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Baseado na peça homônima, Os Garotos da Banda mostra amigos se reunindo no apartamento de Michael (Kenneth Nelson) à espera do aniversariante Harold (Leonard Frey). Há um clima de leveza no ar, até porque a ocasião será celebrada entre homens gays, ou seja, sem as presenças potencialmente castradoras de agentes da discriminação. Lançado em 1970, quando Hollywood começava a observar personagens para além da predominância de protagonistas masculinos, brancos e heterossexuais, o longa-metragem dirigido por um então quase novato William Friedkin – que assombraria o mundo alguns anos depois com O Exorcista (1973) – parte da observação de um universo cuja euforia inicial advém da relativa apartação dos entornos iminentemente nocivos. Tanto que os poucas instantes encenados fora do apartamento acontecem em espaços de exceção nos quais, por exemplo, sujeitos podem exercer os seus desejos livremente. Porém, os flertes de momento nas ruas se encarregam de ensaiar uma liberdade, aos poucos, conquistada nos demais setores.
Essa ambiguidade na interlocução entre público e privado não fica restrita às geografias de Nova Iorque, pois também está presente em como os personagens revelam aquilo que lhes parecia adequado guardar para evitar uma superexposição das intimidades. Mesmo entre os amigos há borrões, questões parcialmente interditadas, seladas por acordos tácitos esgarçados e questionados à medida que a noite avança em meio às simbólicas trovoadas. Michael recebe a ligação de um amigo dos tempos da faculdade. Alan (Peter White) chora ao telefone, mas diz que prefere desabafar pessoalmente com o antigo companheiro de dormitório. Este, por sua vez, solicita aos convidados que disfarcem os seus trejeitos naturais, assim sustentando uma farsa a fim de evitar o "choque" do forasteiro. E William Friedkin conduz com muita sensibilidade o que sobrevém ao pedido insólito à trupe ruidosa, alegre e espalhafatosa que se amontoa no apartamento enquanto o aniversariante não chega. Enfim, o anfitrião prefere mentir, a priori sem motivos aparentes, algo adiante melhor explicitado.
Ao invés de negar os estereótipos atrelados à comunidade homossexual masculina, Os Garotos da Banda sustenta esses modelos para, com destreza e paulatinamente, desconstruir suas engrenagens motrizes. Emory (Cliff Gorman) é histriônico, o decorador de ambientes tachado de promíscuo pelos colegas, dotado de uma espontaneidade absolutamente cativante. Não à toa, ele é quem sofre no corpo a violência da resposta homofóbica do intruso inquieto. Aliás, Alan pode ser entendido como o elemento desestabilizador, pois inclusive suscita em Michael um comportamento próximo do perverso, o que acaba reverberando diretamente nos demais. Racismo e antissemitismo surgem numa lógica intrincada de reprodução inadvertida da opressão sofrida noutra chave. O tecido social que sustenta essas conexões vai crescentemente tendo as suas tramas desgastadas por palavras cortantes, observações maldosas e objeções antigas trazidas violentamente à tona. E William Friedkin lida habilmente com a restrição espacial, propondo uma encenação dinâmica valorizada pela excelente montagem a cargo de Gerald B. Greenberg e Carl Lerner. O crescendo de intensidade é evidente.
Algumas perguntas ficam propositalmente sem respostas em Os Garotos da Banda porque vital é o seu impulso mobilizador, não as resoluções fáceis, tampouco as lições que poderiam confortar o espectador com ações e reações aparentemente equivalentes em tom e veemência. Nessa noite em que os afetos e as repulsas se entremeiam num torvelinho de circunstâncias ora enternecedoras, ora essencialmente conflituosas, esses homens vão deixando à mostra dores que aparentemente não cicatrizam. Michael propõe um jogo cruel de encarar brutalmente amores perdidos e/ou não correspondidos, claramente conduzindo os amigos a lugares pouco confortáveis e até exasperantes. O trabalho do elenco, o mesmo que havia subido aos palcos no sucesso teatral que antecedeu o filme, é grande parte responsável pela potência dessa desabalada carreira da harmonia superficial ao recôndito repleto de fantasmas menos facilmente expurgáveis. Todavia, é a capacidade de William Friedkin de substanciar o recorte complexo do dramaturgo Mart Crowley que dá espessura ao todo.
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