O Segredo de Madeleine Collins
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Antoine Barraud
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Madeleine Collins
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2021
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França / Bélgica / Suíça
Crítica
Leitores
Sinopse
Judith leva uma vida dupla. Na Suíça e na França ela tem amantes e filhos diferentes. Pouco a pouco, o frágil equilíbrio entre essas duas rotinas completamente diferentes começa a apresentar severas rachaduras.
Crítica
Judith (Virginie Efira) leva uma vida dupla entre a Suíça e a França. Numa, é a esposa de Melvil (Bruno Salomone), famoso maestro com quem tem um cotidiano economicamente confortável e dois filhos (o pré-adolescente e o adolescente). Na outra, ela mantém uma família igualmente consolidada com o desempregado Abdel (Quim Gutiérrez), com quem cria uma filha pequena. Em princípio, somos levados a imaginar que o mais importante em O Segredo de Madeleine Collins é o testemunho de um colapso antecedido pela espera desse momento em que as farsas cairão por terra e a jornada dupla se tornará inviável. E isso não deixa de ser um pouco verdade. Porém, o cineasta Antoine Barraud injeta elementos nessa trama instigante ao ponto de às vezes não sabermos se estamos num labirinto ou num tenso jogo de gato e rato. Há mais um aspecto importante da vida de Judith: ela se apresenta eventualmente como Margot e isso não tem a ver com a associação a uma das duas vidas. Mas, então, por que ter uma segunda alcunha se ambos os seus amores a chamam de Judith? Essa é uma das perguntas fermentadas ao longo da história. O roteiro também assinado por Antoine Barraud expõe habilmente o cotidiano bifurcado dessa tradutora bastante requisitada, deixando claro como ela faz para se dividir entre os lares distintos e largando pistas para excitar a nossa curiosidade.
A composição de Virginie Efira não prevê que Judith seja uma na companhia de Melvil e outra nos braços de Adbel. E isso torna a duplicidade ainda mais intrigante. Na medida do possível, a protagonista de O Segredo de Madeleine Collins parece confortável em mentir para os dois homens com o intuito de manter as coisas como estão. Não há espaços para julgamentos morais ou algo assim, pois o filme se importa mais com a construção da teia envolvente de suspense. Em meio a esse emaranhado, algo sobressai em forma de dica para o espectador com um pouco de repertório cinematográfico. Quando Judith aparece rapidamente de costas, com um coque no cabelo, imediatamente somos remetidos a um dos penteados mais famosos do cinema: o de Kim Novak em Um Corpo que Cai (1958), talvez a obra-prima do mestre Alfred Hitchcock. E o segredo para o melhor entendimento do todo está justamente nesse vínculo manifestado com o clássico incontornável. Afinal de contas, o coque abre a porta para outras equivalências entre as obras: são filmes de suspense, falam (de formas aparentemente distintas) de duplos e, ainda por cima, a Madeleine do título é justamente o nome da personagem principal de Novak no longa-metragem dos anos 1950. Portanto, não se tratam de coincidências, mas de uma homenagem muito clara. Antoine Barraud bebe na fonte inesgotável do gênio Alfred Hitchcock.
Sendo assim, Um Corpo que Cai se torna uma espécie de código para desvendar O Segredo de Madeleine Collins. Sim, pois à medida que a rotina duplicada de Judith vai se tornando inviável, a confusão se intensifica por conta da adição de perguntas que acentuam ainda mais as dúvidas. Se no começo somos levados a imaginar que os amantes da protagonista simplesmente ignoram a existência um do outro, é surpreendente quando Melvil cita Adbel e vice-versa. Como eles se conhecem? Será que as engrenagens dos relacionamentos que têm Judith como vértice são mais escancaradas do que intuímos num primeiro momento? Antoine Barraud sabe trabalhar muito bem a inserção e o desdobramento de informações para, paradoxalmente, aumentar as áreas turvas, não para esclarecer. Enquanto instiga o suspense em torno de um panorama gradativamente acrescido de elementos e personagens, o cineasta delega à loira Virginie Efira (como a Kim Novak no filme de Hitchcock) a construção da turbulência pessoal que ameaça se transformar numa selvagem tormenta. A atriz francesa sugere a iminência de uma ruptura total a partir do acúmulo de inúmeras rachaduras no cotidiano caótico de Judith, antes supostamente mantido sob controle. Não existe um amante mais à frente, tampouco uma casa à qual ela gostaria de pertencer mais. As coisas são muito mais nebulosas.
Se antes Um Corpo que Cai foi citado como chave para compreender as reais intenções de O Segredo de Madeleine Collins é porque a vida dupla se trata apenas da superfície, da ponta do iceberg. Quando Judith aparece com o coque da Madeleine de Hitchcock convém pensar em algo que ajudou a eternizar Um Corpo que Cai: a natureza etérea desses duplos com fator substitutivo. Cego pela amada que morreu, o detetive acometido por vertigens vivido por James Stewart tenta recriar a falecida a partir do corpo "semelhante". O que muda drasticamente no filme comandado por Antoine Barraud é de onde parte o ímpeto de fundir personalidades distintas (morta e viva), como se assim fosse possível recolocar no mundo alguém tocado pela morte. O filme poderia mergulhar um pouco antes nessa revelação, até para ter tempo de desenvolver melhor a dimensão à qual somos apresentados no seu último terço. No entanto, mesmo com certos escorregões e leves senões, a produção ainda consegue a proeza de instigar constantemente as dúvidas, evitar didatismos na hora de expor as verdades por trás das dissimulações e ainda utilizar bem a reviravolta (o chamado plot twist). De quebra, uma vez declarados, os fatos finalmente significam o prólogo que, até aquele instante, parece apenas o testemunho solto de uma morte casual num plano-sequência à lá Festim Diabólico (1948), do velho Hitch.
Filme assistido durante o 13ª Festival Varilux de Cinema Francês, em junho de 2022.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
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Marcelo Müller | 7 |
Ailton Monteiro | 7 |
Francisco Carbone | 7 |
MÉDIA | 7 |
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