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Sinopse

Depois de fazer uma viagem ao passado, um piloto precisa juntar forças com seu eu mais jovem e com seu pai para conseguir fazer as pazes com a própria história e salvar o futuro.

Crítica

Ryan Reynolds é o tipo de ator que necessita que o show – sim, pois está habituado mais a espetáculos do que a meros filmes – seja inteiro a seu respeito, com tudo girando ao seu redor. O problema da sua presença em O Projeto Adam é que, apesar dele ser o protagonista, o personagem-título e estar presente na grande maioria das cenas, o mais importante por aqui é – ou, ao menos, deveria ser – a história em si. É diferente das suas aparições como Deadpool ou de seus mais recentes projetos (Pokemón: Detetive Pikachu, 2019, Esquadrão 6, 2019, Free Guy, 2021, ou Alerta Vermelho, 2021), todos com potencial de se transformarem em novas franquias, mais pelo carisma do astro do que pelos roteiros em si. Dessa vez, no entanto, parece ter se cercado de todas as seguranças necessárias para que o projeto seja bem-sucedido (um diretor com quem já trabalhou antes, nomes populares como coadjuvantes, muitos efeitos e reviravoltas, uma ambientação dinâmica), mas o que se percebe é ter ficado para trás justamente o mais importante: a espontaneidade. Tudo é muito controlado, previsível, fácil de ser antecipado. Ou seja, até o que lhe é característico termina por soar artificial. E assim, são enterradas as chances da mistura dar certo, pois de tão planejada, acaba perdendo o viço.

Adam (Reynolds) está no comando de uma nave espacial, em plena fuga, com vários agentes inimigos no seu encalço. Quando está prestes a ser capturado, tira da manga um “pulo” temporal, e assim, de 2050, vai parar em 2022. Não que a mudança de cenário faça diferença: os mesmo que o perseguiam antes, em breve o encontrarão no outro espaço e tempo. E assim começam as tantas incongruências do roteiro escrito por Jonathan Tropper (Sete Dias Sem Fim, 2014), T.S. Nowlin (saga Maze Runner) e a dupla Jennifer Flackett e Mark Levin (Viagem ao Centro da Terra: O Filme, 2008): afinal, se era necessária a introdução do tema “viagens temporais”, por que não fazer de um modo orgânico, inserido em um contexto com um mínimo de lógica? Pelo contrário, o que acontece é que o espectador se vê jogado no meio dos eventos, talvez para ganhar de imediato uma sensação de adrenalina, porém tão barata e gratuita e logo se dissipa quando, após dois segundos de reflexão, se percebe que o estardalhaço desse começo pouco tem a agregar ao desenvolvimento da narrativa.

Afinal, O Projeto Adam se passa em três momentos distintos: 2050, 2022 e 2018. Por mais que a maior parte do enredo esteja concentrado no presente – ou seja, em 2022 – há duas formas de se racionalizar essa decisão. A primeira, justificada em cena, seria por um “acidente”: ou seja, como o próprio Adam chega a afirmar, ao acertar a data para sua volta, não teve tempo para “checar” as informações, pois estava tentando se manter vivo em meio à perseguição, e foi por isso que parou ali, ao invés do 2018 almejado. Qualquer olhar atento, porém, conseguirá somar dois mais dois e entender que esse ínterim tem função estratégica, servindo para conectar Adam com o próprio Adam – ou seja, com uma versão mais jovem de si mesmo, vivida pelo novato Walker Scobell. Assim, mesmo que não tenha função alguma a cumprir e sua relevância junto ao andar dos acontecimentos seja próxima a zero, há sempre em quadro um jovem, permitindo, com isso, uma possível identificação com esse tipo de público – e como as estatísticas apontam que a maior fatia da audiência é formada por essa faixa etária, fica claro que muitas das decisões tomadas surgem mais por necessidades do algoritmo do que por anseios criativos do diretor ou dos roteiristas.

Em resumo, o que Adam busca é chegar até o momento em que o próprio pai (Mark Ruffalo, naquele jeito desleixado de sempre), um professor e cientista, desenvolveu o conceito – o tal “Projeto Adam” – que irá permitir as viagens no tempo. Acontece que ele irá morrer não muito tempo depois – em 2022 já não está mais vivo – e sua criação será roubada pela sócia (Catherine Keener, visivelmente desconfortável, tendo que se contentar com o estereótipo da mulher desleal e infeliz que anuncia o plano inteiro antes do último tiro). Essa, a poderosa Maya Sorian, será responsável também pela morte da namorada de Adam, Laura (Zoe Saldana, tendo não mais do que duas ou três cenas para dizer a que veio), por supostamente ter descoberto algo – que nunca chega a ficar muito claro – contra a empresária. É um negócio um tanto rocambolesco, cheio de idas e vindas, com robôs virando pó e sabres de luz (Star Wars é uma referência assumida), mas com uma conexão tão fraca entre seus diferentes ambientes que as conexões propostas se revelam por demais forçadas. Um bom exemplo é a discussão parental – o pai que se dedica só ao trabalho, sem tempo para a família, ou o filho ressentido que não assume o quanto gosta da mãe – que acaba resignada a discursos esporádicos, sem encontrar ressonância nos atos dos personagens.

Caso Adam tivesse pulado de 2050 direto para 2018, a mesma história teria sido contada, sem diferença alguma. O bullying na escola, o possível novo namorado da mãe e até a versão jovem da vilã (num efeito de rejuvenescimento que chega a ser grotesco de tão mal feito) são algumas das tantas distrações dispostas pelas quase duas horas de O Projeto Adam que servem apenas para tentar disfarçar o tão pouco que há para ser dito. Shawn Levy é um diretor experiente, e seu trabalho anterior com Ryan Reynolds (o citado Free Guy: Assumindo o Controle) obteve um resultado positivo justamente pela objetividade e sua proposta como também pela pretensão em não ser mais do que uma diversão competente. Dessa vez, os dois miram alto demais para o material que tinham em mãos, e o que conseguem não só decepciona pelo que fica pelo caminho, como também incomoda pelo tão pouco que exibe frente a produções similares. É um passatempo, mas como muitos desses casos, descartável e inconsequente, pronto para ser esquecido com mais rapidez do que a exigida para o seu consumo.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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