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Crítica


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Sinopse

Mina se perde em uma vasta e intocada floresta no oeste da Irlanda. Quando ela encontra abrigo, fica presa ao lado de três estranhos que são vigiados e perseguidos por criaturas misteriosas todas as noites.

Crítica

O cenário, por si só, desperta curiosidade. Um homem correndo em meio a uma floresta aparentemente sem fim. No entanto, o que rapidamente o espectador irá perceber, é que este limite entre mata e a volta ao urbano, de fato, inexiste. Há um contexto especial – ou, até mesmo, mágico – envolvendo estas árvores e a todos aqueles que por elas se aventurarem. A fantasia não é daquelas capazes de despertar sorrisos de alegria e espantos de satisfação. Pelo contrário, é o medo que surge de forma imperativa, dominando reações e controlando anseios. Uma sensação que aumenta quando o personagem se descobre não mais sozinho. Há outros que o observam de longe, mantendo a devida distância. Mas essa só é possível pois a luz do dia segue se esforçando para atravessar as densas copas lá em cima. Pois, assim que o sol se for e a lua fizer de todo esse território o seu domínio, quem poderá lhe garantir segurança? Talvez somente aqueles que, a muito custo, aprenderam a lidar com essa situação tão adversa. São os que possuem um mínimo de conhecimento a respeito deles. Os Observadores, afinal, se demonstram satisfeitos em apenas olhar. Mas até quando? Essa tensão constante é o faz do filme assinado pela estreante Ishana Shyamalan uma surpresa tão bem-vinda.

Para os antenados, o sobrenome entrega a origem da realizadora. Ishana é filha de ninguém menos do que M. Night Shyamalan, cineasta indicado ao Oscar por O Sexto Sentido (1999) e que ganhou uma legião de fãs e admiradores por certas estratégias narrativas recorrentes em sua obra, como as reviravoltas – ou plot twists – que propõem uma nova leitura sobre tudo o que havia sido mostrado até aquele momento. Sua herdeira tenta emular este mesmo conceito, e eis a armadilha que prepara para si mesma. Dois terços do roteiro de Os Observadores – escrito por ela mesma, a partir do romance de A.M. Shine – é dedicado a este universo longe das grandes cidades e da vida civilizada. É uma realidade à parte, na qual Mina (Dakota Fanning, resgatando muito do talento que exibia quando criança e que há tempos dava a impressão de ter esquecido) se vê presa durante uma viagem de trabalho, quando seu carro estraga nas proximidades desta natureza dominada por seres especiais – algo que só irá descobrir quando for tarde demais. Porém, assim que começa a se encaminhar a um desfecho tão poderoso quanto capaz de permitir as mais diversas interpretações, decide também fechar essas possíveis portas e propor explicações já não mais tão necessárias.

Mina é uma garota consumida pela dor. Sem atropelos, a diretora se encarrega de oferecer uma ou outra pincelada de informações a respeito do passado da garota. O duplo aqui se manifesta já em sua história: ela possui uma irmã gêmea. Porém, dessa tem apenas notícias de vez em quando, mais por decisão própria do que por um querer da outra. Há entre elas um lamento, fruto da morte abrupta da mãe, vítima de um acidente de carro quando estava em um passeio com as filhas. Uma sabe que ambas eram crianças demais na ocasião para serem responsabilizadas pelo ocorrido. Mas a protagonista não consegue ter esse pensamento tão claro. Agregando para si a culpa pelo destino materno, tratou não apenas de se isolar em uma vida apática como vendedora em uma loja de animais em uma pequena cidade no interior da Irlanda, como ainda buscou subterfúgios para fugir também de si mesma. A partir do uso de perucas e forte maquiagem, a cada noite finge ser uma pessoa diferente. Mais um flerte que a trama estabelece em relação ao que vem depois.

Se este preâmbulo dá a impressão de não ser dos mais estimulantes, é a partir do momento em que Mina se vê em um refúgio no meio da floresta ao lado de três outros estranhos que Os Observadores, enfim, ganha fôlego. Madeline (Olwen Fouéré, de O Homem do Norte, 2022) é a sábia, a que está ali há mais tempo, é quem conhece as regras e dos demais exige atenção a elas. Daniel (Oliver Finnegan, visto na série Outlander, 2018) é o único homem, e dele se espera atitudes másculas, como caça e pesca. Mas sua personalidade é instável, oferecendo tanto uma mão em socorro na hora de desespero como uma tranca a se fechar quando em busca por socorro. Por fim, Ciara (Georgina Campbell, de Noites Brutais, 2022) é aquela que passa a ver como irmã, a que lhe pode oferecer um porto seguro, um instante de respiro e confiança, ainda que não seja isenta de segundos de insegurança e dúvida, assim como qualquer um dos demais. Os quatro tem os dias para si, mas em meio a essa imensidão de verde que os cerca, escapar se mostra quase impossível. As noites, no entanto, são ainda piores. É quando essas criaturas saem de seus esconderijos e os cercam. Poderiam trucidá-los em instantes, caso não estivessem protegidos. Mas preferem estudá-los. Analisando cada movimento, formato, reação. E se tudo ali se confirma ser mais uma sensação do que uma garantia, um plano de fuga se faz urgente. Ainda mais quando descobrem não terem sido os únicos a se encontrar nessa mesma situação.

Ishana não tem pressa em revelar as cartas que esconde na manga. O desdobramento das ações de seus personagens e o cenário limitado que oferece a eles proporciona uma angústia que transpassa o tecido da ficção e contagia a audiência – e este é um feito que não pode ser desprezado. Há destreza em sua habilidade narrativa, e em um gênero tão saturado por repetições e fórmulas desgastadas, é de se fazer notar qualquer suspiro de renovação. Faltou a ela, no entanto, maior segurança no que havia criado. Sem oferecer tantas respostas, é provável que o conjunto fosse ainda mais coeso, permitindo que as conclusões não se demostrassem tão fechadas, mas, sim, passíveis de diferentes interpretações. Mas este não é o filme que aqui se revela. Os Observadores parte de uma premissa capaz de despertar curiosidade e encontra nos seus parcos recursos muito de sua força. É quando se vê próxima de abrir mão do controle e permitir que aquele que, de fato, a observa – o espectador, portanto – se aproprie do discurso, o que demonstra é uma fragilidade debilitante, impedindo esse compartilhamento ao propor uma única leitura, por vezes decepcionante, e no geral não mais do que pálida. Seria apenas irônico, se não fosse também frustrante. Felizmente, não a ponto de prejudicar a experiência por completo.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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