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Sinopse

Ao desembarcar na Normandia, no dia 6 de junho de 1944, capitão Miller recebe a missão de comandar um grupo do segundo batalhão para o resgate do soldado James Ryan, caçula de quatro irmãos, dentre os quais três morreram em combate. Por ordens do chefe George C. Marshall, eles precisam procurar o soldado e garantir o seu retorno, com vida, para casa.

Crítica

A temática da Segunda Guerra Mundial é caríssima para Steven Spielberg. Além de ser um aficionado por história, o pai do cineasta lutou no conflito, fato que deixou incontestável marca na família e encontrou fortes ecos na carreira de Spielberg. A lista é grande e compreende desde o equivocado 1941: Uma Guerra Muito Louca (1979), passando pelo belo Império do Sol (1987) e os essenciais A Lista de Schindler (1993) e O Resgate do Soldado Ryan (1998). Isso poderia soar como uma redundância tremenda vinda de um cineasta criativo. No entanto, ainda que sejam retratos de uma mesma época, cada um destes trabalhos são completamente diferentes um do outro.

Em O Resgate do Soldado Ryan, Spielberg resolveu colocar o ponto de vista do espectador junto dos homens que arriscaram suas vidas em meio ao conflito. Se já não fosse drama o suficiente a própria Segunda Guerra, o cineasta buscou no roteiro de Robert Rodat um elemento mais extremo. E se a vida de oito soldados estivesse em jogo na tentativa de encontrar apenas um homem nas linhas inimigas? Enquanto o batalhão se pergunta a lógica desta matemática, o próprio soldado Ryan confronta-se com esta realidade, visto que não se sente mais ou menos especial do que seu companheiro de armas. Com esta premissa, Steven Spielberg realiza um dos grandes dramas de guerra da história do cinema.

Ainda que seja muito lembrado pelos primeiros 25 minutos de ação ininterrupta, mostrando de forma crua e violenta a invasão à Normandia pela tropa aliada, O Resgate do Soldado Ryan consegue ir além. Com trama quase episódica, revela aos poucos as angústias da guerra e dos homens que nela lutam. São diversos os pontos a destacar. A sequência em que um combalido Caparzo (Vin Diesel, antes da fama) tenta salvar uma criança em uma casa em ruínas demonstra o desequilíbrio emocional do soldado – “ela fez me lembrar de minha sobrinha” – assim como o desespero da população que estava no centro do combate, que preferia ver a filha pequena nas mãos de um soldado desconhecido do que junto deles. Ou o drama dos homens despreparados que são enviados a combate e se veem completamente congelados em momentos de estresse – o cabo Upham (Jeremy Davies) sendo o melhor exemplo. E o que é certo ou errado quando um inimigo está em suas mãos e você pode escolher entre matá-lo ou soltá-lo, sabendo que esta mesma pessoa pode se voltar contra você ou contra seus companheiros no futuro próximo? Spielberg é muito feliz em rechear seu longa-metragem com momentos como este, que fazem o espectador se colocar no lugar daqueles personagens.

Se os momentos pensativos são interessantes, os de ação são ainda melhores. A já citada sequência inicial é um grande exemplo de como filmar um conflito de forma correta. Spielberg sabe como contar suas histórias com a câmera e, embora as cenas sejam rápidas e bombásticas, o público nunca se perde. Existe um controle muito grande da mise-en-scène por parte do diretor, que consegue nos colocar em meio aquele conflito e tentar emular sensorialmente o que aqueles personagens estão sentindo. Quando o Capitão John Miller (Tom Hanks) tenta chegar à margem da praia no Dia D, o inferno está instalado ali. Explosões próximas o tiram de seu norte e vemos, com uma câmera tremida e o desenho de som diferenciado, como aquele personagem está encarando aquele momento. O Resgate do Soldado Ryan é uma verdadeira aula de como se construir cenas de ação que passam longe do “piscou-perdeu” tão utilizado por cineastas de baixo calibre. Toda e qualquer desorientação utilizada por Spielberg é pensada para ter tal efeito. E isso é algo salutar em sua filmografia. Menos citada, mas igualmente potente, é a sequencia derradeira, da resistência contra as forças alemãs em Ramelle. Não apenas os momentos de ação são bem executados como os planos e as estratégias ali utilizadas chamam a atenção pelo zelo aos detalhes.

Tom Hanks comanda a ação e transforma o seu Capitão John Miller em uma figura bastante crível. Sem dar muitos detalhes de seu passado, o relutante herói de guerra tem apenas uma ideia em mente: encontrar o tal soldado Ryan e colocá-lo em segurança para ter o direito de voltar para casa e reencontrar sua esposa. Estressado pelos efeitos da guerra, Miller tenta de todas as formas manter seu pelotão unido, mesmo que não acredite completamente na missão que está seguindo. Ele é a figura sã, que norteia o grupo. Mas este equilíbrio não é perene, visto que a perda de um dos seus soldados quase o joga em um abismo. Em sua primeira parceria com Spielberg, Hanks se mostra um ator perfeito para o papel, por utilizar sua persona de homem comum em uma situação extraordinária em benefício completo do filme.

Em um de seus primeiros papéis de grande destaque após Gênio Indomável (1997), Matt Damon se mostra um ator interessante ao tocar a dor de um homem que perdeu todos os seus três irmãos no conflito e que, por isso, recebe uma passagem de volta para a casa. Ele está relutante em voltar e não pretende fazê-lo deixando seus companheiros na mão. Uma boa performance, ainda que notadamente de um ator verde, mas em ascensão. Edward Burns, Adam Goldberg, Barry Pepper e Giovanni Ribisi são nomes destacáveis em um elenco praticamente infalível.

Com fotografia granulada e com as cores diminuídas para dar um tom mais cru ao longa-metragem, o diretor de fotografia Janusz Kaminski garantiu seu segundo Oscar (depois de ter vencido o primeiro por A Lista de Schindler). Este foi um dos quatro prêmios da Academia que o filme recebeu – Diretor, Montagem, Edição de Som e Mixagem de Som. Também foi indicado (entre outras categorias) a Roteiro, Ator e Filme do ano, mas incrivelmente não recebeu estes outros merecidos louros. Se não teve este reconhecimento, ao menos o tempo tem mostrado que nenhuma lista com grandes filmes está completa sem este, um dos melhores trabalhos comandados por Steven Spielberg. De um cineasta com tantos títulos inesquecíveis, isso não é pouco.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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