Crítica
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Sinopse
Depois de perder a casa, o emprego e a esposa, Pat fica deprimido e acaba sendo internado num sanatório por oito meses. Ao sair, vai morar com seus pais, buscando gradativamente reconstruir a vida. Os novos rumos são reorientados quando ele conhece Tiffany, uma garota misteriosa que também tem lá os seus problemas.
Crítica
De onde menos se espera, na maioria das vezes, é que surgem as melhores surpresas. Tudo bem que David O. Russell havia sido indicado ao Oscar por seu trabalho anterior (O Vencedor, 2010) e que no elenco estava o premiado Robert De Niro, mas O Lado Bom da Vida tinha tudo para ser aquele queridinho da crítica mais alternativa, sem grande impacto de verdade entre os espectadores. Afinal, os protagonistas são estrelas da vez – Bradley Cooper, conhecido pela série besteirol Se Beber Não Case (2009 e 2011), e Jennifer Lawrece, que no ano passado comandou o blockbuster irresponsável Jogos Vorazes (2012) – e a trama, sobre um romance entre dois malucos, soava como o “água-com-açúcar” da semana. Felizmente, após o incrível prazer de se conferir esta deliciosa história de amor fora dos padrões convencionais, tem-se a certeza de se estar diante de uma obra única e absolutamente universal.
Após muitos trabalhos descartáveis e poucos de fato interessantes (como Sem Limites, 2011, e As Palavras, 2012), Bradley Cooper finalmente encontrou seu grande papel no cinema, nesta que é sua melhor atuação até o momento. Ele é Pat Jr., que foi parar numa instituição para doentes mentais após quase assassinar o amante da esposa ao encontrar os dois no chuveiro, em sua própria casa. Sem mulher, sem casa e nem emprego, depois de 8 meses em tratamento ele é colocado em liberdade sob cuidados dos pais, Dolores (Jacki Weaver, grande nome do cinema australiano finalmente estreando em Hollywood, e com o pé direito) e Pat Sr. (De Niro, no seu melhor trabalho em anos). Jr. está determinado a reconquistar tudo o que perdeu, por mais improvável que essa missão possa parecer. Neste caminho conhece Tiffany (Lawrence), uma jovem viúva que foi demitida após transar com todo mundo no seu trabalho (“todo mundo”, ela afirma, “sem exceções de sexo ou idade”) na tentativa de curar a dor deixada pela morte inesperada do marido. Entre estes dois seres nitidamente alterados irá surgir uma inevitável atração, mas até que ela se concretize – ou não – muito precisará ser superado, principalmente os anseios iniciais deste homem que busca apenas uma coisa: sentir, mais uma vez, os pés no chão.
Qual seria O Lado Bom da Vida? Esta é uma questão que motiva praticamente todos os personagens deste filme, desde o companheiro de internação que vive fugindo apenas para ser procurado e levado de volta ao ambiente de origem como o amigo submisso que só sabe seguir às ordens da esposa, mesmo que não a suporte. A necessidade de se estar bem consigo vai além dos limites até então aceitáveis, como se fosse preciso ser muito especial para atingir tal feito. Estaria errada a mulher que, mesmo ciente das debilidades do marido e dos filhos, prefere fazer de conta que está tudo bem desde que todos fiquem juntos na mesa de jantar no final do dia? Ou o torcedor inveterado que não abandona suas superstições em hipótese alguma, ainda que elas possam colocar o próprio teto onde moram em perigo? E quais são, no final das contas, os verdadeiros riscos assumidos quando estamos entre amigos e familiares? Quem quer nosso bem pode ser também uma ameaça?
Os dois protagonistas de O Lado Bom da Vida são figuras iluminadas. Pat Jr. está sempre prestes a explodir, e Cooper compreende e defende seu tipo com todas as forças, fazendo milagres com o pouco que lhe é oferecido. O figurino é simples, mas revelador. As relações são primárias, mas evidentes. E suas vontades, básicas, ainda que imperativas. Tudo está no olho, na entonação da voz, no modo certo de correr pelas ruas, despreocupadamente ou em fuga, como se a nova amizade que está surgindo fosse mais um perigo do que um alento. Jennifer Lawrence, por outro lado, possui todos os quesitos de uma interpretação estelar e de fácil acesso ao espectador, com diálogos inspirados, figurino atraente, motivações ousadas, mas compreensíveis. Juntos, são capazes de atingir resultados poucas vezes vistas no cinema recente. Suas reações nunca são as esperadas, e essa constante surpresa é que fascina e conquista. Faíscas surgem, e o nosso melhor presente é poder presenciar de camarote o início dessa relação.
Russell, além de diretor, é também o roteirista de O Lado Bom da Vida, e, neste que é seu filme mais desprovido de adereços – não temos a guerra de Três Reis (1999) ou o boxe do citado O Vencedor – ele atinge o conjunto mais coeso e surpreendente. Com tão pouco a oferecer, consegue ir além do esperado, comprovando a máxima de que “menos é mais”. Seu controle de câmera é preciso, nunca sendo invasivo, apenas presente. A história a ser narrada é que importa, e todos se colocam à disposição dela. Com todos os elementos ao alcance dos envolvidos, a soma destes fatores só poderia ser como se apresenta, maior do que estes elementos em separado poderiam representar. Uma estrutura inteligente, com um texto vibrante e original, defendido por personagens com os quais nos importamos, sem vilões ou heróis, apenas pessoas comuns como qualquer um de nós. Um grande filme, de satisfazer corações e mentes.
Indicado a oito Oscars, inclusive à Melhor Filme e Direção, conseguiu também o mérito de estar presente nas quatro categorias de atuação: Ator (Cooper), Atriz (Lawrence), Ator Coadjuvante (De Niro) e Atriz Coadjuvante (Weaver). No entanto, quem vem se destacando nas premiações é Jennifer, já reconhecida no Globo de Ouro (Melhor Atriz em Comédia ou Musical), no Screen Actors Guild e em diversas associações de críticos. No entanto, O Lado Bom da Vida é muito mais do que isso, um filme que não pode ser avaliado pelas partes, pois seu segredo está justamente no todo. Uma lição de humanidade, sensibilidade e compaixão. Um conto que investiga com delicadeza nossas estranhezas, justamente aquilo que nos torna únicos. O algo a mais que faz a diferença, e por isso, especiais. Tal qual esta bela e comovente história de amor, em que a despeito de todas as adversidades, encontra seu espaço para acontecer. O que pode ser melhor?
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Muito bacana o texto! Elucidativo, sobretudo para àqueles que tinham críticas acerca de O Lado bom da vida, como eu. Talvez o mérito(e só me ocorreu isso agora)do filme esteja justamente no que foi citado:sem tanto a oferecer, o que parece pouco pode ser satisfatório e até eficiente. David O. Russel tem também um outro filme pouco divulgado, comentado, que gosto muito chamado"Spanking the monkey" e me parece que este tem uma "pegada"semelhante com "O lado bom da vida". Assim eu senti quando assisti.