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Sinopse

Em Os Estranhos: Capítulo 1, Maya e Ryan viajam para o interior dos EUA. No entanto, aos poucos, o clima de férias dá lugar a um ambiente sombrio. Isso porque a dupla se torna alvo de uma misteriosa gangue de estranhos mascarados.

Crítica

Terceira parte da saga, primeiro exemplar de uma nova trilogia, Os Estranhos: Capítulo 1 começa mostrando um cenário típico do horror slasher. Jeff (Ryan Bown) e Maya (Madelaine Petsch) namoram há cinco anos e estão na estrada rumo à entrevista visando o novo emprego dela. Pegando um pequeno desvio, os dois vão parar num lugarejo inóspito com menos de mil habitantes onde o sinal de internet é precário e o alcance de ajuda em caso de necessidade é bastante improvável. Já vimos este filme incontáveis vezes, mas, em princípio, não há qualquer problema com a reprodução de fórmulas, desde que a reiteração tenha algum fundamento (homenagem, subversão, etc.). O diretor Renny Harlin parece seguir à risca os pontos de uma cartilha que teve o seu apogeu no cinema norte-americano entre os anos 1970/90, vide a construção de um interior ameaçador repleto de pessoas com carrancas de poucos amigos. No entanto, fica difícil identificar se o realizador está armando uma paródia ou se leva tudo a sério, vide a falta de clareza dessa abordagem derivativa. Todas as pessoas que o casal encontra no ambiente claramente hostil têm jeito e comportamento de homicidas em potencial. Certas cenas poderiam facilmente descambar ao humor pastelão com a simples inserção de uma trilha sonora engraçadinha. Porém, para a nossa tristeza, Harlin está levando tudo muito, mas muito a sério.

Os Estranhos: Capítulo 1 tenta ser aterrorizante, mas atola num lamaçal de tédio. Para começar, por causa do teor genérico, pela elaboração despersonalizada do cenário, seguida da construção frouxa da atmosfera e da execução xoxa do terror. Renny Harlin não consegue homenagear o slasher e tampouco apresenta ideias criativas o suficiente para subverter os códigos próprios desse subgênero. Outro aspecto difícil de “comprar” é a ingenuidade exagerada do casal que não percebe os inúmeros indícios de que está caindo numa armadilha ao parar numa cafeteria para forrar o estômago. Todos os moradores locais os encaram como se estivessem enojados (ou com dor de barriga), mas os dois estão mais interessados em fazer planos para o futuro (que eles não terão, evidentemente). Novamente um problema conceitual, pois o cineasta não desenvolve nada a partir dessa inocência gritante, simplesmente colocando a característica nos personagens forasteiros para eles se tornarem esquematicamente vítimas de sociopatas homicidas. Além disso, há elementos inseridos providencialmente que aumentam a sensação de artificialidade, como a motocicleta nova em folha, com combustível e chave na ignição, que permite a Jeff um bordejo completamente desnecessário pela cidade enquanto sua namorada permanece sozinha. Some a isso à incapacidade para instigar com dúvidas e surpresas e teremos um filme entediante.

As emoções não rompem a grossa camada de letargia mesmo quando os assassinos entram em ação. Desse ponto em diante, Os Estranhos: Capítulo 1 se transforma numa longa e cansativa perseguição pela casa pouco valorizada como labirinto desconhecido no qual os protagonistas precisam se esconder em busca de sobrevivência. Geralmente fundamental em filmes de terror, por sua capacidade de provocar desorientação e limitação em meio ao horror, o cenário aqui é explorado com a mesma falta de energia dos demais elementos. Jeff e Maya são perturbados por uma menina que bate à porta perguntando sobre alguém (ninguém se incomoda que ela permaneça nas sombras sem ser vista), logo os barulhos na residência de madeira se tornam mais frequentes e depois portas e cômodos são destruídos numa perseguição entediante (a reutilização dessa palavra é intencional, pois define precisamente a experiência). Renny Harlin demonstra uma imperícia gritante na hora de conectar as cenas com o intuito de criar uma sensação de terror, frequentemente sabotando o potencial dramático das associações. Como quando cria toda uma situação que deixa os protagonistas nervosos – ao identificar a presença de um estranho na casa-, mas não preserva a atmosfera a fim de manter a intensidade no que vem logo a seguir. Parece que o realizador está sempre em busca de sabotar a sua próxima cena.

Outro ponto negativo é o fraco trabalho do elenco, especialmente os de Ryan Bown e Madelaine Petsch. Os intérpretes não convencem como namorados apaixonados e tampouco na pele de vítimas desesperadas para sair de uma situação tétrica. Como Renny Harlin opta por um registro exagerado, mas sem assumir isso, os coadjuvantes também são mais ruídos do que melodias. Quando o Jeff e Maya chegam ao interior, o cineasta acena a outro clichê do slasher. Ele declara que os moradores da localidade tradicional e obscurantista ficam de muita má vontade com os forasteiros porque eles “vivem em pecado”, ou seja, transam regularmente sem a bênção do sacramento matrimonial religioso. Mas, isso não passa de uma intenção naufragada, pois Harlin não se esforça para mostrar que o terror é fruto da visão tacanha da localidade que utiliza a fé como arma perfurante contra aqueles que não seguem os seus preceitos. Os Estranhos: Capítulo 1 é o resultado de uma série de escolhas erradas, de tentativas malsucedidas de utilizar itens clássicos de um subgênero popular sem fazer mais do que copiar e colar torto. Depois de torcer para o filme acabar logo, somos atingidos pelo grande momento aterrorizante dessa produção: quando os letreiros anunciam a continuação da sua história em outro filme. Aliás, em mais dois deles, pois Renny Harlin prometeu (ou ameaçou?) duas sequências completando a nova trilogia.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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