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Crítica


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Sinopse

A jovem e sonhadora June encontra escondido na floresta um parque de diversões chamado Wonderland, que é cheio de passeios e animais que falam. O único problema é que o lugar está confuso e desorganizado. June logo descobre que a atração veio da sua imaginação e que ela é a única que pode deixar o lugar mágico de novo.

Crítica

Há diversos detalhes que apontam ao cuidado de O Parque dos Sonhos com questões e representações antes negligenciadas por não estarem na pauta das discussões sociais. O fato da protagonista June viver num ambiente familiar propício à ampla valorização de sua criatividade é a principal dessas minúcias que, somadas, substanciam um discurso progressista. Chamada em casa de Jujuba, essa menina arteira e muito inventiva é uma das responsáveis pelo chamado Parque dos Sonhos, lugar fictício em que um urso azul dá as boas-vindas, uma javali cuida para que tudo funcione exemplarmente, um porco-espinho se encarrega da segurança e castores gêmeos dão conta das manutenções. Claro, também há o macaco que, munido de uma caneta mágica, inspirado pelas palavras humanas sussurradas no ouvido de seu equivalente brinquedo, cria as maravilhas locais, tais como carrosséis com peixes voadores e montanhas russas bastante radicais.

June vive em harmonia, estimulada a nutrir sua criação com elementos que a auxiliem no processo de crescimento. Seu melhor amigo, um menino indiano – outra sutileza que sintoniza o longa-metragem com os clamores por diversidade –, apaixonado secretamente por ela, é uma espécie de escudeiro fiel. O Parque dos Sonhos se passa boa parte no mundo real, com o desenho desse panorama doméstico adequado ao desenvolvimento infantil, com literais espaços generosos para que a invenção se expanda, num aceno metafórico ao avanço, inclusive emocional, da protagonista. As coisas mudam drasticamente quando a mãe descobre-se vítima de uma doença agressiva. Por conta desse quadro que lança sombras sobre a narrativa, ela precisa se afastar de casa e a animação encara com maturidade o percurso doloroso pelo qual a menininha passa a trafegar. Primeiro, ela arquiva o parque, uma vez que ele simboliza a ligação com a genitora ausente. Segundo, passa a cercar o pai de cuidados excessivos, por medo.

O Parque dos Sonhos estabelece com habilidade essas pontes entre o real e o imaginário, oferecendo componentes cuja profundidade pode fugir à compreensão dos pequenos. É no instante em que Jujuba adentra no local de encantamento, passando a ter contato com os personagens e as atrações inventadas por ela e sua mãe, que o filme demonstra perspicácia pouco comum, exatamente por entrelaçar sutilmente as instâncias. O parque é depauperado por uma nuvem de negatividade, projeção da tristeza da protagonista, decorrente da convalescênça da mãe, com isso colocando em risco a obra das duas. A interação com Boomer, Greta, Gus, Steve, Cooper e Peanut tira qualquer dúvida quanto ao fato da personalidade da garota estar fragmentada em cada um dessas figuras. Os diretores David Feiss, Clare Kilner, Robert Iscove diluem as observações densas numa aventura contra os zumbimiquinhos, criaturas adoráveis transformadas em vilões detestáveis.

Manifestando-se com eloquência, graça e consistência, O Parque dos Sonhos peca apenas ao chegar abruptamente ao seu desfecho, perdendo boas oportunidades para tornar esse percurso ainda mais vibrante. Todavia, a despeito disso, a jornada de amadurecimento de Jujuba, a ciência de que será necessário encarar os problemas do mundo para encontrar alternativas, perpassa as aventuras com os carismáticos animais antropomorfizados pela imaginação infante. Visualmente bonito, especialmente por explorar as potencialidades do singular parque de diversões em colapso, o longa ainda ganha pontos preciosos pela forma de amalgamar personagens distintos, fazendo o comportamento de uns espelharem-se nos outros. Exemplo disso, o macaco que encontra na arrumação dos doces, isolado, um subterfúgio ao infortúnio, rimando de pronto com a jovem que, para suportar a dor da separação, passa a ser organizada e diligente quanto ao pai. Parece pouco, mas faz a diferença.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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