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Crítica


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1 voto 8

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Sinopse

Três jovens universitários de partes diferentes do Brasil se encontram numa festa e se tornam amigos inseparáveis. A necessidade de ganhar dinheiro os leva a transformar o apartamento compartilhado no cenário de um reality show.  

Crítica

Nando Olival estreou no cinema com o pé direito, em 2001, ao assinar o divertido e envolvente Domésticas. Esse, na verdade, foi um trabalho de co-direção, pois ao seu lado estava ninguém menos do que Fernando Meirelles. Na década seguinte Meirelles lançou Cidade de Deus (2003), que conquistou o Brasil e o mundo, e os hollywoodianos O Jardineiro Fiel (2005) e Ensaio sobre a Cegueira (2008). E o que Olival fez neste mesmo período? Muita coisa, certamente, mas todas longe da tela grande – espaço que retorna somente agora, dez anos depois, com o jovem e contemporâneo Os 3. Uma espera que, se não se justifica totalmente, isso se dá somente pelas expectativas levantadas por um início tão auspicioso e pela famosa parceria anterior, pois o novo trabalho tem méritos suficientes para se destacar por conta própria.

Os 3 é um filme que engana tranquilamente qualquer espectador mais descuidado. Ele se vende como uma obra sobre a juventude, adolescente e inconsequente, como tantas comédias românticas despreocupadas que existem por aí. Mas, mesmo sem deixar de ser tudo isso, consegue ser também muito mais. Trata-se, na verdade, de um estudo profundo sobre o comportamento humano, quais os processos de formação dessa nova sociedade em que estamos vivendo e como os antigos valores perdem e ganham novos significados a cada instante. É um olhar apurado sobre os relacionamentos humanos, sobre desejos e sentimentos como amizade, amor, paixão e tesão – muito bem explicitados no letreiro inicial. Os três jovens protagonistas – dois rapazes e uma moça – representam uma fatia cada vez mais importante neste universo em que o consumo e o voyeurismo assumem relevâncias ainda há pouco inimagináveis. E qual é o papel que assumimos nesse jogo: vestindo a camiseta ou simplesmente nos colocando à margem?

Rafael (Victor Mendes) recém chegou em São Paulo e está procurando onde morar. Numa festa acaba cruzando com Camila (Juliana Schalch) e Cazé (Gabriel Godoy), outros dois que se encontram na mesma situação. Ali nasce uma amizade quase que incontrolável, reforçada após a decisão de irem viver juntos. Se no começo decidem que não deveria haver qualquer tipo de envolvimento romântico entre eles, logo isso é esquecido quando ela se enamora pelo último, deixando o outro amigo numa posição de rejeitado. Seria o início do fim, uma separação anunciada que só é impedida através de uma intervenção ex-machina: uma empresa de marketing se oferece para implementar um conceito que o trio desenvolveu na faculdade de comunicação, nada mais do que uma mistura de reality show com site de compras coletivas. Ou seja, câmeras são instaladas pelos cômodos de onde moram, e todos os produtos e eletrodomésticos que passam a usar no dia a dia são patrocinados por grandes empresas. Estas, por fim, irão lucrar através de vendas impulsionadas pela internet.

O problema entre os três se dá quando a vida real começa a interferir na fantasia. A proposta era de um trabalho, e eles decidem que a intimidade que estariam vendendo não seria a deles, e sim uma outra, inventada, como se fossem atores interpretando papéis fictícios. Mas ninguém consegue manter uma farsa, por melhor que seja, vinte e quatro horas por dia. Como não poderia deixar de ser, quando os sentimentos se misturam, alguém sempre sai ferido. E invariavelmente é aquele que mais se importa com tudo o que acontece ao redor. Sexo, romance, carinho, carência, fantasia: tudo termina envolto numa grande névoa, e somente o distanciamento irá permitir uma visão mais clara da situação. De cabeça fria será possível a tomada de decisão necessária. Por mais anticonvencional que ela seja.

Mesmo não sendo o mais original, ao menos Os 3 consegue levar ao público uma história inédita, apresentada sob um formato atraente e curioso. Indicado para qualquer tipo de público, irá entreter tantos os mais jovens – que certamente se reconhecerão no que se desenrola em cena – como os mais adultos – que terão a sua disposição um retrato pontual sobre uma nova forma de se levar a vida. As preocupações podem continuar sendo as mesmas, mas como lidar com elas é que faz a diferença. Gostar de homem ou de mulher, ter muito ou pouco dinheiro, obter sucesso ou não, viver pelo prazer do hoje ou pelas recompensas futuras: questões que antes definiam caráteres agora se tornaram secundárias. O que importa é o agora, e é essa verdade o filme explora como poucos outros.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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CríticoNota
Robledo Milani
8
Carissa Vieira
6
MÉDIA
7

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