Crítica
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Sinopse
O astronauta norte-americano Neil Armstrong está prestes a fazer história. Sua jornada para se tornar o primeiro homem a pisar na Lua exigirá sacrifícios e custos para ele e toda uma nação durante uma das mais perigosas missões espaciais.
Crítica
O fato do homem ter pisado na lua, em 20 de julho de 1969, até hoje é motivo de debates e controvérsias. Basta uma busca pelas profundezas da internet para encontrar dezenas de milhares de teorias conspiratórias que afirmam que tal evento nunca chegou a acontecer, que nada passara de propaganda política, movida pela guerra fria entre Estados Unidos e União Soviética. Polêmicas à parte, é fato que esta foi uma das maiores conquistas da humanidade, ainda que até hoje, quase cinquenta anos após o ocorrido, se siga debatendo quais foram os verdadeiros ganhos obtidos por tal façanha e se há razão para seguir investindo em tais aventuras interplanetárias. Uma reflexão interessante, que infelizmente parece estar ausente de O Primeiro Homem, longa que marca o reencontro do diretor Damien Chazelle com o astro Ryan Gosling, após o oscarizado La La Land: Cantando Estações (2016). Se antes a reunião dos dois resultou em música e cores, aqui temos apenas sonolência e monotonia. Resultado inesperado – e decepcionante – diante do que um argumento como esse parecia prometer.
Nas primeiras cenas de O Primeiro Homem, descobrimos que Neil Armstrong (Gosling), aquele que viria a ser responsável pelo passo que deixou de forma inédita a marca do homem em um outro terreno que não a Terra, perdeu uma filha ainda na tenra infância. A morte de um filho certamente é motivo mais do que suficiente para deixar um vazio quase intransponível. Enquanto que a esposa (Claire Foy) luta com o que tem ao seu alcance para manter a família unida – inclusive gerando uma nova criança logo em seguida – o marido e pai mergulha sem olhar para trás no trabalho. Algo se perdeu dentro dele, e o único caminho que lhe parece viável agora é para cima. O mundo lhe é pequeno, sem espaço para sequer respirar, quem dirá seguir adiante dia após dia. É por isso que passa a se dedicar com um afinco cada vez maior ao plano de, como astronauta, fazer história. Uma conquista de todos, mas um feito que ele espera que ao menos lhe dê algum tipo de paz.
A trupe de Armstrong não é grande, mas são homens fiéis que, com ele, compartilham do mesmo sonho rumo às estrelas. Chazelle, no entanto, não demonstra nenhum interesse por estes companheiros. Assim, figuras como Jason Clarke, Patrick Fugit, Christopher Abbott, Ethan Embry e Pablo Schreiber tanto estão em cena como não estão mais, muitos desaparecendo – seja em um acidente, um desastre ou outra tragédia equivalente – sem aviso nem despedida. A irrelevância de suas vidas serve, ao menos, para mostrar quão pequenos são esses homens diante da grandeza daquilo a que estão se propondo. Por outro lado, o desrespeito com tais atores chega a ser constrangedor: alguns possuem duas ou três linhas de diálogos irrelevantes, enquanto que outros servem não mais do que para compor cenários, como peças descartáveis, ao invés dos heróis que foram, se sacrificando em testes, experiências e riscos que, para que um fosse bem-sucedido, muitos tiveram que perder seus pescoços.
Pois, ainda que o episódio seja globalmente conhecido, as atenções do diretor e de seu roteirista (Josh Singer, vencedor do Oscar por Spotlight: Segredos Revelados, 2015) se voltam ao núcleo familiar do protagonista. Claire Foy faz tudo de acordo com a cartilha – é possível até prever quais sequências serão usadas nos possíveis “clipes do Oscar” (afinal, ninguém enfrenta oficiais da NASA com um dedo em riste incólume) – mesmo que sua função não seja mais do que funcional, apenas servindo tanto de apoio como para propor algum tipo de confronto aos dilemas enfrentados pelo marido. Ryan Gosling, por outro lado, tenta criar um homem tão perdido dentro de si e desconectado do resto do mundo que precisa ir ao espaço para, enfim, se encontrar. No entanto, ele confunde introspecção com apatia, e dessa forma o espectador é presenteado com uma interpretação que beira o vazio, seja por ser desprovida de emoções, ao mesmo tempo em que parece não dar importância alguma a tudo que é posto em seu caminho durante essa jornada. Entendemos o que lhe falta. Só ressente-se a compreensão de como alguém tão desprovido de alma pode ter ido tão longe.
Damien Chazelle tem construído uma carreira interessante, de poucos, porém notáveis, trabalhos. Tanto Whiplash: Em Busca da Perfeição (2014) quanto o citado La La Land, no entanto, apostavam em personagens em busca de seus sonhos, dispostos a pagar o preço que fosse preciso para alcançá-los. Com O Primeiro Homem ele pela primeira vez se apropria de uma história real, tendo como personagem-título alguém que acabou indo muito além do que aqueles tipos que havia criado antes na ficção. Curiosamente, no entanto, o que apresenta é alguém completamente desprovido de vida, desinteressado e desinteressante. E se nem o visual inebriante da viagem à lua consegue oferecer à audiência algum tipo de alento, o que se pode esperar de todo o resto? A oportunidade era gigantesca, e poderia ter sido tão marcante como o próprio feito em si. Ao apostar na contramão, buscando o mínimo de um ser marcado pela desilusão, o que os realizadores conseguem é, além de menosprezar o alcance deste conto de entrega e sacrifícios, desprezar ainda seu contexto, prós e contras. Um mea culpa até chega a aparecer, lá pelas tantas, mas daí é tarde demais: o estrago já foi feito. E não há o que possa ser remediado quando nem mesmo os que deveriam se importar parecem atentos ao resultado.
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Eu assisti esse filme 2 vezes e, nas duas, achei impecável pois passa exatamente a ideia de um Armstrong triste por sua perda e tentando encontrar um novo propósito. Ler este artigo só me fez acreditar mais aí da na famosa frase: SE a crítica detestou, então o filme é bom. Este é um caso.