” do título – não apenas por seu design incomum e esteticamente questionável, mas também para fazer uma analogia com o conto de Hans Christian Andersen. O divertido relato é pontuado pela participação de amigos do grupo, espectadores da corrida e pilotos renomados, como Emerson Fittipaldi, visando dar ainda mais corpo à mística em torno do evento. Essa aura, contudo, não chega a ganhar a densidade que poderia, já que os relatos secundários muitas vezes se mostram repetitivos, acrescentando pouco ao que já fora estabelecido, e também graças à realização bastante esquemática de Félix.
Apoiado nos depoimentos registrados de modo trivial, nas imagens do quarteto pilotando o carro de corrida pelas ruas de Brasília nos dias de hoje, e num acervo de vídeos e fotos considerável sobre as provas, a indústria automobilística e a construção de Brasília – ainda que bem mais reduzido no que tange ao arquivo pessoal dos protagonistas – O Fantástico Patinho Feio é moldado num formato de reportagem televisiva bastante convencional, no qual, sem conseguir explorar outros recursos, Félix busca elevar o caráter edificante da história por meio de uma narração em primeira pessoa, feita pelo próprio, que não apenas vem carregada de lugares-comuns, como também soa deslocada. Todavia, o interesse da história real não se perde por completo, com um sentimento genuíno de euforia nostálgica e de realização podendo ser percebido, por mais que a magnitude da proeza dos quatro garotos talvez não seja plenamente transmitida ao público.
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