20140924 cartaz e1411577725899

Crítica

São poucas as comédias românticas contemporâneas que se aproximam de temáticas relevantes com conteúdo. O indie Obvious Child não só o faz com muito bom humor como também serve de veículo para duas grandes revelações: a atriz Jenny Slate e a diretora e roteirista Gillian Robespierre, que se valem do material que desenvolveram originalmente no curta metragem homônimo para expandir aquele universo e personagens neste agradável e tocante filme.

Seguindo a mesma premissa que deu tão certo em Frances Ha (2012), Obvious Child acompanha Donna, nova-iorquina que se aproxima dos trinta anos sem grandes perspectivas para seu futuro. Seguindo as leis de Murphy, tudo piora quando no intervalo de poucos dias ela se descobre sem namorado, sem emprego e surpreendida pela tal “criança óbvia” que dá título ao filme. Eis uma oportunidade única para dar voz e amplificar todas as frustrações e incertezas comuns da necessidade de se assumir como adulta e responsável por suas ações – o que ela faz em ora constrangedoras ora hilariantes performances de stand-up comedy.

Sucesso instantâneo nos festivais de Sundance e SXSW, Obvious Child talvez seja tão feliz em suas pretensões por dar conta de temáticas essencialmente dramáticas e sérias com leveza e até mesmo alguma originalidade. Como seu cartaz e trailer não fazem questão de esconder, pode-se apontar sem medo que este é, sim, um filme sobre o aborto, mas que vai muito além. Ainda assim, é este assunto, ainda muito tabu tanto nos Estados Unidos quanto em nosso país, que ronda a personagem e seu desconforto em tomar decisões rápidas, sérias e que mudarão sua vida por completo.

Com personagens bem construídos e um roteiro afiado, o filme de Gillian Robespierre é maduro e inteligente, ainda que careça de alguma tensão climática – o arco que encerra o terceiro ato do filme é bastante previsível. Apesar disso, além da cineasta, a graça toda da produção fica com Jenny Slate, que já foi integrante da trupe do humorístico Saturday Night Live e fez muito stand-up para chegar ao timing cômico que parece esbanjar. Ainda que insista em uma ou outra piada escatológica – uma delas visual, inclusive – sua Donna é extremamente empática e adorável, méritos de uma atriz que merece mais e melhores papeis dignos de suas capacidades.

No caminho da maioria das produções de Judd Apatow e do seriado de Lena Dunham (Girls, 2012), o principal interesse de Robespierre aqui é apresentar sem muitos julgamentos os dilemas de adultos que ainda não se aceitaram devidamente nesta condição. Se entre 1980 e 1990 John Hughes discorria tão bem sobre os dilemas da adolescência, hoje percebe-se uma tendência entre cineastas que cresceram nessa época a apontar suas câmeras para saber o que acontece quando tais adolescentes atingem a maturidade. Felizmente, os resultados têm sido positivos, e Obvious Child se qualifica bem nesse novo subgênero, que flerta com o tragicômico.

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
avatar
é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Graduado em Publicidade e Propaganda, coordena a Unidade de Cinema e Vídeo de Caxias do Sul, programa a Sala de Cinema Ulysses Geremia e integra a Comissão de Cinema e Vídeo do Financiarte.
avatar

Últimos artigos deConrado Heoli (Ver Tudo)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *