Crítica
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Sinopse
Crítica
Após o encomendado As Grandes Aventuras de Pee-Wee (1985), projeto idealizado para capitalizar em cima do sucesso do personagem televisivo Pee-Wee Herman (Paul Reubens) e que arrecadou nas bilheterias norte-americanas mais de seis vezes o valor do seu orçamento, Tim Burton finalmente conseguiu apoio e prestígio suficiente para fazer Os Fantasmas se Divertem, aquele que considera seu primeiro filme de fato. Se do trabalho de estreia lhe restou a amizade com o protagonista – que depois teria aparições em filmes como Batman: O Retorno (1992) e O Estranho Mundo de Jack (1993) – foi somente no longa seguinte que o diretor pode realizar algo exatamente como havia concebido, sem ceder às pressões externas nem interferências criativas de executivos que pouco dominavam o assunto. E o resultado foi tão positivo que lhe abriu de vez as portas de Hollywood, preparando o terreno para a consolidação que viria em seu próximo passo.
Orçado em US$ 15 milhões – quase o dobro do custo do longa anterior – Os Fantasmas se Divertem arrecadou mais de US$ 70 milhões nas bilheterias de todo o mundo, um desempenho surpreendente. Ainda mais se pararmos para analisar todas as convenções que o filme se propõe a quebrar. Vendido como uma comédia rasgada, trata-se na verdade de uma grande obra de humor negro, que faz uso de astros em ascensão na época do seu lançamento para atrair um público ávido por algo novo e pouco convencional. O desenrolar da história, que a despeito de todos os seus desenlaces incomuns caminha inevitavelmente para um final feliz, é repleto de boas e intrigantes reviravoltas que mexem com a percepção de quem o está assistindo. Assim, deixa claro que, apesar de entregar o prometido, o caminho até a aguardada conclusão não será tão simples nem de acordo com as diretrizes mais convencionais do gênero.
As surpresas podem começar já no título brasileiro, que pouco tem a ver, na verdade, com a proposta do filme. Os Fantasmas se Divertem é um batismo por demais genérico para uma trama que investiga questões mais complexas do que as indicadas na expressão utilizada. Além disso, é muito menos intrigante do que o original, Beetlejuice – ‘suco de besouro’, em tradução literal – nome do único fantasma em cena que realmente está atrás de diversão – ainda que maldita, perversa, diabólica. O conflito apresentado é mais denso e seus desdobramentos propõem uma reflexão existencial comum à obra do diretor e que seriam investigados posteriormente em filmes como A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça (1999) e A Noiva Cadáver (2005), por exemplo.
As quebras de paradigmas se dão logo no início, ainda antes da primeira reviravolta. Adam (Alec Baldwin) e Barbara (Geena Davis) são um casal que mora em uma grande e confortável casa em uma pequena cidade no interior dos Estados Unidos. Apesar de jovens, se recusam a ter filhos, o que motiva uma vizinha, convenientemente corretora de imóveis, a insistir com eles a vender a propriedade para uma família que “faça melhor uso do lugar”. Burton, como se sabe, teve uma infância problemática em um lar que não o compreendia, e talvez se encontre aí a explicação para essa escolha inusitada de protagonistas. Enquanto vivem num universo de faz de conta, em que antes das sete da manhã já estão felizes e bem arrumados perambulado pela casa – ela cuidando da cozinha, ele ocupado com uma maquete gigante do lugar onde vivem – tudo está seguro e em ordem. Porém, a partir do momento em que decidem se aventurar pelo exterior – uma atitude de adultos, portanto – a tragédia faz-se presente.
O que acontece é que, em menos de 15 minutos de história, temos os dois personagens principais mortos em um acidente ridículo ao desviarem de um pequeno cachorro – outra fixação do cineasta, como bem vista em Frankenweenie (2012) – e caírem de uma ponte. Porém tudo segue correndo naturalmente para eles, e somente mais tarde, ao voltarem para casa – espaço acolhedor – é que irão se deparar com a verdade de suas novas condições: estão mortos. Como fantasmas de primeira viagem, recebem um manual de primeiros passos para os recém-falecidos, livro que, obviamente, não estudarão à contento. Assim, terão que partir em uma peregrinação pelo limbo, criando oportunidades para boas piadas – suicidas acabam trabalhando como funcionários públicos no além – e um verdadeiro deslumbre visual.
Tim Burton construiu, durante toda a sua filmografia, um corpo de trabalho que sempre despertou mais atenção pela forma do que pelo conteúdo. Aos poucos, no entanto, foi mostrando aos seus seguidores que havia mais em cada uma de suas peças do que as aparências indicavam em um primeiro momento. Os Fantasmas se Divertem é a investida inicial neste sentido. Merecidamente premiado com o Oscar de Melhor Maquiagem, foi indicado ainda em Efeitos Especiais no Bafta e premiado como Melhor Filme de Horror (?) na Academia de Cinema de Ficção-Científica, Fantasia e Horror. Mas é provável que a premiação mais inesperada que o filme tenha conseguido seja a de Melhor Ator pela Sociedade Nacional dos Críticos de Cinema dos EUA, que reconheceu a performance alucinada e irrequieta de Michael Keaton no papel-título. Quase como um jovem Jack Nicholson, ele aparece em cena durante apenas 17 minutos – de um filme com mais de 1h30 de duração – mas com uma presença tão magnética e hipnotizante que simplesmente eclipsa aqueles ao seu redor.
Keaton é Beetlejuice, o fantasma endiabrado especializado em ‘bio-exorcismo’, ou seja, em se livrar de seres humanos com assombrações de deixar qualquer um arrepiado. É a ele que recorrem Adam e Barbara quando a casa em que vivem é vendida a uma família de Nova York. Porém os novos ocupantes estão longe de serem convencionais. Charles (Jeffrey Jones) quer apenas descansar, enquanto que Delia (Catherine O’Hara), sua esposa, decide dar vazão à sua veia artística e passa a transformar o lugar através de um conceito pós-moderno, com esculturas inexplicáveis e cores fortes. Por fim, há a filha (Winona Ryder), uma garota gótica e depressiva. Será através dela que os antigos moradores conseguirão se comunicar com os vivos, pois uma vez que para ela tudo é possível e o mundo das sombras já a ronda diariamente, nada mais patético seria do que se assustar com fantasmas escondidos em lençóis brancos – como, de fato, acontece.
Beetlejuice é a ameaça, a última instância, o auxílio que, antes de melhorar, deixará tudo ainda pior. É o último recurso, mas para aqueles sem opções talvez seja a única solução. É isso que Burton, definitivamente, brinca em seu filme. Os fantasmas novatos precisam aprender como lidar com a realidade atual, da mesma forma que aquela família desajustada precisa entender como vencer as diferenças entre eles e respeitarem uns aos outros. Quando isso acontece, há paz, e abre-se a possibilidade da luz fazer frente às trevas, independentemente de qual lado da vida – ou da morte – se esteja. Os Fantasmas se Divertem foi um excelente cartão de visitas para Tim Burton, que definiu um estilo e lhe deu condições para enfrentar seu maior desafio até aquele momento: Batman (1989), a primeira versão cinematográfica digna do homem-morcego, que chegaria às telas no ano seguinte.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Robledo Milani | 7 |
Thomas Boeira | 8 |
Chico Fireman | 8 |
Francisco Carbone | 9 |
Bianca Zasso | 8 |
Rodrigo de Oliveira | 8 |
Cecilia Barroso | 6 |
MÉDIA | 7.7 |
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