Crítica
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Sinopse
Depois que a lei marcial cai por terra em Taiwan, no ano de 1988, A-han e Birdy se conhecem ao participar da banda escolar. Os dois jovens se atraem imediatamente, mas teme pelos julgamentos da sociedade.
Crítica
Esta é uma das fórmulas mais conhecidas dos romances voltados ao público LGBT: dois garotos se encontram na escola, sendo um deles novato, e o outro bem inserido na instituição. Um dos dois é rebelde, burlando as normas e chamando a atenção do segundo, tímido e obediente. O primeiro terá “passabilidade heterossexual”, em virtude de sua agressividade confundida com virilidade. Já o segundo, amante das artes, sensível, possui traços efeminados, despertando a desconfiança de amigos e familiares. Eles se atraem, apaixonam-se às escondidas, sofrem bullying, desafiam as autoridades (diretores de escola, policiais, padres, familiares) para atravessarem juntos o primeiro e maior amor de suas vidas. De Delicada Atração (1996) a Jonas (2018), passando por dezenas de casos até chegar a Seu Nome Gravado em Mim (2020), as regras se reproduzem com ínfimas variações. É preciso que a dificuldade do casal seja profunda, assim como o sofrimento, para que a concretização do amor soe ainda mais bela. A ingenuidade é interpretada enquanto sinceridade, e o desgaste emocional, enquanto prova de amor.
A produção de Taiwan constitui um melodrama no sentido mais clássico do termo: há muita música, sobretudo violinos tristes, pianos dedilhados e saxofones atmosféricos, associados a uma carga profunda de reviravoltas trágicas. Os personagens choram por amor, gritam aos ventos por amor, agridem-se por amor, fazem juras de amor sob a chuva, beijam-se numa praia deserta. O diretor Kuang Hui-Liu interpreta a paixão como sintoma de eterna juventude: mesmo mais velhos, os personagens se assemelham a adolescentes travessos. Além de um romance propriamente dito, oferece-se uma romantização, no sentido de idealizar o sentimento amoroso, concebendo um destino capaz de reunir os heróis em um país distante. O universo narrativo existe apenas para os estudantes A-Han (Edward Chen) e Birdy (Jinh-Hua Tseng): os olhares de ambos se cruzam na multidão; quando os pais de um ou outro aparecem, o segundo virá ao resgate. Qualquer punição em sala de aula envolve uma das duas metades do relacionamento, e quanto uma garota adquire o mínimo desenvolvimento psicológico, ela se intromete na união do casal (para então sumir quando convier ao roteiro). Trata-se de um dispositivo acessório, concebido para aproximar ou afastar os garotos conforme as necessidades emocionais.
Ainda que a narrativa se passe no final dos anos 1980, quando a repressiva sociedade local lidava com violência ainda maior contra os homossexuais, cabe questionar a reprodução desta visão de mundo nos anos 2020. Em que medida se valoriza o sofrimento enquanto forma de realização pessoal? Ainda é necessário conceber o martírio de ambas as partes para imaginar uma grande história de amor? Ora, haveria alternativas para um relacionamento adolescente saudável, sem a sobrecarga de pressões sociais, familiares, de homofobia internalizada e de comportamento tóxico de ambas as partes. Indaga-se que tipo de aprendizado afetivo esta obra provoca no jovem público LGBT a que se destina. Ainda que seja importante o resgate dos percalços enfrentados pela comunidade ao longo das décadas, a nostalgia pelo sangue e lágrimas de antigamente despertam um conflito ético. Há uma diferença essencial entre aprender com as lutas de décadas passadas e recorrer ao saudosismo daqueles “bons tempos que não voltam mais”, quando se sofria, mas no fundo se era feliz pelas brechas de afeto permitidas entre cada espancamento. Embora aposte numa fábula entre dois garotos, o desejo poderia se deslocar a uma experiência benéfica a ambas as partes. Paixões não destrutivas, vejam só, também podem ser marcantes.
A experiência proporcionada por Seu Nome Gravado em Mim se mostra tão reconfortante quanto previsível, no sentido de entregar exatamente o que se espera dela. A abordagem de um relacionamento transgressor por meio da linguagem menos transgressora possível seria uma escolha fundamentalmente paradoxal. No entanto, Kuang Hui-Liu manda este princípio às favas ao estimar que jovens gays também têm direito aos clichês da representação hollywoodiana da heterossexualidade. Isso significa que o cinema LGBT teria o direito de reproduzir o olhar desgastado por décadas de indústria clássico-narrativa, com o aparente diferencial que, em se tratando de dois homens, o resultado seria ousado em si mesmo. Ora, se as histórias de amor com mocinhas objetificadas e heróis salvadores são questionadas atualmente, por que acreditamos que colar os princípios de uma cultura heteronormativa em indivíduos gays produziria um resultado mais frutífero? Apesar de parte do público LGBT desejar a apropriação dos códigos patriarcais com os quais se deparou durante a vida inteira, existe a possibilidade de reivindicar uma linguagem própria: uma cultura LGBT com valores e estética independentes.
Ao menos, cabe reconhecer a eficácia dos recursos empregados, em assumida chantagem emocional. O diretor sabe trabalhar a duração dos planos, o impacto de uma música durante a tristeza ou euforia, além de nivelar homogeneamente o trabalho dos atores. Mesmo saltando entre décadas, países e cenários distintos (escola, casa, barco, praia, torre elétrica, bar, cataratas), a direção de fotografia demonstra impressionante coesão no tratamento da saturação intensa e das luzes artificiais. Seja na praia, no barco ou no Niágara, a mixagem de som é clara até demais, fruto da assepsia estética geral. Pode-se criticar a falta de realismo na representação de fatos históricos de Taiwan, no entanto, este drama não privilegia a capacidade de retratar o que ocorreu, mas de imaginar o poderia ter sido. O cinema se torna fuga do real, algo que, direcionado a uma comunidade ainda marginalizada, pode proporcionar algum consolo escapista. Entretanto, o cinema de 2020 é capaz de se emancipar dos sofrimentos multicoloridos de quatro décadas atrás. Seria importante incorporar, ainda que no cinema sonhador voltado ao passado, um ponto de vista condizente com as conquistas obtidas desde então.
Filme visto online na 44ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em outubro de 2020.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Bruno Carmelo | 5 |
Chico Fireman | 4 |
Francisco Carbone | 4 |
Daniel Oliveira | 5 |
MÉDIA | 4.5 |
Apaixonante e de uma leveza inigualável!
Bruno , cria um canal no YouTube pra vc fazer as críticas. Caso tenha, me informe, pois procurei e não achei. Estou cansado de gente não habilitada falando bobagens sobre os filme.
Esplêndida análise!
Eu não curti o filme. Ver um personagem ficar mais velho e ainda sonhar com o outro, e ficar correndo atrás, depois de tantos anos, acho problemático, e não romântico.