Crítica
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Sinopse
Rob Bilott é um advogado de defesa ambiental que acaba de se tornar sócio de uma agência conceituada, especialista em trabalhar junto a empresas do setor químico. Ao ser procurado por dois agricultores de sua cidade-natal, inicia uma investigação particular sobre a possível intoxicação do solo e do rio que passa por um sítio.
Crítica
Ao longo da carreira, Todd Haynes se notabilizou por um rigoroso senso estético associado a uma busca constante pela autoralidade, o que fez com que enveredasse por filmes tão ousados quanto Não Estou Lá (2007), Velvet Goldmine (1998) ou Sem Fôlego (2017). Diante de tal histórico, é até mesmo estranho vê-lo comandando um filme tão genérico quanto O Preço da Verdade, parecido com um punhado de outros longas envolvendo advogados que encampam causas supostamente perdidas. Mais que um desperdício, o resultado é também entediante.
Há no filme um punhado de equívocos estruturais de narrativa, ora abusando de gatilhos que provocam elipses em pontos importantes da história, ora optando por priorizar momentos estridentes de forma a gerar alguma tensão artificial, ora simplesmente inserindo cenas de um didatismo gratuito e exagerado. Uma delas abre o longa-metragem, retornando até 1975 para mostrar alguns garotos mergulhando em um rio, no qual é borrifado algum produto químico que, é claro, não faz bem à saúde. Além de ser de uma obviedade incômoda, tal cena sequer combina com o tom demonstrado no desenrolar da história, especialmente em relação à grandiosidade do caso em questão. Trata-se de um mero facilitador visual que, também, subestima a inteligência do espectador.
Orquestrado como um filme denúncia sobre o poder das corporações perante o Estado americano, em especial o Judiciário e, indiretamente, o Executivo, O Preço da Verdade resume as mais de duas décadas de batalha do advogado Rob Bilott (Mark Ruffalo, com uma postura corporal que não condiz com o personagem) contra a poderosa DuPont, gigante da indústria química que basicamente sustenta os empregos da pequena cidade de Parkersburg, local da tal cena de abertura. Encantado com seu homenageado, que até faz uma ponta no filme, Haynes constrói a narrativa de forma que Bilott seja uma espécie de cavaleiro solitário pela justiça, disposto a abrir mão de carreira, vida em família e até mesmo a sanidade em nome de provar o envenenamento intencional da população norte-americana, por décadas.
De certa forma, a história deste O Preço da Verdade lembra bastante a exibida em Erin Brockovich (2000), com a diferença de que, aqui, busca-se um protagonista com um quê de mártir. Por mais que esta seja uma história verídica, o que traz um peso incontestável aos fatos retratados, é difícil se interessar por um personagem tão opaco cuja construção se vale mais pela determinação do que propriamente pelos valores. Em parte por culpa do próprio roteiro, que prioriza datas e movimentos jurídicos em detrimento do necessário fator humano, tão rico no longa que rendeu o Oscar a Julia Roberts. Com isso, nenhum coadjuvante consegue ir além do arquétipo básico a ele imposto, como se estivesse impossibilitado de mostrar algo além do óbvio. Que o digam Anne Hathaway, absolutamente desperdiçada, ou mesmo a súbita aparição e posterior sumiço de Bill Pullman.
Bastante cansativo, O Preço da Verdade apenas ganha um certo interesse já em seu terço final, quando a caminhada jurídica atinge o âmbito da influência das grandes empresas no governo americano, independente de quem esteja na Casa Branca. Ainda assim, por mais que seja um tema interessante, não há muito espaço para que tal questão seja aprofundada, ao menos não além dos pontos referentes ao próprio processo retratado. Uma vez mais, Haynes perde a oportunidade de ir além do básico. Uma pena.
Filme visto em Portugal, em janeiro de 2020.
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Gostei muito do comentário de Francisco Russo, ótimo.