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Crítica


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Sinopse

Um prisioneiro durante a Segunda Guerra Mundial faz qualquer coisa para ganhar alguns trocados no cárcere. Os demais enjaulados acreditam que ele é um espião e o hostilizam.

Crítica

Em 1953, Billy Wilder iniciava seu longa-metragem Inferno nº 17 com uma espécie de provocação. O narrador da história, o sargento Clarence Cook (Gil Stratton), afirma estar cansado de filmes de guerra. “Tratam sempre de fuzileiros navais, de submarinos e de mergulhadores em guerrilha nas Filipinas. Nunca sobre os campos de prisioneiros”, dizia o personagem. Para fugir desta verdadeira mesmice, Wilder e seu companheiro de roteiro Edwin Blum adaptaram a peça de teatro escrita por Donald Bevan e Edmund Trzcinski para o cinema. O resultado agradou à época. O longa-metragem foi um dos grandes sucessos de bilheteria da carreira do diretor e foi indicado a três prêmios da Academia – um deles convertido em prêmio, Melhor Ator para William Holden. No entanto, visto com olhos atuais, Inferno nº 17 mostra como envelheceu mal. O retrato das instalações e do cotidiano daqueles prisioneiros de guerra, ainda que tenha sido baseado em experiências reais dos autores da peça, soa bastante inocente para plateias de hoje. Para piorar, as tentativas de humor se mostram infrutíferas e deslocadas. Não chega a ser um filme ruim, mas empalidece ao lado de outros trabalhos superlativos de Billy Wilder.

Na trama, somos apresentados aos prisioneiros de guerra do campo 17, localizado em algum lugar ao longo do Rio Danúbio, Alemanha. Lá, o traiçoeiro Oberst von Scherbach (Otto Preminger) comanda com pulso de ferro os oficiais norte-americanos que foram capturados em combate. São várias casernas e mais de 600 soldados. Em uma delas, os sargentos que lá se encontram tentam de toda forma escapar. No entanto, os alemães tem uma estranha forma de antecipar todo e qualquer plano bolado pelos prisioneiros. É óbvio que existe um espião infiltrado. E a primeira e única suspeita recai sobre o cínico Sefton (Holden), sujeito conhecido por trocar favores com os alemães por alguns privilégios. Por mais que use seus inimigos para benefício próprio, Sefton afirma não ser o rato que todos pensam. Para provar, ele terá de descobrir quem é o verdadeiro dedo-duro naquela caserna. Quando o roteiro se concentra neste suspense – quem é o agente infiltrado e o que poderá ser feito com ele caso o encontrem, Inferno nº 17 é brilhante. Principalmente por contar com William Holden em uma atuação perfeitamente cínica. Wilder já havia dirigido o ator no inesquecível Crepúsculo dos Deuses (1950) e repetiu a dose com igual talento. Veja bem, os filmes até podem ser incomparáveis em qualidade, mas a entrega de Holden é igualmente excepcional. O ator consegue viver o arco do personagem de forma intensa, mostrando-se inicialmente suspeito, um tanto mau caráter, para depois provar-se um sujeito de fibra. O mais interessante deste “herói” é sua falta de simpatia. Talvez um reflexo dos filmes de gângster, que já apresentavam alguns protagonistas cheios de áreas cinzas, Holden consegue ser um herói de guerra cheio de defeitos.

Se os momentos encabeçados por Holden são ótimos, o mesmo não pode ser dito das tentativas de humor que Inferno nº 17 insistentemente tenta costurar ao largo da trama séria. A dupla Animal (Robert Strauss) e Shapiro (Harvey Lembeck) é tão exagerada e deslocada que parece pertencer a outro filme. Curiosamente, Strauss foi indicado ao Oscar por sua performance, em um dos tantos casos em que a Academia confunde overacting com boa atuação. Billy Wilder é conhecido por ótimas comédias, mas errou a mão ao tentar misturar alívio cômico em uma trama que se beneficiaria de maior seriedade. Se o diretor não se encontra na comédia neste caso, ao menos mostra por que é tido como um dos maiores mestres do cinema através de seus enquadramentos e escolhas estéticas. As formas como Wilder encontra para encaixar muitos dos prisioneiros no mesmo quadro, usando profundidade de campo e outras artimanhas, acabam gerando pinturas em preto e branco. As sombras, a ausência e presença de luz nas casernas, são utilizadas de forma narrativa. Um bom exemplo é a silhueta da lâmpada que balança em frente a William Holden, enquanto ele vai desvendando os mistérios da espionagem dentro do grupo.

Dourando a pílula em relação à situação de prisioneiros de guerra na Alemanha, provavelmente uma determinação da censura da época, que não permitia temáticas muito intensas no cinema, Inferno nº 17 pode ter impressionado na época, mas não mantém sua força seis décadas depois. Como um whodunit (tipo de suspense em que adivinhamos quem é o culpado) é eficiente, mas fica aquém do esperado ao lembrarmos os talentos envolvidos.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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