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Sinopse

Tentando fugir do regime de um ditador, um barbeiro judeu acaba sendo confundido com o déspota e aproveitando a oportunidade de assumir o poder para mudar as coisas.

Crítica

Charles Chaplin relutou por muito tempo em abraçar o cinema sonoro. Foram 13 anos entre o lançamento de O Cantor de Jazz (1927), primeiro longa sonoro, e a estreia de O Grande Ditador (1940), o debute propriamente dito do cineasta nos “talkies”. Pode parecer uma espera bastante extensa, mas artistas-gênios como Chaplin não podem ser apressados em embarcar numa nova onda. Ele precisava estar preparado para uma mudança tão grande. Esse cuidado por parte do diretor nos deu uma das obras-primas de sua carreira, um longa-metragem engraçado, irônico e, principalmente, crítico ao regime nazista que crescia na Alemanha e nos países ocupados. Estamos acostumados nos dias atuais a assistir a diversos filmes sobre a Segunda Guerra, contrários ao nazismo e ao ditador Adolf Hitler. Mas em 1940, em pleno conflito, isso não era nada comum. O Grande Ditador é um trabalho válido não só pelo roteiro brilhante, mas pela coragem em tocar em temáticas espinhosas à época.

No filme, com produção, direção, trilha sonora e roteiro assinados por Chaplin, o artista interpreta dois personagens: um barbeiro judeu trapalhão e o ditador da Tomainia, Adenoid Hynkel (uma nada velada referência à Alemanha e à figura de Hitler). O trabalhador esteve na Primeira Guerra Mundial e salvou a vida de alguém que seria de grande importância para o regime da Tomainia, o comandante Schultz (Reginald Gardner). Embora tenha saído inteiro do conflito, o barbeiro perdeu a memória e passou um bom tempo fora de casa. Anos depois, retorna para sua lojinha num gueto comandado pela figura que salvou no passado. Lá, ele conhece a bela Hannah (Paulette Goddard), filha de seu vizinho de longa data, e se apaixona pela moça. O romance pode ter vida curta, pois as forças nefastas do exército de Hynkel não deixarão pedra sobre pedra naquele lugar. Enquanto isso, o ditador tenta financiar sua guerra via empréstimo de um banqueiro judeu. Quando não consegue o dinheiro, jura vingança contra toda a população judia. Com delírios de grandeza (como dominar o mundo e transformar em seu playground particular), Hynkel se associa ao ditador Napaloni (Jackie Oakie), da nação Bacteria (qualquer semelhança com Mussolini não é mera coincidência), para tratar de outros territórios a conquistar. Mal sabe Hynkel que um barbeiro muito parecido com sua pessoa pode mudar completamente o cenário que se desenhava.

Embora tenha entrado de vez no cinema falado em O Grande Ditador, Chaplin continua investindo na pantomima e no humor físico para passar sua mensagem. Não só no núcleo do barbeiro, muito próximo em caracterização e estilo do seu bom e velho vagabundo, mas também no universo de Hynkel. O ditador possui mais falas, é verdade, mas o seu modo amalucado de entregar seu discurso (uma sátira certeira da forma de se expressar de Hitler) e o uso de palavras não existentes transformam o som, de forma inteligente, em expressão universal – não tão distante da mímica. Chaplin sabia que muitos de seus fãs poderiam se sentir traídos pela transição sonora, mas conseguiu chegar num grande resultado. Todavia, o que dizer da cena em que Hynkel, sem proferir palavra alguma, mostra seu desejo de poder total ao brincar com um globo terrestre? Chaplin era um gênio imagético, vide essa cena que viraria antológica na história do cinema.

Mas se engana quem pensa que o diretor apostaria apenas na comédia física neste longa. O Grande Ditador tem momentos sérios, dramáticos. E o discurso final, proferido de maneira visceral por Chaplin, é só mais um exemplo de que o artista não fazia nada pela metade. Ainda atual, a fala do desfecho clama por entendimento entre os homens, pede um basta na violência e na intolerância. Impossível não se emocionar. Sobrando críticas ao nazismo, ao fascismo e, em modo mais geral, a todo e qualquer tipo de cerceamento de liberdade, Charles Chaplin conquistou sua maior bilheteria com um filme que fugia dos seus padrões, mas que conversava totalmente com a realidade daquele momento. Indicado a cinco Oscar, incluindo Melhor Filme, O Grande Ditador é um título obrigatório para qualquer cinéfilo que queira ver um mestre em grande forma, que não teme desafios ou temas controversos. Uma verdadeira obra-prima.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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