Crítica
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Sinopse
Aos 17 anos, Lea passa boa parte do verão se bronzeando no quintal de casa. A monotonia de seu cotidiano é interrompida quando ela conhece um homem com o dobro de sua idade que lhe promete uma alternativa de vida.
Crítica
Premiado como Melhor Direção no Festival de Sundance 2022, Palmeiras e Linhas Elétricas enfrentou uma forte concorrência, que incluía títulos como Cha Cha Real Smooth (2022), Emergência (2022) e Fantasmas do Passado (2022), entre outros. Tal conquista, no entanto, recai não apenas no reconhecimento do trabalho da cineasta Jamie Dack – estreando no formato – mas também na idealização de um estilo considerado “independente” nos Estados Unidos, explorando contradições e barreiras pouco vistas no cinema mais comercial, aquele praticado pelos grandes estúdios. Há méritos no resultado, é evidente, e grande parte destes dizem respeito do cuidado dedicado à trajetória da protagonista e ao preparo da atriz Lily McInerny (vista na série Me Conte Mentiras, 2022), que tem pela frente o desafio de criar uma figura frágil, porém resoluta, certa de suas escolhas, por piores que essas sejam. Muitas vezes é difícil se compadecer do seu drama. O que não impede de reconhecer a carência que dela toma conta.
McInerny dá vida à Lea, uma adolescente de 17 anos que, assim como muitas da sua idade, passa os dias entediada de olho no celular ou entre amigas que igualmente pouco tem com o que ocupar seus dias. É um período de férias, as aulas ainda estão distantes, e o sol que tomam ao redor da piscina retira qualquer ânimo para planos mais elaborados. Seus corpos mal começaram a ganhar formas mais voluptuosas, mas isso não as impede de desperdiçá-los com garotos igualmente desinteressados e desinteressantes, que as usam assim como elas também deles se aproveitam, pensando em sexo mais como uma forma de passar o tempo do que a consumação de um desejo ou um interesse permanente. Não que sejam absolutamente frios e desprovidos de sentimentos. Percebe-se, diante de olhos curiosos, o vislumbre de um querer que nunca ganha espaço para se manifestar, tanto de um lado, como do outro. Eles não foram ensinados a assumir tais vontades. A indiferença esconde, mas também protege.
Lea, portanto, quer ser notada. Serve de válvula de escape para a melhor amiga, a quem descobre não poder confiar, e também para o possível namorado, rapaz que a procura apenas para uma transa inconsequente no banco de trás do carro, mas que se afasta assim que termina de gozar, tão rápido quanto foi o início de tudo. Em casa, o desconforto permanece. O pai a abandonou há muito, construindo uma nova família da qual ela não faz parte. A mãe, por sua vez, alterna entre a carência irritante (quando solteira) e a indiferença agressiva (quando envolvida em uma conquista de ocasião). À menina que não tem voz nem espaço, qualquer migalha pode fazer diferença. E essa cai no seu colo com o piscar de olhos de Tom (Jonathan Tucker, de As Panteras, 2019). Um homem mais velho, dono do seu nariz, que afirma ter a própria vida estruturada e, mesmo assim, demonstra um interesse que até hoje ela nunca vivenciou. Como não se deixar levar, sem amarras nem rede de segurança?
Há um sentimento constante de que algo muito errado está prestes a acontecer. Tom parece ser bom demais para ser verdade – e, de fato, cedo ou tarde, suas reais intenções acabarão por se manifestar. O problema é que essa transição, entre a entrega e o perigo, por mais demorada que leve até se tornar concreta, se dará de modo quase abrupto, em uma reviravolta mais imposta do que fruto de uma evolução que vem sendo trabalhada. Assim, o que poderia ser um ponto de virada, termina por soar apenas como confirmação do pior dos temores, eliminando a surpresa pelo muito que exige até a confirmação do que já se esperava. Se Tucker, por sua vez, é conciso em sua performance, permitindo um vislumbre do que se esconde em cada gesto, dissimulando intenções através de frases e declarações de duplo sentido, estará na jovem McInerny a maior revelação, pois seu esforço estará justamente no mínimo, engolindo cada dúvida ou temor, como se, ao deixá-los escapar, apenas do próprio fim se aproximaria.
Jamie Dack, também roteirista, contou essa mesma história em um curta-metragem de apenas 15 minutos, lançado quatro anos antes. Ao estender seu argumento original a uma narrativa de quase duas horas, muito se dedica à observação dos personagens, o vazio de suas vidas e o pesar que inevitavelmente revelam com suas escolhas. E quando essas soam quase incompreensíveis, mais aproximando do perigo do que protegendo rumo a uma desejável sanidade, é porque tais tomadas de decisão são movidas mais pelo que falta do que por aquilo que se mostra em abundância. Todos se foram, e os que ficaram, de costas permanecem. O desinteresse está por onde quer que olhe. E se esse for o preço a ser pago por um pouco de atenção, qual o problema de a ele se sujeitar? Num mundo de dissimulação e meias verdades, é importante saber jogar às claras. Assim, ao invés de vítima, assume-se como dona da situação. Por mais trágica que essa se confirme. Eis, enfim, uma lógica – distorcida, perniciosa, condenável. Mas não desprovida de uma razão que apenas a ela interessa.
Filme visto na 46ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo
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