O Grande Lebowski
Crítica
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Sinopse
Venice, Califórnia. Jeffrey Lebowski é um desempregado convicto, que vive no ócio e chama a si mesmo de "the Dude". Quando não está sozinho no apartamento, ouvindo canções do Creedence ou usando drogas, está jogando boliche junto com os amigos Walter Sobchak, neurótico por armas, e Donny, um grande jogador que ninguém deixa falar. Um dia alguns desconhecidos invadem o apartamento de Lebowski, cobrando o dinheiro devido por Bunny, sua suposta esposa. "Dude" tenta desfazer o mal entendido, mas um deles se vinga urinando no tapete. Logo em seguida "Dude" descobre que eles estavam atrás de outro Lebowski, um milionário. Irritado com o que aconteceu, já que gostava muito do tapete, "Dude" vai até seu homônimo exigir uma compensação. Sem conseguir nada, ele resolve roubar um dos valiosos tapetes da mansão. Tempos depois, Lebowski pede que "Dude" o ajude a entregar a quantia pedida pelo resgate de Bunny. É quando Walter elabora um plano para desmascarar os sequestradores e ainda ficar com o dinheiro.
Crítica
Existe uma grande gama de perdedores nas histórias criadas por Ethan e Joel Coen. Mas talvez o mais querido deles seja um sujeito que não aceita ser chamado de outra forma se não de “Dude”. O “Cara”, em bom português, é do tipo que assina cheque pré-datado para uma quantia de 69 centavos. É daqueles que não se preocupa com nada, a não ser em quando conseguirá fumar seu próximo baseado ou tomar seu próximo drink, o White Russian. O personagem de Jeff Bridges é tão perdedor que nem o filme leva o seu nome. O Grande Lebowski é, na verdade, outro homem, um ricaço que tem sua esposa sequestrada e, para reavê-la, conta com a ajuda de seu homônimo pobretão. Com sequências oníricas engraçadíssimas, personagens excêntricos e trilha sonora pinçada a dedo, o longa-metragem dos irmãos Coen, lançado em 1998, pode não ter sido um grande sucesso à época, mas ganhou um consistente status cult que é completamente justificável por suas qualidades.
O roteiro é assinado pelos Coen, baseado livremente em um romance policial de Raymond Chandler. Dude (Bridges) passa seus dias jogando boliche com seus amigos, o veterano de guerra e judeu convertido Walter Sobchak (John Goodman) e o lento boa praça Donny (Steve Buscemi). Sua vida é empurrada com a barriga sem grandes preocupações. Até o dia em que ele é confundido com outro Lebowski e vê seu adorado tapete da sala (que dava vida ao ambiente) ser estragado por um capanga que cobrava dinheiro. Atordoado pelo acontecido, Dude vai à procura do Grande Lebowski (David Huddleston) lhe cobrar um tapete novo. Nisso, ele conhece o afetado ajudante do seu homônimo, Brandt (Philip Seymour Hoffman) e a esposa do ricaço, Bunny (Tara Reid). E a partir deste encontro, sua vida vira de cabeça pra baixo. Bunny é raptada e Lebowski contrata Dude para ajudá-lo a entregar o dinheiro do resgate. Mas nada é o que parece ser nesta trama que ainda apresenta a filha do personagem título, Maude Lebowski (Julianne Moore), uma artista de espírito livre; um trio de niilistas capitaneado por Karl Hungus (Peter Stormare); um jogador de boliche pederasta e autoconfiante chamado Jesus (John Turturro); e um cowboy existencialista conhecido como The Stranger (Sam Elliott).
Como é possível perceber, nada é estranho o suficiente para a trama de O Grande Lebowski. E aí reside a graça desta história. Como bons suspenses que se prezem, existe o popular mcguffin (algo que os personagens procuram, mas que não tem real importância, apenas existindo para a história andar) e diversas reviravoltas que parecem não fazer sentido algum, mas que são muito bem orquestradas pelos roteiristas. No fim das contas, por mais idas e vindas que tenha a trama, ela nunca é mais interessante que os personagens que a habitam. Este é o verdadeiro mérito do filme assinado por Joel Coen (e Ethan, não creditado): o universo riquíssimo de personagens extravagantes que passeiam pela tela e divertem o espectador com suas idiossincrasias.
Jeff Bridges encarna o papel de sua carreira em O Grande Lebowski. Totalmente relaxado, vivendo – segundo ele – uma versão de si mesmo, Dude é aquele sujeito que o espectador torce para se dar bem, mesmo sabendo que existem chances mínimas de sucesso. Sua lentidão de pensamento só é compensada pela sua característica agregadora, pacífica. Ele é um homem contra conflitos em um momento completamente belicoso. A história se passa em 1991, no início da guerra entre Estados Unidos e Iraque, e o melhor amigo de Dude é um veterano do Vietnã que adora armas e tem sérios problemas com sua raiva. Este personagem é encarnado com precisão por John Goodman, um dos atores preferidos dos irmãos Coen. Não é à toa esta predileção. Ele entrega suas falas e encarna o personagem de forma tão gutural que é facílimo esquecer que existe ali um ator. Walter é caricato, sim. Mas esta caricatura é desenhada de forma consciente pelos diretores e pelo intérprete, que fazem uma crítica potente a respeito dos tarados por guerra que existem aos montes na América.
Concentrar elogios a dupla principal e esquecer do time de coadjuvantes de peso seria um erro imperdoável. Desde Sam Elliott, que aparece em uma ponta divertida, passando por uma segura Julianne Moore e culminando em um alucinado John Turturro, todos os nomes tem seu tempo de brilhar. Novamente acertando em cheio na direção de arte e figurinos, os irmãos Coen criam cenários que conversam completamente e enriquecem a composição dos personagens que passeiam na tela. A começar pelo tapete de Dude, as pinturas de Maude e a indumentária esquisita de Jesus. Tudo se soma.
Outro ponto a ser ressaltado é a trilha sonora, com petardos de Bob Dylan, Creedence Clearwater Revival, Elvis Costello e uma versão matadora de Townes Van Zandt para o clássico dos Rolling Stones, “Dead Flowers”. A música incidental fica por conta do colaborador habitual dos Coen, Carter Burwell, que parece se divertir nas cenas oníricas. Não só ele. O espectador tem muito espaço para risadas e viagens a cada nova trip ácida do amigo Dude.
Uma pena que O Grande Lebowski não teve a resposta de público ou crítica que merecia na época de seu lançamento. Completamente ignorado pelo Oscar ou Globo de Ouro, chegou a ser exibido no Festival de Berlim, mas saiu de mãos abanando. O lado bom é que, com o tempo, as pessoas foram desfrutando melhor dos desdobramentos da história e começaram a curtir mais os personagens, elevando o filme dos Coen a um status de cult. Existe até uma religião baseada nos ensinamentos do Dude - exagero ou apenas uma brincadeira? O que importa é que este trabalho dos Coen diverte tanto quanto promete e deixa vontade de reencontrar os amigos feitos durante aquelas duas horas de loucuras. Uma continuação sempre foi pedida, mas nunca aceita pelos diretores. Talvez um dia?
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